ZERO HORA 06 de setembro de 2012 | N° 17184
COMBATE À GRIPE A
Especialistas criticam postura do ministério
ITAMAR MELO
A entrevista publicada ontem em ZH com o secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Jarbas Barbosa, estarreceu especialistas e entidades da área médica.
Apesar de os casos e as mortes por gripe A estarem concentradas no Sul, Barbosa reafirmou que Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná não terão política diferenciada de vacinação, como reivindicam as secretarias estaduais de Saúde e recomendam entidades médicas da região.
O homem do ministro Alexandre Padilha e da presidente Dilma Rousseff na área da vigilância foi além em suas afirmações, surpreendendo os especialistas: disse que a vacina tem pouca eficácia e que não existe evidência de que ampliar seu uso significa proteger melhor a população.
– Nunca vi um secretário de vigilância em saúde dizer que vacina não adianta. É inacreditável. Minimizar a importância da vacina é desmerecer tudo o que se fez até hoje na vigilância em saúde – reagiu o médico e deputado federal Osmar Terra, ex-secretário estadual da Saúde.
Ontem, na Assembleia, o secretário estadual Ciro Simoni ressaltou a importância de antecipar a vacinação e de dobrar as doses no Estado. Estudo propondo essa estratégia foi encaminhado ao ministério pelos conselhos regionais de medicina e associações médicas de Rio Grande do Sul e Paraná há um mês. O documento foi elaborado por infectologistas, pediatras e profissionais de órgãos governamentais. O governo nem respondeu. A ZH, Barbosa disse que as entidades não têm expertise.
– A postura do secretário nos deixa a cada entrevista mais preocupados – afirma o presidente do Cremers, Rogério Wolf de Aguiar.
O que disse Jarbas Barbosa
Em 2010, o ministério vacinou quase 50% dos gaúchos. Não houve nenhum caso de gripe A. A partir de 2011, cortou mais de dois terços das doses. As mortes aumentaram. Barbosa diz que o aumento não tem a ver com a redução da vacinação e que já era esperado que houvesse poucos casos em 2010, porque o vírus circulou muito em 2009, imunizando as pessoas. Neste ano, segundo ele, as mortes aumentaram porque a circulação do vírus cresceu, e não porque a vacinação caiu.
O que dizem os especialistas
Se a argumentação de Barbosa está correta, o ministério adotou a curiosa política de vacinar em massa quando o vírus circula pouco e de cortar a vacinação quando o vírus circula muito. Mas o ex-secretário estadual de Saúde Osmar Terra contesta o raciocínio de Barbosa:
– Quem contrai a gripe A fica imunizado permanentemente. Se a razão para não termos tido casos em 2010 fosse que a população teve contato com o vírus no ano anterior, então o número de caso deveria ter continuado em zero nos anos seguintes. A verdade é que não houve casos em 2010 porque a vacinação foi maciça.
O que disse Jarbas Barbosa
Segundo o representante do ministério, não existe evidência de que ampliar a vacinação, como reivindicam os gaúchos, aumenta a proteção contra o vírus. Para ele, vacinar mais gente pode até levar a um número maior de mortes.
O que dizem os especialistas
– Quanto mais pessoas vacinadas, menos casos e mortes – diz o infectologista Luciano Goldani.
O que disse Jarbas Barbosa
Segundo ele, a vacina tem entre 50% e 70% de eficácia.
O que dizem especialistas
O chefe do serviço de infectologia do Hospital de Clínicas, Luciano Goldani, observa que a eficácia está entre 60% e 90% e é maior para pessoas jovens e saudáveis, que não estão nos grupos vacinados pelo ministério e que correspondem ao perfil de quem morreu no Estado. Se a eficácia da vacina fosse baixa, diz o presidente do Cremers, Rogério Wolf de Aguiar, deveria haver entre os mortos várias pessoas de grupos de risco vacinadas.
– Quando olhamos quem morreu, achamos muita gente que tomou Tamiflu, mas quase nenhuma que foi vacinada. Não dá para esconder o sol com a peneira. A eficácia está na vacina.
O que disse Jarbas Barbosa
Barbosa afirmou que não faz diferença, para a proteção, iniciar a vacinação em fim de março, em abril ou em maio. Neste ano, a campanha começou apenas em maio.
O que dizem os especialistas
O diretor científico da Associação Médica do Rio Grande do Sul (Amrigs), Antonio Carlos Weston, afirma que é importante vacinar mais cedo porque o Sul tem uma situação climática especial e porque a vacina precisa de alguns dias até fazer efeito.
– É preciso vacinar antes dos meses frios, que são maio, junho, julho e agosto. Com isso, as pessoas vacinadas ficam protegidas, ajudam a diminuir a circulação do vírus e colaboram para que o pico do vírus seja menor.
O que disse Jarbas Barbosa
Os Estados mais ao Sul concentram os casos e as mortes por gripe A, mas Barbosa diz que eles não terão tratamento diferenciado.
– Idoso no Amazonas e idoso no Rio Grande do Sul para mim é igual – afirmou.
O que dizem especialistas
Infelizmente para os gaúchos, idoso no Amazonas e idoso no Rio Grande do Sul não é igual para o vírus da gripe A. É aqui que o H1N1 consegue circular e matar.
– O vírus da febre amarela faz a mesma coisa com uma pessoa do Amazonas ou do Rio Grande do Sul. Mas essa doença é um problema sério lá, não aqui. Não queremos a mesma política contra a febre amarela que é aplicada no Norte, mas precisamos de um programa especial para a gripe A, porque é aqui que tem gripe A – diz o presidente do Cremers.
O que diz Jarbas Barbosa
Que não há porque recorrer a uma medida que ele considera de baixa eficácia (a vacina), quando está disponível uma medida que ele considera de eficácia altíssima (a medicação com Tamiflu).
O que dizem os especialistas
Além de observarem que as pessoas que morreram tomaram Tamiflu e não vacina, os especialistas ressaltam que uma coisa não exclui a outra e lembram aquilo que toda dona de casa sabe: é melhor prevenir do que remediar.
– Não tem sentido combater com medicação o que pode ser controlado com prevenção. As declarações entram em contradição frontal e inexplicável com as políticas de prevenção do ministério – afirma o presidente do Cremers.
No Brasil, a saúde pública é tratada com descaso, negligência e impostos altos em remédios e tudo o que faz bem à saúde. Médicos e agentes da saúde são poucos e mal pagos; As pessoas sofrem e morrem em filas, corredores de ambulatórios e postos de saúde; As perícias são demoradas e burocracia exagerada; Há falta de leitos, UTI, equipamentos, tecnologia, hospitais e postos de saúde apropriados para a demanda; A impunidade da corrupção desvia recursos e incentiva as fraudes.
quinta-feira, 6 de setembro de 2012
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