segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

MÉDICOS - REMUNERAÇÃO EM PRIMEIRO LUGAR


PÁGINA 10 | LETÍCIA DUARTE (INTERINA)- Remuneração em primeiro lugar - ZERO HORA 31/01/2011


O cifrão azul impresso em letras garrafais na capa da revista é simbólico, mas para quem tem dúvida a manchete esclarece: Remuneração em primeiro lugar.

Até parece uma paródia para criticar os deputados gaúchos, que aumentaram seus próprios salários em 73%, mas é mais surpreendente: trata-se da capa da revista do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul.

Publicada em dezembro, a edição destaca as conquistas salariais obtidas pelo sindicato ao longo do ano. Entende-se que seja uma das prioridades de qualquer categoria a busca por uma remuneração justa, mas, no mínimo, pode-se dizer que a manchete foi infeliz. Não apenas porque privilegia interesses corporativos, numa área de extrema relevância social, mas também porque é injusta com a conduta da maioria dos profissionais da área, que certamente não se esqueceu do juramento que fez ao se formar, de colocar a vida em primeiro lugar.

A frase soa ainda mais preocupante no momento atual, em que a prefeitura de Porto Alegre trava uma batalha para garantir que os médicos cumpram seus horários nos postos de saúde. Por mais que o modelo da fundação defendido pelo prefeito José Fortunati, que hoje concede entrevista coletiva para anunciar ações na saúde, seja questionável e mereça uma discussão criteriosa, não se pode ignorar que a ausência de médicos nas unidades é constante, como comprovou teste feito por ZH nas 44 unidades básicas de saúde (publicado na sexta).

Em texto assinado na mesma revista, o presidente do Simers, Paulo de Argollo Mendes, comemora que “a prefeitura cedeu às pressões, concedendo R$ 500 de abono aos municipários, e já elabora um plano de carreira, cargos e vencimentos”.

Ora, se a própria categoria reconhece que há um esforço público para a recuperação de perdas salariais, o mínimo que a comunidade pode esperar é que a parcela relapsa cumpra sua parte, respeitando os horários de trabalho.

domingo, 30 de janeiro de 2011

SAÚDE - BRASIL É O LANTERNA EM INVESTIMENTOS


Brasil é lanterna em investimento - Zero Hora 30/01/2011

Em investimentos na saúde pública, o Brasil está mais perto de Angola do que da Suíça. Divulgado ano passado, relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) aponta que o Estado brasileiro aplicou apenas 5,4% dos seus recursos no setor, ocupando uma vergonhosa 169ª posição entre 198 nações. Perdeu feio para a Argentina, que está em 54º lugar.

Isso indica que o SUS não é o gigante que se imagina. Há mais dados confirmando esse raquitismo. A pesquisadora Maria Alicia Domínguez Ugá, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, constata que a participação pública nos gastos com o sistema brasileiro de saúde é só de 44%. Os outros 66% são pagos pelas famílias ou cobertos por planos privados.

Analisando desde 2005 a estrutura de financiamento da saúde dos brasileiros, Maria Alicia diz que, em termos de financiamento, o Brasil está distante de países onde o acesso à saúde é universal e integral. No Reino Unido, 86% são de recursos públicos. Na Suécia, a fatia é de 85%. O sistema brasileiro equipara-se, no que se refere à participação estatal, ao dos Estados Unidos. Para Maria Alicia, esse é o modelo liberal, em que predomina o gasto privado.

– É muito baixa a participação do sistema público no gasto em saúde no Brasil.

Quando realizou a pesquisa, em 2005, em colaboração com Isabela Soares Santos, Maria Alicia calculou que o gasto total em saúde representava pouco mais de 8% do PIB do Brasil. Isso não é pouco. No entanto, o gasto público era de apenas 3,9%.

– Isso acarreta um enorme fardo financeiro às famílias com despesas em serviços e medicamentos – diz Alicia.

Entidades do setor defendem como antídoto para essa penúria a regulamentação da emenda constitucional 29, que define o quanto municípios, Estados e governo federal devem aplicar. Essa é a prioridade do Conselho Nacional de Saúde. O presidente da entidade, Francisco Batista Júnior, observa que o maior problema são os Estados, que se utilizam de subterfúgios para alcançar a cota de 12% de investimento obrigatório, incluindo gastos com saneamento, pensionistas e até mesmo dívidas no orçamento da saúde. Com a regulamentação, essa manobra seria impedida.

– Com a regulamentação seriam R$ 12 bilhões a mais por ano – diz Batista Júnior.

O conselho defende também um aumento na contribuição de Brasília. Pela emenda 29, o governo federal tem de destinar à saúde o que aplicou no ano anterior, acrescido da variação do PIB. Há o entendimento de que é pouco. O que se postula é a destinação de 10% das receitas correntes brutas. O projeto que regulamentaria a emenda e introduziria essas mudanças foi aprovado pelo Senado. Na Câmara, sofreu modificações e está parado desde 2008. O relator do substitutivo, Pepe Vargas (PT-RS), não vislumbra chance de votação.

– Temos um governo novo e um Congresso novo. Tem de colocar a bola no centro e recomeçar o debate – afirma.

“Podemos fazer mais”- Alexandre Padilha, ministro da Saúde - O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, afirma que os investimentos vão aumentar e que as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) trarão alívio às emergência. O projeto é de 27 UPAs no Interior e duas na Capital, ao custo de R$ 54 milhões.

Zero Hora – O governo cumpre com o exigido nos gastos em saúde?
Alexandre Padilha – Sim. A emenda constitucional 29 está sendo cumprida ano a ano, com o reajuste do orçamento da saúde, tendo por base o exercício anterior.

ZH – Especialistas dizem que é pouco.
Padilha – Sou daqueles que acham que podemos fazer sempre mais do que fazemos. Sempre se vai precisar de mais recursos. A emenda 29, quando regulamentada, vai definir a participação de cada ente. Com o crescimento da economia, haverá mais investimentos em saúde.

ZH – E a situação das emergências?
Padilha – A solução passa pela atenção primária de saúde. Também é fundamental organizar os serviços de emergência. As Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), que funcionam 24h, vão reduzir em até 95% o movimento nas emergências. Elas têm médicos, enfermeiras e funcionam junto da população.

PARTICIPAÇÃO DO PODER PÚBLICO NOS GASTOS COM SAÚDE (%)

- Reino Unido -= 86
- Suécia - 85
- Dinamarca - 83
- Alemanha - 76
- França - 75
- Espanha - 69
- Portugal - 56
- Itália - 55
- BRASIL - 44
- Estados Unidos - 44

PROPORÇÃO DE INVESTIMENTOS DESTINADOS À SAÚDE

1º Narau - 32,1
6º Suiça - 19,8
8º Estados Unidados - 19,5
11º Colombia - 18,8
14º Alemanha - 18,2
23º Uruguai - 17,3
54º Argentina - 13,9
169º BRASIL - 5,4
172º Angola - 5,3
189º Paquistão - 3,5
198º - Miamar - 0,9

EMERGÊNCIAS EM CRISE


Os números por trás do colapso - ITAMAR MELO E NILSON MARIANO, zero hora 30/01/2011

As emergências superlotadas do Sistema Único de Saúde (SUS) são a face visível e dramática de um problema mais profundo, o baixo investimento público no atendimento à população, especialmente preocupante no Rio Grande do Sul, onde o governo do Estado aplicou, entre os anos de 2004 e 2009, um total de R$ 3,75 bilhões a menos do que o determinado em emenda à Constituição Federal

As cenas de sofrimento nas emergências de hospitais públicos, com pacientes improvisados em cadeiras durante dias à espera de leitos, retratam um drama que pode ser melhor entendido quando se olha para os números do Sistema Único de Saúde.O diagnóstico de colapso no atendimento de urgência tem causas matemáticas.

Doentes gaúchos são amontoados em corredores superlotados das emergências – alguns de pé, conectados ao varal do soro – porque vivem no Estado que menos investe em saúde. Em 2009, o Piratini aplicou no setor 7,2% da receita líquida em impostos e transferências, o menor índice entre as 27 unidades da federação. Dez Estados gastam duas ou até três vezes mais.

E a situação pode piorar. No orçamento do Rio Grande do Sul para este ano, o percentual previsto para a saúde é ainda menor, da ordem de 6%. O risco é que se agrave o quadro visto nos últimos dias, quando as emergências dos hospitais Conceição, Clínicas, São Lucas e Santa Casa, pilares do SUS em Porto Alegre, receberam uma quantidade de pacientes quase três vezes superior à capacidade.

O investimento pífio do governo gaúcho contraria o que está determinado na Constituição Federal. De acordo com a emenda constitucional número 29, desde 2004 os Estados têm a obrigação de gastar no mínimo 12% da receita em ações e serviços de saúde. O Rio Grande do Sul nunca chegou perto disso. Considerando o que deveria ter aplicado e o que efetivamente executou no período de 2004 a 2009, o rombo deixado é de R$ 3,7 bilhões.

É considerável o impacto que esse dinheiro subtraído ao SUS teria, caso fosse injetado no pagamento de consultas, exames e internações. Com os R$ 3,7 bilhões é possível construir e equipar 37 hospitais com 180 leitos de média e alta complexidade, iguais ao Hospital Regional de Palmeira das Missões, que está em projeto e beneficiará 500 mil pessoas de 73 municípios. Outra conta: com o que deixou de ser aplicado em seis anos, seria possível manter ao longo desse período 11 hospitais das mesmas características.

Mas é tolerável descumprir a lei? A partir de 2007, para ter as despesas aprovadas no Tribunal de Contas do Estado (TCE), o Piratini seguiu o exemplo de outros governantes: apresentou, como se fossem gastos em saúde, custos que não são efetivamente da área. A manobra consistiu em agregar o orçamento para o saneamento – mais especificamente a verba da Corsan – ao da saúde, para atingir os 12% constitucionais.

No ano passado, na apreciação de contas referentes a 2009, o TCE aceitou pela última vez esse arranjo orçamentário. Os conselheiros do tribunal decidiram que, a partir de 2011, gastos financiados por tarifas – caso da Corsan – não poderão mais ser computados na rubrica saúde. Isso significa que o governo terá de aumentar, e muito, a verba destinada ao SUS.

Quem avisa é Cezar Miola, conselheiro do TCE e relator do parecer prévio sobre as contas de Yeda Crusius. Miola observa que, para se cumprir a máxima de que a saúde é direito de todos e dever do Estado, deve-se obedecer ao fixado na Constituição.

– A posição do TCE passa a valer tanto para o Estado quanto para os municípios – afirma o conselheiro.

Com os municípios, o TCE não deverá se incomodar. Invariavelmente acusados de enviar seus pacientes à Capital, na chamada ambulancioterapia, são os prefeitos que carregam o maior fardo do SUS. Entre as prefeituras, apenas uma não alcançou a meta de aplicar 15% das receitas em saúde. Mas raspou a trave: o percentual de Rio dos Índios chegou a 14,96%. Dos demais, 152 investiram acima dos 20%. Porto Alegre não ficou muito para trás: gastou 19,17%.

Apertem os cintos, os leitos sumiram

As emergências do SUS em Porto Alegre congestionaram, acolhendo um número de pacientes quase três vezes superior a sua capacidade, porque faltam leitos qualificados para internação de doentes graves.

Sem ter para para onde mandar os pacientes pré-atendidos, os médicos improvisam os que chegam em cadeiras, macas ou mesmo até de pé. Por dias, até semanas.

A estatística ajuda a entender como se chegou a esse caos. Levantamento feito pelo Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), que se baseou em dados do Ministério da Saúde e do IBGE, aponta que o Estado perdeu um terço dos seus leitos entre 1993 e 2010. No período, a oferta caiu de 35.061 para 23.559, um recuo de 32,8%. Em Porto Alegre, a perda de vagas foi ainda maior: dos 8.698 leitos de 1993, restaram 5.541 – 36,3% a menos. Uma das consequências: emergências atulhadas de pacientes à espera de internação.

– Esse é o nosso cotidiano. As pessoas lotam as emergências porque há insuficiência na rede básica ou por falta de leito hospitalar na sua cidade – diz Maria Rita Assis Brasil, vice-presidente do Simers e profissional de emergência no Hospital Conceição.

As emergências sangram porque são a ponta do funil do SUS. Pacientes que penam para conseguir consulta especializada, exame ou cirurgia, às vezes ficando meses na fila de espera, têm a doença agravada. Então, só resta a última instância: a emergência.

Às vezes, pode ser tarde demais. O médico Gérson Nunes, do Hospital de Clínicas Porto Alegre (HCPA), já viu, para seu desespero, paciente morrer enquanto aguardava internação na emergência. Maria Rita conta que é habitual entrarem na emergência do Conceição homens que não conseguem urinar porque a uretra foi bloqueada por um tumor da próstata. O tumor cresceu porque o doente não obteve consulta com o urologista a tempo.

– Quando ele chega à emergência, já não tem chance de sobreviver – lamenta.

Superintendente do Grupo Hospitalar Conceição (GHC), o maior do Estado, Neio Fraga Pereira detecta um descompasso. Enquanto a população gaúcha envelheceu rapidamente, modificando os tipos e a frequência das enfermidades, a estrutura do SUS encolheu.

– Houve uma revolução demográfica e epidemiológica, mas não no atendimento de saúde – ressalta.

Para Leonardo Fernandez, chefe do Serviço de Emergência da Santa Casa, uma das causas da lotação é a deficiência do SUS na Região Metropolitana. Cerca de 40% dos pacientes atendidos na Capital são metropolitanos. Municípios populosos, como Alvorada, Cachoeirinha, Viamão e Guaíba, dispõem de serviços acanhados. Sua capacidade para diagnosticar males complexos é limitada.

Assessor da Direção Médica do Hospital São Lucas, Salvador Gullo Neto entende que deveria ser seguida uma regra. Doenças simples seriam resolvidas no próprio município. As intermediárias, no hospital regional. As complicadas viriam para as instituições de referência na Capital.

– Hoje, se recebe de todo Interior, inclusive patologias simples – informa.

As razões de um governo...

Secretário estadual da Saúde nos dois últimos governos, o deputado federal Osmar Terra discorda das alegações de que o Rio Grande do Sul é indigente na aplicação de recursos no SUS.

Destaca que os índices investidos em 2008 e 2009, durante a administração de Yeda Crusius, foram os “maiores percentuais da história”. Segundo ele, os índices superam os aplicados pelos três antecessores.

Terra garante que gostaria de ter cumprido a meta de 12%, mas diz que não havia recursos. Observa que, enquanto não for regulamentada a emenda constitucional 29 (que determina os 12% de investimento), Estados tentarão se adequar incluindo despesas com saneamento sob o guarda-chuva da saúde.

– Tem que aplicar os 12% excluindo o saneamento. Para mim, o saneamento interfere secundariamente na saúde – argumenta.

O parlamentar do PMDB ressalta que o Estado, com o que investe, ostenta os melhores indicadores de saúde do país. Esclarece que a superlotação das emergências é cíclica.

No verão, segundo ele, o problema ocorreria como consequência das férias dos médicos e da cobertura insuficiente na rede de atenção básica. Terra também contesta os dados sobre a redução de leitos, feitos pelo Sindicato Médico de Estado.

– É uma conta feita pela metade – comenta.

...e as promessas de outro

O governo Tarso Genro deve definir até 15 de maio a sua estratégia para cumprir a meta de investir 12% em saúde. Na data, será encaminhado à Assembleia Legislativa o projeto de plano plurianual do Piratini.

Novo secretário estadual da Saúde, Ciro Simoni antecipa que o documento deve trazer objetivos a atingir a cada ano e apontar fontes de recursos O plano: chegar aos 12% em 2014.

– Não tem cabimento o Rio Grande do Sul ser o Estado que menos investe. Por isso, estamos brigando para colocar recursos do tesouro na saúde. Será um esforço muito grande, mas é a prioridade do governador – anuncia.

O esforço significa dobrar a aplicação no prazo de quatro anos. Simoni observa que o orçamento para 2011, legado pelo governo Yeda, prevê apenas 6,3% das receitas para a saúde – totalizando R$ 1,16 bilhão.

Outro R$ 1,23 bilhão foi computado, mas inclui recursos da Corsan e do Instituto de Previdência do Estado, os quais Simoni exclui do cálculo.

– Nesses 6,3% ainda estão cerca de 2% referentes ao gasto com os inativos da saúde. Estamos muito longe – diz o secretário.

Para aliviar o aperto vivido agora, a ideia é buscar suplementações orçamentárias ao longo de 2011. Simoni diz que o governo estuda remanejar recursos ou utilizar na saúde o que houver de aumento na arrecadação de impostos.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

O HORÁRIO DOS MÉDICOS

O confronto entre a prefeitura de Porto Alegre e as entidades representativas dos médicos que prestam serviços públicos repete uma controvérsia de sete anos atrás, quando os usuários da rede de saúde saíram perdendo. Não é o que se espera desta vez, quando o que está em questionamento novamente é o aperfeiçoamento do atendimento em postos e unidades básicas. Forças corporativas não podem, como aconteceu em 2003, frustrar a tentativa de disciplinamento do setor. São os mesmos interesses que se mobilizam agora contra as iniciativas do prefeito José Fortunati, que já mostrou disposição de perseverar no objetivo de garantir à população um direito inquestionável assegurado constitucionalmente.

Apesar da controvérsia em torno da proposta do Executivo de criação de uma fundação para gerir o Sistema Único de Saúde, de responsabilidade do município, há distorções inquestionáveis levantadas pelo debate. Não há como aceitar, por exemplo, as resistências ao apelo do prefeito para que os médicos respeitem horário de atendimento nos postos. Também é surpreendente que alguns profissionais reajam ao desejo da prefeitura de fazer com que a assistência médica não seja apenas a proporcionada por hora marcada. Médicos em disponibilidade nas unidades básicas, se estiverem no período previsto em carga horária, devem, sim, atender pacientes que se dirigem a esses locais sem agendamento. O sistema público de saúde existe para atender o público – e não para a comodidade dos servidores.

O conflito revela, mais uma vez, a atrofia progressiva dos serviços públicos por conta da acomodação e da apatia, não só na área médica, mas também em outros setores. Sabe-se que situações semelhantes são enfrentadas por prefeitos do Interior, que muitas vezes não se dispõem a enfrentar o poder das corporações. É corajosa a posição do prefeito Fortunati, que resiste às pressões, ao contrário do que, infelizmente, ocorreu em 2003. As reações corporativas nesta questão da obediência aos horários contratados não fazem justiça aos médicos que cumprem rigorosamente com suas obrigações e que certamente são maioria.

EDITORIAL ZERO HORA 28/01/2011

ONDE ESTÃO OS MÉDICOS

HORÁRIO POLÊMICO. Onde estão os médicos - ZERO HORA 28/01/2011

ZH percorreu as 44 unidades básicas de saúde da Capital e constatou problemas que afetam a saúde da população, como a falta de profissionais e prédios deteriorados

Ao visitar todas as 44 unidades básicas de saúde na Capital, entre a tarde de quarta-feira e a manhã de ontem, Zero Hora deparou com postos sem um único médico para atender a população, prédios decrépitos, clínicos gerais ausentes no horário de expediente, pacientes há dias à espera de consultas.

A apuração de ZH foi motivada pela informação do prefeito José Fortunati de que médicos estariam deixando de cumprir suas jornadas de trabalho.

– Médicos marcam o horário e não chegam, faltam dias inteiros, acabam sendo acobertados por colegas – disse Fortunati.

De todos os visitados, médicos haviam saído antes do fechamento das unidades ou não tinham ido trabalhar em pelo menos oito postos, reforçando o desabafo do prefeito.

Médicos que deixam unidades antes do fim do expediente são apenas parte de um problema maior e mais complexo, que também afeta outros municípios do Estado. As unidades, com raras exceções, têm estruturas precárias – geladas e úmidas no inverno, sufocantes no verão.

Com a falta de especialistas na rede pública, o serviço das unidades torna-se desacreditado: na jornada que se estendeu por 355 quilômetros, ZH descobriu que um paciente, com uma doença degenerativa na coluna, aguardava um especialista desde o dia 24 de janeiro de 2007 na unidade Primeiro de Maio.

Médicos em férias ou de licença deixam lacunas abertas durante semanas, meses e até anos. Não há quem os substitua. É a realidade da UBS do Lami, sem pediatra desde novembro. Kellen Taciane, 21 anos, que buscava atendimento para a filha Larissa, de 10 meses, deixava a unidade às 15h30min de quarta-feira, levando a menina nos braços. Era o segundo dia que a pequena ardia em febre e o segundo dia em que as duas eram mandadas embora.

Contraponto - O que diz Marcelo Bosio, secretário em exercício da Saúde

MÉDICOS AUSENTES - “Vamos apurar e verificar se havia alguma justificativa para os médicos terem se afastado dos postos nos horários de expediente. Precisamos de tempo para fazer essa apuração porque ela é feita através de um processo administrativo. Não gostaria, neste momento, de falar pontualmente sobre cada caso até para não cometer injustiças.

PRÉDIOS DETERIORADOS - “Temos um programa que visa a recuperar e a adequar todas as unidades de saúde."

ESPECIALISTAS - “Vamos implantar um sistema informatizado que vai permitir que a demanda reprimida fique no sistema, e não nos postos, e vai evitar que usuários procurem diferentes unidades para marcar um mesmo especialista”.

FÉRIAS, LICENÇAS E FOLGAS - “A gente tenta organizar a saída dos profissionais, mas são direitos dos profissionais. É uma questão legal. Não temos capacidade para absorver toda uma capacidade de profissionais para substituir os ausentes”.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

PLANOS DE SAÚDE, USUÁRIOS E MÉDICOS

Planos de saúde, usuários e médicos, por Fernando Weber Matos, PRESIDENTE DO CREMERS, ZERO HORA 27/01/2011

Em pesquisa nacional encomendada pela Associação Paulista de Medicina e pela Associação Médica Brasileira, com apoio do Conselho Federal de Medicina, ficou claro que as operadoras, planos e seguros de saúde não gozam de bom conceito junto à população e aos médicos. Os médicos atribuem, em média, nota cinco aos convênios, numa escala de zero a 10.

Os médicos (92%) denunciam que sofrem sempre algum tipo de interferência em seu trabalho. As principais são a glosa de procedimentos e tratamentos (78%), limitação de exames e procedimentos (75%), restrição ao tratamento de doenças preexistentes (70%) e restrição dos auditores a exames e procedimentos clínicos e cirúrgicos (70%).

Estas interferências são antiéticas. Os médicos devem denunciá-las à população, Conselhos de Medicina e gestores públicos, pois ferem o Código de Ética Médica, o conjunto de leis que regulamenta o trabalho médico. São ações que atingem a autonomia do livre exercício da medicina e colocam em risco a saúde e a vida dos pacientes usuários dos convênios de saúde, pois negam condições adequadas para uma assistência médica de qualidade.

É preciso ressaltar que esses planos privados praticam preços inacessíveis à imensa maioria da população, que acaba dependendo exclusivamente do SUS. Os honorários médicos são aviltantes. Não há reajustes dignos e reais há mais de 10 anos, resultando em perdas significativas na remuneração. É necessário restabelecer com urgência os critérios de reposição de honorários médicos, que devem ser regulados pela Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (CBHPM-2010).

A saúde suplementar, planos e seguros foram criados para diminuir a procura de serviços estatais. Se as normas fossem obedecidas, isto de fato acabaria ocorrendo. Infelizmente, não é o que acontece, devido às restrições impostas pelos convênios ao trabalho médico.

Os órgãos governamentais, Ministério da Saúde e Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que deveriam controlar a medicina suplementar e defender o cidadão que desonera o SUS pagando por sua própria assistência médica, são inexplicavelmente omissos. Não defendem o cidadão, o trabalho médico ou a qualidade de atendimento.

O pior, no entanto, é que a relação da ANS é tendenciosa e sempre a favor das operadoras de saúde. O objetivo dos convênios sempre será comercial, reduzindo custos, mesmo que isto provoque prejuízos irreparáveis aos usuários e médicos.

Os dados da pesquisa podem ser encontrados no site www.apm.org.br. Verifique ali para saber quais os planos no Rio Grande do Sul que não cumprem com as obrigações contratuais pelas quais você paga mensalmente.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

SUPERLOTAÇÃO NAS EMERGÊNCIAS

Superlotação das emergências, por Felipe Costa Fuchs, MÉDICO. ZERO HORA 26/01/2011

Há tempos vem sendo exposta na imprensa a caótica situação das emergências dos hospitais que atendem pelo SUS em Porto Alegre, especialmente o Hospital de Clínicas (HCPA) e o Hospital Conceição. A frequência com que se noticia a calamidade dessas emergências vem aumentando, ainda que o problema seja crônico.

A questão que se impõe no momento é sobre as soluções apontadas para resolver essa tragédia da saúde. Unidades de Pronto Atendimento, as UPAs, são ditas como a maneira definitiva de amparar o nosso sistema de saúde público. Entretanto, a suposição de que as emergências lotam devido a pacientes que deveriam antes consultar nos postos de saúde não procede. Emergências não lotam de pacientes com enfermidades que poderiam ser tratadas ambulatorialmente. Esses casos são atendidos e liberados. Eles apenas retardam a espera por atendimento. Emergências lotam de pacientes com doenças que não podem esperar por tratamento. São casos que requerem a intervenção de especialistas, exames de alta complexidade e, impreterivelmente, internação – quesitos não preenchidos pelas UPAs.

De fato, o ampliamento das unidades básicas de saúde é fundamental. Com foco na prevenção primária, com certeza contribuirão para a resolução do abarrotamento de pacientes em emergências, a longo prazo.

No entanto, o foco do problema não é esse. O fechamento de hospitais e a diminuição de aproximadamente 10 mil leitos destinados ao SUS no Estado, nos últimos 10 anos, são responsáveis diretos pela situação atual. A “ambulancioterapia”, rotina adotada por cidades do Interior que consiste em abrir mão de investimentos na saúde, encaminhando os seus habitantes enfermos à Capital, também contribui para a superlotação dos hospitais.

Sendo a falta de leitos o cerne do problema, a estratégia definida para melhorar a saúde pública do nosso Estado deve necessariamente contemplar o incremento de leitos de alta complexidade.

A situação das emergências dos hospitais privados também não é alentadora. No último inverno, foi noticiada a surpreendente lotação das emergências dos maiores hospitais privados de Porto Alegre. A notícia só não foi surpreendente para os profissionais que trabalham em tais locais, acostumados a conviver com a dificuldade de acomodar um paciente em um leito de internação.

Enfim, há uma clara demanda reprimida de leitos em hospitais qualificados, com capacidade para resolver casos de média e alta complexidade, tanto no sistema público quanto no de saúde complementar. A diferença é que nas emergências de hospitais públicos a situação já ultrapassou o limite do aceitável há muitos anos. Somente a expansão da rede hospitalar em Porto Alegre e no nosso Estado pode, de fato, mudar o panorama da saúde no Rio Grande do Sul.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

INTERESSE SUSPEITO



É constrangedor o duelo em que se transformou a ocupação de cargos do segundo escalão do governo federal. A disputa entre os partidos, que retarda definições em órgãos importantes da administração direta e em estatais, expõe o nível a que chegou o embate para que apadrinhados ocupem posições de comando em várias áreas. É sintomático e revelador que as instituições em jogo tenham orçamentos com cifras grandiosas. Políticos, muitos dos quais sem mandato porque fracassaram nas urnas, são indicados por seus líderes, não por suas reconhecidas qualidades como gestores, mas porque atuarão como uma espécie de serviçal dos partidos dentro do governo. A consequência previsível do que ocorrerá, em nomeações sem critério, é o tráfico de influência, a manipulação de verbas e outros desvios de conduta.

Os envolvidos na refrega pelo comando de órgãos da área da saúde, como Funasa e Fundo Nacional de Saúde, além de estatais, sabem bem o que almejam. Serão gerentes de cofres fartos envolvidos em escândalos nos últimos anos. O histórico da grande maioria das instituições disputadas é desalentador.

O Fundo Nacional de Saúde, por exemplo, que faz pagamentos a hospitais conveniados do Sistema Único de Saúde, está sob suspeita da Controladoria-Geral da União de ter desviado R$ 663 milhões de repasses entre 2007 e 2010. Um órgão ligado a uma das áreas que mais reclamam por recursos deveria estar sob controles permanentes e rigorosos. É indecente que, enquanto milhares de usuários do SUS esperam por atendimento de urgência, especialistas e cirurgias, tanto dinheiro tenha sido desviado, sem que se tenha conhecimento de nenhuma punição até agora.

Também é alarmante saber que, além desse, outros oito órgãos estejam sob investigação da Controladoria, com indícios de desvios de R$ 1,35 bilhão. A marca deixada pelos ocupantes dos cargos de comando, no período analisado, certamente não foi a da eficiência, mas da incúria. São esses os redutos envolvidos, desde o início do ano, na conflagração entre dirigentes do PT e do PMDB, com tanto empenho, que há cisões dentro dos próprios partidos. As táticas usadas, na tentativa de sensibilizar o Planalto, ultrapassam em muito o que seria razoável na disputa pelos melhores espaços quando da formação de um governo.

A cobiça explícita é um alerta para a presidente Dilma Rousseff, que preferiu adiar as nomeações com o objetivo de assumir o controle do processo conduzido até então pelo jogo de pressão e barganha. A providência será completa se a presidente transmitir aos brasileiros a certeza de que políticos oportunistas não irão se apoderar de órgãos importantes, muitas vezes em cumplicidade com quadrilhas organizadas para desviar verbas públicas. Na base das falcatruas, está a falta de transparência e o descaso com a prestação de contas, que desprezam a transparência, a lisura e a probidade. O mais sensato, mesmo que seja um ideal ainda difícil de atingir, seria a nomeação de profissionais capazes e íntegros para as funções vagas. E que assim o Estado se visse finalmente livre de conchavos e partilhas vergonhosas.

EDITORIAL ZERO HORA 25/01/2011

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

FUNDO NACIONAL DE SAÚDE CAMPEÃO DE REPASSES IRREGULARES

Desvios no segundo escalão somam R$ 1,3 bi - Zero Hora 23/01/2011

Os 10 órgãos do segundo escalão mais disputados pelos partidos que apoiam a presidente Dilma Rousseff tiveram de responder à Controladoria-Geral da União (CGU) por irregularidades no repasse de R$ 1,35 bilhão a Estados, municípios e entidades nos últimos quatro anos.

O recordista é o Fundo Nacional de Saúde (FNS). De 2007 até 2010, a CGU concluiu que R$ 663,12 milhões em repasses tiveram irregularidade em pagamentos a conveniados do Sistema Único de Saúde e de Autorizações para Internações Hospitalares (AIHs), desvios de finalidade e não prestação de contas.

O levantamento foi feito com base nos últimos quatro anos porque os partidos em torno de Dilma hoje já formavam a aliança que garantiu a reeleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Eles desejavam manter os mesmos ministérios e órgãos do segundo escalão, mas a presidente resolveu fazer algumas trocas de comando. Isso aumentou a guerra pelo espólio do atual governo.

O resultado das investigações da CGU foi enviado ao Tribunal de Contas da União (TCU), ao qual cabe abrir as auditorias sugeridas pela controladoria. Também compete ao TCU aplicar as sanções aos órgãos investigados e aos conveniados. Em vários ocasiões, a CGU acionou a Polícia Federal.

O FNS vinha sendo disputado pelo PT e pelo PMDB. Venceu o PT. O ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, assinou na sexta-feira a nomeação de Antonio Carlos Rosa de Oliveira Júnior para a diretoria do FNS, em substituição a Arionaldo Bomfim Rosendo, indicado pelo PMDB na gestão do ex-ministro José Gomes Temporão. Rosa de Oliveira era diretor da Secretaria Nacional de Renda e Cidadania do Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), que cuida do programa Bolsa Família.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Não é a toa que a saúde pública no país é uma calamidade.

sábado, 22 de janeiro de 2011

CAOS AFLINGE E SOBRECARREGA MÉDICOS


SOS HOSPITALAR. Emergências lotadas afligem médicos - Zero Hora 22/01/2011

Atendimento de urgência no Clínicas, no Conceição, no São Lucas e na Santa Casa, em Porto Alegre, segue congestionado

Que os pacientes são as maiores vítimas do colapso das emergências nos hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS), todos sabem. O que talvez a população não conheça, ao menos plenamente, é como a sobrecarga afeta o trabalho de médicos, enfermeiras e auxiliares.

Encarregados de salvar doentes graves, eles se sentem inseguros, estressados e angustiados com o excesso de responsabilidades (confira depoimentos).

Ontem, numa rotina que se agravou durante a semana, as emergências dos maiores hospitais da Capital continuavam saturadas.

A causa do esgotamento é recorrente em todos os estabelecimentos: faltam leitos equipados para tratar enfermos graves (de coração, pulmão e câncer) após o atendimento emergencial. Sem poder transferir os pacientes para as alas de internação, as emergências se mantêm ocupadas. Sem contar que o ingresso de doentes é crescente. O resultado é que médicos, enfermeiras e auxiliares atuam no limite, além do que seria recomendado.

Emergências - A situação de ontem 21/01/2011

- Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) 137 pacientes para 49 leitos
- Hospital São Lucas 26 pacientes para 15 leitos
- Hospital Santa Casa 28 pacientes para 12 leitos
- Hospital Conceição 129 pacientes para 50 leitos

“É o que a gente consegue” - Leonardo Fernandez - Chefe do Serviço de Emergência da Santa Casa, Fernandez, 46 anos, acredita que a gestão da saúde do país tem problemas, mas eles não serão resolvidos enquanto não houver aumento dos investimentos na área. Ontem, Fernandez falou com ZH sobre a rotina numa emergência superlotada:

“A emergência da Santa Casa está sempre lotada, com até 200% da capacidade. As pessoas acabam sendo acomodadas em macas, poltronas. É o que a gente consegue fazer, como de resto se faz em outras emergências. É um desgaste para os pacientes, para nós, médicos, para os enfermeiros, para os técnicos, para os familiares.

A população vê as pessoas amontoadas e o problema da falta de espaço físico salta aos olhos. Mas este problema nem sempre é o mais grave. Muitas vezes, a assistência fica prejudicada porque não tem recursos humanos parados, disponíveis, para atender de uma hora para outra um volume tão grande de pacientes. Em consequência, há atrasos na administração de medicamentos. Às vezes, as medicações podem ser administradas erradas.

Nós, periodicamente, temos surtos de infecções em Porto Alegre, e um dos motivos é a superlotação destes locais. Imagina que cada paciente tem de ser atendido por um técnico de enfermagem, por um médico, e estes profissionais têm de lavar as mãos e se higienizar para tocar em outra pessoa. Em algum momento, as mãos podem não ser lavadas adequadamente. E acabam sendo transmitidas infecções. Sem falar no fato de serem pacientes com diversas suspeitas acomodados em um mesmo ambiente: um com suspeita de tuberculose, outro com suspeita de meningite, outro com câncer. É um risco absurdo. A internação hospitalar, hoje, no Brasil, talvez seja mais risco do que benefício, sobretudo se a permanência for longa e o paciente, uma pessoa idosa.

“É uma panela de pressão” - Paulo Atanazio - Há 11 anos atuando no setor de emergência, Paulo Henrique Miler Atanazio, 42 anos, alerta que a superlotação de pacientes deixa os médicos inseguros e estressados. Confira o depoimento do clínico e pneumologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA):

“Sempre há mais pacientes para cuidar do que o ideal. Sempre há a insegurança se o procedimento certo está sendo feito, porque não há tempo de revisar com calma os casos. Opta-se pela conduta que, em um primeiro momento, parece a mais acertada. Não sobra tempo para se analisar detidamente cada caso e revisar as possibilidades diagnósticas e terapêuticas.

Procura-se usar o critério da gravidade para o atendimento de qualquer paciente. Naqueles que aguardam a consulta inicial, há uma classificação de risco: os mais graves são assinalados com uma bandeirinha roxa. Depois, vêm os com bandeira vermelha. Depois, os amarelos e os verdes.

É comum se receber vários pacientes com bandeira roxa ao mesmo tempo. Mas outros colegas ajudam. Sempre tem cobertura. O grande problema, no entanto, são os pacientes de maior complexidade, que ficam na emergência por dias, sem que se consiga chegar a um diagnóstico e a uma proposta terapêutica coerentes. Por conta do excesso de pacientes, falta tempo para uma análise mais detalhada desses casos.

Pela falta de leitos, os pacientes ficam sentados três ou mais dias, frequentemente com piora dos sintomas. Como o médico é quem atua na linha de frente, acaba recebendo as queixas dos pacientes e familiares pela demora nos procedimentos, situação sobre a qual não tem ingerência.

Trabalha-se numa panela de pressão. O estresse é violento.”

“É difícil lidar com isso” - Fernanda Longhi - Coordenadora da Emergência do Hospital São Lucas, a médica Fernanda Longhi, mestre em Medicina, experimenta um misto de angústia e impotência: depara com pacientes idosos, debilitados, acomodados em cadeiras incômodas, à espera de um leito:

“A situação mais angustiante na emergência é ver um idoso, debilitado, mal acomodado por falta de leitos no hospital. É bem difícil lidar com essa situação, que é diária.

Para amenizar o sofrimento de pacientes e familiares, mobilizamos uma equipe multidisciplinar envolvendo Serviço Social e Psicologia, que nos tem dado um apoio importante.

Outro estresse diário é administrar a sala destinada ao atendimento de pacientes que chegam em parada cardíaca. Esses pacientes precisam ser atendidos imediatamente na sua chegada, o que exige leito disponível. Após, devem ser direcionados a uma UTI, que também encontra-se constantemente lotada. Então, em razão dessa superlotação, os pacientes acabam ficando internados na própria sala de parada. Todos os dias é feito um grande esforço no hospital para a acomodação dos pacientes. Outra situação estressante é manter o fluxo do atendimento, o que nem sempre é possível. No lugar destinado ao atendimento, há sempre alguém internado. Não é fácil.

Para organizar a nossa rotina, damos prioridade para os pacientes muito graves, que precisam receber atendimento imediato porque têm risco iminente de vida. Depois, os pacientes da urgência, que podem esperar até uma hora. Por fim, os pacientes de menor risco, que podem esperar até seis horas. Na maioria das vezes, conseguimos respeitar esses tempos, mas há ocasiões em que o tempo de espera se prolonga mais do que o preconizado, infelizmente.”

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A SAÚDE NA EMERGÊNCIA


EDITORIAL ZERO HORA 21/01/2011

O cenário de desalento na emergência do Hospital de Clínicas, com pacientes acomodados em macas e cadeiras de rodas, poderia ser comparado, sem exageros, ao que se vê em situações de catástrofes como as registradas no Rio. Com procura muito além da capacidade de atendimento, uma instituição de ponta, reconhecida nacionalmente, é confrontada com seus limites, como tantos outros hospitais de Porto Alegre e do Interior. As imagens captadas ontem no Clínicas revelam que as deficiências da saúde pública apenas se agravam, quando deveriam pelo menos ser atenuadas.

Especialistas em saúde pública se dedicam, há muito tempo, ao diagnóstico do que se passa, não só nos corredores das emergências, mas em todas as áreas de um hospital aberto à comunidade por dever constitucional. Nesse contexto de tantas deficiências, o Clínicas e outras entidades que prestam serviços ao SUS são também vítimas de um conjunto impiedoso de fatores. A escassez de recursos, o primeiro a ser sempre lembrado, a falta de sincronia na gestão da rede hospitalar e outras causas tão propaladas não consolam, em especial os idosos e as crianças que se amontoam nas emergências.

Sabem os profissionais de saúde que as urgências são a parte mais visível dos hospitais públicos da Capital. Os transtornos se manifestam também em outras filas de espera de consultas especializadas e de cirurgias. A verdade é que os hospitais, onde todos os problemas deságuam, acabam por acolher pessoas que poderiam ter um atendimento preliminar em unidades de saúde. Muitos dos que se amontoam nas emergências já desistiram de recorrer a essa assistência, pelas limitações de recursos, de pessoal e dos horários de atendimento dos postos. O agravamento do quadro, em todo o país, exige pressa na execução de um dos projetos apresentados como prioritários pela presidente Dilma Rousseff. Sem mais Unidades de Pronto Atendimento, devidamente equipadas, os hospitais continuarão sendo o último amparo para uma multidão de aflitos.

SAÚDE SEM LEITO NAS EMERGÊNCIAS


SAÚDE SEM LEITO. Colapso na emergência hospitalar. Falta de vagas para internação faz com que setor emergencial dos principais estabelecimentos da Capital enfrentem superlotação - NILSON MARIANO, ZERO HORA 21/01/2011

Pacientes de pé, os braços conectados ao pedestal que prende a vasilha do soro. Idosos dormindo em cadeiras, enquanto aguardam o resultado de exames. Doentes graves à espera de um leito para internação há 10 dias. Macas e poltronas nos corredores. Médicos exaustos, enfermeiras se desdobrando para aliviar a sinfonia de gemidos. O cenário não é o de uma improvisada enfermaria em tempos de guerra, mas a emergência do Hospital de Clínicas Porto Alegre (HCPA). O quadro se repete no atendimento emergencial dos outros três principais estabelecimentos da Capital.

Na última semana, o Clínicas entrou em alerta vermelho: a emergência poderia atender a 49 pacientes, mas a média vem oscilando entre 120 e 140. Ontem, às 16h, havia 125 adultos no setor e 16 na sala de espera.

– Até o dobro da capacidade, conseguimos suportar. Depois, fica inviável – avisa o administrador da emergência, Daniel Barcelos.

Transitando há 20 anos na emergência do HCPA, o clínico e nefrologista Gérson Nunes ressalta que o drama “é crônico” e parece não sensibilizar as autoridades. Sobrecarregados e aflitos com a situação, médicos, enfermeiras e auxiliares atuam no limite.

– A gente trabalha com vergonha, chateado, constrangido – diz Nunes.

A causa do esgotamento é a falta de leitos para o pós-emergência. Os pacientes entram no Clínicas e ficam no setor, porque não há vagas para internação depois do atendimento. Mas o número dos que chegam supera o dos que saem. Há doentes que ficam uma semana, 10 dias, à espera de transferência. Já houve quem morresse na emergência, à espera de internação.

Além da falta de leitos, exames entram em fila

É uma questão matemática. Os 700 leitos da ala de internação estão invariavelmente ocupados. Logo, os pacientes da emergência não podem ser removidos. Há leitos em outros hospitais, mas Nunes diz que não são equipados para casos complexos.

– O que precisamos é de leitos com capacidade de resolver. E isso não existe – reclama.

A suposição de que as emergências lotam porque alguns pacientes deveriam, antes, consultar nos postos de saúde não se confirma. O administrador Barcelos esclarece que apenas 2% não precisariam do atendimento especializado. O percentual não influi no excesso. Depois de medicados, eles voltam para suas casas.

– O problema é a falta de leito. Pacientes estão completando o tratamento na emergência, quando deveriam ir para a internação – repete Barcelos.

A saturação se reflete em todos os serviços. A agenda de exames atrasa. Nas tomografias e ecografias, a prioridade é para os pacientes graves. Barcelos nota que muitos procuram o Clínicas em busca de um diagnóstico preciso, depois de peregrinar em vão pela rede do Sistema Único de Saúde (SUS).

Causou surpresa que a emergência superlotasse no verão, no período de férias. O médico Nunes diz que não há novidade. E desabafa:

– Sempre foi assim. Não há crise alguma agora, não há uma explicação nova. Sempre foi ruim. O problema é crônico, às vezes se torna público.

Nunes e seus colegas sentem-se expostos, constrangidos. Ele relata uma conversa que teve com um paciente, ilustrativa da precariedade:

– Pensei que ia ser internado hoje – diz o doente.

– Não, o senhor terá de aguardar leito. Isso pode levar dias, semanas – explica o médico.

– Ficarei sentado, esperando? – questiona o paciente, preparando-se para o sacrifício.

– Não, o senhor ficará de pé, porque não tem lugar para se sentar...

Paciente em cadeira desde terça-feira

Sentado em uma cadeira, a cabeça recostada à parede, Leo Miguel Niederle, 65 anos (foto), está na emergência do Clínicas desde às 7h30min de terça-feira. Veio de Ivoti com dores abaixo do abdômen. Às 21h30min de ontem, 62 horas depois de dar entrada no setor, aguardava o resultado de exames.

– Sigo esperando – balbuciou.

Leo Miguel sente dores até para falar. Às vezes, tenta dormir na cadeira, vencido pelo cansaço. Nas noites que passou na emergência, não pôde se deitar. O rosto contraído, uma lágrima escapava-lhe pelo olho esquerdo.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

SAÚDE - 86% DOS INTERNAUTAS BRASILEIRO CONTROLAM PELA INTERNET

Pesquisa: 86% dos internautas brasileiros usam a internet para saber mais sobre a própria saúde. Somente uma em cada quatro pessoas verifica a credibilidade das informações - Clickrbs, Zero Hora, Bem-Estar - 04/01/2011

Uma pesquisa divulgada nesta terça-feira revelou que 86% dos brasileiros com acesso à internet utilizam a rede para buscar orientações sobre saúde, remédios e outros temas relacionados. Os dados da pesquisa revelam que 68% dos brasileiros buscam online informações sobre medicamentos, 45% procuram se informar sobre hospitais e 41% querem conhecer na internet experiências de outros pacientes com determinado problema de saúde. No entanto, somente um quarto das pessoas verifica as fontes das informações de saúde disponíveis na internet.

Os resultados mostraram que a maioria dos brasileiros (57%) gostaria de poder renovar suas prescrições de tratamentos pela internet, enquanto 55% gostariam de usar a rede para marcar as consultas e 54% mostram interesse em acessar seus prontuários médicos ou resultados de testes online. Atualmente, 23% marcam consultas, acessam seus prontuários médicos e resultados de testes pela internet.

Com smartphones e tablets em vias de superar as vendas de computadores pessoais em 2012, não só existem mais informações online como também mais formas de acessá-las. Um relatório da London School of Economics (LSE), divulgado nesta terça-feira, apontou que haverá dificuldades para selecionar o conteúdo, já que os internautas não verificam a fonte das informações.

— Informações de saúde não confiáveis disponíveis na internet podem trazer sérias consequências. O paciente pode interpretar erroneamente seus sintomas, levando a uma corrida por exames e até tratamentos desnecessários. Ou o contrário, pode levar o paciente a subestimar o problema. Para quem estiver procurando informações online, é realmente importante se certificar de que a fonte é segura — afirma Sneh Khemka, diretor médico da Bupa Internacional, empresa idealizadora da pesquisa.

A pesquisa entrevistou 12.262 pessoas em 12 países, sendo 1.005 brasileiros. Além do Brasil, participaram da pesquisa a Austrália, China, França, Alemanha, Índia, Itália, México, Rússia, Espanha, Reino Unido e EUA. No Brasil, a idade da amostra foi representativa da população até 50 anos.

Dados globais da pesquisa:

:: os russos são os que mais pesquisam tais informações na Internet (96%), seguidos pela China (92%), Índia (90%), México (89%) e Brasil (86%). Os franceses são os que menos utilizam pesquisam informações de saúde (59%);

:: as mulheres são mais propensas (86%) a usar a Internet para questões de saúde do que os homens (77%);

:: as pessoas mais jovens (18-24 e 25-34) usaram mídias sociais para se informar sobre questões de saúde – aproximadamente um quarto deste grupo etário publicou comentários/perguntas ou usou sites como o Facebook ou o MySpace para este fim. A porcentagem se reduz com a idade.

Dicas para pesquisa de informações de saúde online:

:: ao fazer esse tipo de busca é importante ser o mais específico possível com os termos de pesquisa;

:: mesmo que a pesquisa encontre um site com aspecto promissor, vale a pena conferir a fonte das informações;

:: confira se há um selo de qualidade: sites de saúde confiáveis podem exibir um selo de qualidade de uma instituição independente. O selo pode garantir que o site divulga informações dignas de confiança;

:: se não houver uma marca de qualidade, é importante descobrir quem é responsável pelo site e quem são os autores do conteúdo. procure a seção 'A Nosso Respeito;

:: Verifique a data: conselhos médicos podem ficar desatualizados, por isso confira em que época a informação foi publicada e data da última atualização.

:: Fale com o seu médico: por mais confiável que a informação encontrada seja, se você estiver com algum problema de saúde deve buscar a orientação do seu médico e não se automedicar.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Sabe o que isto significa? Significa que os serviços de saúde pública no Brasil são burocratas, morosas e precários. O SUS, cantado em verso e prosa pelos governantes, é um sistema caótico onde faltam leitos, hospitais públicos, agentes de saúde e tecnologia atualizada. Grande parte dos recursos previstos em lei para a saúde são desviados pela corrupção e por interesses políticos. Aos agentes públicos da saúde são oferecidos salários miseráveis diante de uma enorme demanda sem condições de trabalho. Um dos resultados é este, em que as pessoas procuram se medicar consultando a internet. Ao invés de morrer nas filas preferem morrer na frente do computador. Isto que a geração nerd é de maioria classe média.

domingo, 2 de janeiro de 2011

DF DECRETA SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA

Agnelo decreta situação de emergência na saúde do DF - FOLHA ONLINE, DE BRASÍLIA - 01/01/2011

Para ter mais recursos e driblar a burocracia para aplicar verbas, o novo governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), decretou na tarde deste sábado situação de emergência na saúde pública.

Agnelo também assinou outros quatro decretos, ente eles o que exonera os mais de 15 mil ocupantes de cargos comissionados (sem concurso) e o dá prazo de mais cinco dias úteis para conclusão das concorrências públicas iniciadas no governo tampão de Rogério Rosso (PMDB).

O recém-empossado secretário de Saúde do DF, Rafael Barbosa, anunciou que, com a situação de emergência, haverá mais recursos materiais e humanos à disposição da Secretaria de Saúde. Também será possível assinar contratos emergenciais e repor recursos orçamentários com mais facilidade. O GDF vai poder ainda comprar medicamentos e equipamentos sem licitação.

Agnelo também decidiu demitir da máquina pública pessoas ligadas às administrações anteriores. Por isso, demitiu 95% dos 18,5 mil servidores comissionados e prometeu reduzir à metade o número de ocupantes em cargos de confiança.

PROMESSA PRESIDENCIAL - CONSOLIDAR SUS



Dilma promete ampliar Prouni e 'consolidar' SUS - DE BRASÍLIA - FOLHA ONLINE, 01/01/2011 - 15h40

A presidente Dilma Rousseff, 63, prometeu, em seu discurso de posse, estender o Prouni para o ensino médio e tornar o SUS (Sistema Único de Saúde) "um dos maiores e melhores sistemas de saúde pública do mundo".

O Prouni é um programa criado pelo governo Lula que oferece bolsas de estudo em universidades particulares para estudantes de baixa renda. Dilma afirmou que pretende fazer o mesmo para que adolescentes possam estudar em escolas particulares de ensino médio.

"Além do aumento do investimento publico vamos estender a vitoriosa experiência do Prouni para o ensino médio profissionalizante, acelerando a oferta de milhares de vagas para que nossos jovens recebam uma formação educacional e profissional de qualidade", disse.

Ela afirmou, no entanto, que o ensino de qualidade só existirá no Brasil quando "o professor e a professora forem tratados como as verdadeiras autoridades da educação, com formação continuada, remuneração adequada e sólido compromisso com a educação das crianças e jovens".

Sobre o SUS, ela disse que quer consolidá-lo.

"Quero ser a presidenta que consolidou o SUS, tornando-o um dos maiores e melhores sistemas de saúde pública do mundo", disse. "O SUS deve ter como meta a solução real do problema que atinge a pessoa que o procura, com uso de todos os instrumentos de diagnóstico e tratamento disponíveis, tornando os medicamentos acessíveis a todos, além de fortalecer as políticas de prevenção e promoção da saúde".

Durante o discurso, a palavra mulher foi citada 12 vezes por Dilma, enquanto ela falou miséria seis vezes. Já Lula foi lembrado cinco vezes durante o discurso.