JOANA COLUSSI | SÃO MARTINHO
FRAUDADORES SEM FRONTEIRA
Amais recente ação do Ministério Público Estadual (MPE) contra a adulteração de leite descobriu a atuação conjunta de fraudadores gaúchos e paranaenses. Receptora de cerca de 6,5 milhões de litros produzidos por mês no Rio Grande do Sul, uma das maiores indústrias de laticínios do Paraná é alvo da sexta fase da Operação Leite Compen$ado – que resultou ontem na prisão de quatro pessoas e na apreensão de caminhões em 11 municípios do noroeste gaúcho e dois paranaenses – Londrina e Pato Branco.
Com sede em Londrina, a Confepar Agro-Industrial Cooperativa Central mantinha há um ano e meio dois postos de resfriamento no Estado: em Selbach e São Martinho. O primeiro foi fechado em maio do ano passado, quando amostras de leite adulterado com ureia foram identificadas pela fiscalização. Desde então, a unidade em São Martinho passou a concentrar o recebimento do produto encaminhado para a Confepar, fabricante de leite UHT e derivados da marca Polly.
A partir de escutas telefônicas e do depoimento do investigado Antenor Signor, que optou por delação premiada, o MPE conseguiu constatar a participação da cooperativa na fraude. Conforme as investigações, responsáveis pela captação de leite no Rio Grande do Sul e no Paraná sabiam da má qualidade do produto recebido e ainda incentivavam a fraude para garantir matéria-prima.
– A cooperativa paranaense sabia que aquele leite era impróprio para consumo e mesmo assim recebia as cargas – afirmou o promotor de Justiça Mauro Rockenbach, responsável pelas investigações da operação, deflagrada em maio de 2013.
Fernando Júnior Lebens, um dos responsáveis pela captação do leite no Estado, foi preso ontem no posto de resfriamento da cooperativa, em São Martinho. No local, foram coletadas amostras de leite cru nos dias 12 de março e 3 de abril. Mais de 60 laudos apontaram alteração da composição em 192 mil litros, sinal da deterioração do produto.
– Era leite velho ou estragado que não poderia ser processado pela indústria – explicou Milene Cristina Cé, fiscal federal agropecuária.
UM PRESO JÁ RESPONDE PORIRREGULARIDADE SEMELHANTE
Diferentemente das outras fases, a sexta operação não detectou a presença de substâncias químicas no leite – como ureia com formol ou soda cáustica. A prisão decretada no Paraná é do responsável pela captação de leite da Confepar, Marildo Galon. Até ontem à noite, o investigado não havia sido localizado pela polícia.
– O leite captado pela Confepar não é vendido no Rio Grande do Sul. A decisão sobre recall é dos órgãos paranaenses competentes – explica Alcindo Luz Bastos Filho, promotor de Justiça.
Além das prisões, foram cumpridos mandados de busca e apreensão de 24 caminhões em Ijuí, Taquaruçu do Sul, Ibirubá, Campina das Missões, Alegria, Boa Vista do Buricá, Crissiumal, São Valério do Sul, São Martinho, Cruz Alta e Coronel Barros.
Denunciado na primeira fase da Operação Leite Compen$ado, em maio do ano passado, o empresário Cleomar Canal, um dos sócios da Transportes Três C, de Ibirubá, parece não ter se intimidado com as investigações. Canal, que respondia o processo em liberdade, foi preso ontem. Conforme as investigações, o transportador passou a entregar leite adulterado à Confepar.
Também foi detido o presidente da Cooagrisul, Alcenor Azevedo dos Santos, de Taquaruçu do Sul. Alcenor é apontado como comprador de ureia no mesmo período em que entregou leite adulterado no posto da cooperativa paranaense. A quarta pessoa detida foi Diego André Reichert, transportador de leite em Campina das Missões.
COOPERATIVA SABIA que estava comprando produto deteriorado, aponta comunicação interceptada pelo Ministério Público Estadual
Denúncia chegou em envelope pardo
CARLOS WAGNER
No fim de abril, um envelope de cor parda, sem remetente, fazia parte da volumosa correspondência do promotor Mauro Rockenbach, da Promotoria Especializada Criminal. Dentro do envelope havia evidências que ajudariam a montar a fase seis da operação, concretizada ontem em São Martinho. O conteúdo informava sobre a existência de um resfriador de leite – onde o produto é armazenado depois de recolhido por transportadores nas propriedades rurais – clandestino, no interior de Taquaruçu do Sul, pequeno município agrícola no norte do Estado. Fotos e relatos detalhados do que ocorria no resfriador convenceram os promotores que valia apurar.
Com uma equipe enviada à região, foram 48 horas de investigação. A primeira dificuldade foi localizar o resfriador. O trabalho precisa ser feito de maneira discreta – o objetivo é preservar as provas e a identidade do denunciado. Não é fácil ser discreto, porque qualquer veículo ou pessoa estranha chama atenção.
A equipe voltou a Porto Alegre com as informações básicas sobre o caso. Depois, houve cruzamento da investigação com dados dos envolvidos em fraudes. Foi descoberto que os responsáveis pelo resfriador clandestino tinham ligações com o veterinário Daniel Riet Villanova, preso na primeira operação.
Também foi constatado que haviam comprado ureia – usada para disfarçar a mistura de água no leite. Por último, a investigação observou que o leite era vendido para um posto de recolhimento pertencente à Confepar, uma cooperativa do Paraná sob suspeita de receber alimento adulterado.
Cooperativa atua no RS há dois anos
Com forte participação no norte do Paraná, a união de cooperativas paranaenses Confepar é velha conhecida dos produtores gaúchos, já que pelo menos há dois anos vinha ao Rio Grande do Sul em busca de leite.
A estratégia, considerada incomum no setor, porque cooperativas costumam comprar produtos apenas de associados, não agradou fabricantes gaúchos, que reclamavam de aumento de preço do produto com a entrada do competidor.
A Confepar processa cerca de 1 milhão de litros de leite por dia, o que a coloca em oitavo lugar no ranking de maiores laticínios do país. Com sede em Londrina e com 32 anos de atuação, a cooperativa foi citada na segunda fase da Operação Leite Compen$ado, em maio de 2013.
Presidente do Conseleite do Paraná, Ronei Volpi, afirmou ontem que “fraude é caso de polícia”:
– É preciso apurar, e caso seja confirmada a participação, a punição deve ser exemplar. Uma notícia dessas deixa os consumidores desconfiados e prejudica o setor – pondera.
Em nota, a Confepar reiterou que é “terminantemente contra qualquer tipo de adulteração no leite”. A cooperativa destacou também que sempre colaborou com as investigações do Ministério Público.
CADU CALDAS
OPERAÇÕES ANTERIORES
-1ª - 8/5/2013, Ibirubá, Ronda Alta, Boa Vista do Buricá, Horizontina e Guaporé
-2ª - 22/5, Rondinha, Boa Vista do Buricá e Horizontina
-3ª - 7/11, Três de Maio
-4ª - 14/3/2014, Tupanciretã, Panambi, Santo Augusto, Ijuí, Entre-Ijuís e outros municípíos
-5ª - 8/5, Paverama, Imigrante, Teutônia, Arroio do Meio, Encantado e outros municípíos.
CONTRAPONTOS
O QUE DIZEM AS DEFESAS DOS ACUSADOS DE ENVOLVIMENTO COM A FRAUDE
Fernando Júnior Lebens - O advogado Clóvis Willms informou que a defesa irá tomar conhecimento do processo antes de se pronunciar.
Alcenor Azevedo dos Santos - O advogado Marcos Lazaroto afirmou que seu cliente “é um pequeno produtor de leite que desconhece os motivos da acusação”.
As defesas de Diego André Reichert e de Cleomar Canal não foram localizadas até as 19h de ontem.
FRAUDADORES SEM FRONTEIRA
Amais recente ação do Ministério Público Estadual (MPE) contra a adulteração de leite descobriu a atuação conjunta de fraudadores gaúchos e paranaenses. Receptora de cerca de 6,5 milhões de litros produzidos por mês no Rio Grande do Sul, uma das maiores indústrias de laticínios do Paraná é alvo da sexta fase da Operação Leite Compen$ado – que resultou ontem na prisão de quatro pessoas e na apreensão de caminhões em 11 municípios do noroeste gaúcho e dois paranaenses – Londrina e Pato Branco.
Com sede em Londrina, a Confepar Agro-Industrial Cooperativa Central mantinha há um ano e meio dois postos de resfriamento no Estado: em Selbach e São Martinho. O primeiro foi fechado em maio do ano passado, quando amostras de leite adulterado com ureia foram identificadas pela fiscalização. Desde então, a unidade em São Martinho passou a concentrar o recebimento do produto encaminhado para a Confepar, fabricante de leite UHT e derivados da marca Polly.
A partir de escutas telefônicas e do depoimento do investigado Antenor Signor, que optou por delação premiada, o MPE conseguiu constatar a participação da cooperativa na fraude. Conforme as investigações, responsáveis pela captação de leite no Rio Grande do Sul e no Paraná sabiam da má qualidade do produto recebido e ainda incentivavam a fraude para garantir matéria-prima.
– A cooperativa paranaense sabia que aquele leite era impróprio para consumo e mesmo assim recebia as cargas – afirmou o promotor de Justiça Mauro Rockenbach, responsável pelas investigações da operação, deflagrada em maio de 2013.
Fernando Júnior Lebens, um dos responsáveis pela captação do leite no Estado, foi preso ontem no posto de resfriamento da cooperativa, em São Martinho. No local, foram coletadas amostras de leite cru nos dias 12 de março e 3 de abril. Mais de 60 laudos apontaram alteração da composição em 192 mil litros, sinal da deterioração do produto.
– Era leite velho ou estragado que não poderia ser processado pela indústria – explicou Milene Cristina Cé, fiscal federal agropecuária.
UM PRESO JÁ RESPONDE PORIRREGULARIDADE SEMELHANTE
Diferentemente das outras fases, a sexta operação não detectou a presença de substâncias químicas no leite – como ureia com formol ou soda cáustica. A prisão decretada no Paraná é do responsável pela captação de leite da Confepar, Marildo Galon. Até ontem à noite, o investigado não havia sido localizado pela polícia.
– O leite captado pela Confepar não é vendido no Rio Grande do Sul. A decisão sobre recall é dos órgãos paranaenses competentes – explica Alcindo Luz Bastos Filho, promotor de Justiça.
Além das prisões, foram cumpridos mandados de busca e apreensão de 24 caminhões em Ijuí, Taquaruçu do Sul, Ibirubá, Campina das Missões, Alegria, Boa Vista do Buricá, Crissiumal, São Valério do Sul, São Martinho, Cruz Alta e Coronel Barros.
Denunciado na primeira fase da Operação Leite Compen$ado, em maio do ano passado, o empresário Cleomar Canal, um dos sócios da Transportes Três C, de Ibirubá, parece não ter se intimidado com as investigações. Canal, que respondia o processo em liberdade, foi preso ontem. Conforme as investigações, o transportador passou a entregar leite adulterado à Confepar.
Também foi detido o presidente da Cooagrisul, Alcenor Azevedo dos Santos, de Taquaruçu do Sul. Alcenor é apontado como comprador de ureia no mesmo período em que entregou leite adulterado no posto da cooperativa paranaense. A quarta pessoa detida foi Diego André Reichert, transportador de leite em Campina das Missões.
COOPERATIVA SABIA que estava comprando produto deteriorado, aponta comunicação interceptada pelo Ministério Público Estadual
Denúncia chegou em envelope pardo
CARLOS WAGNER
No fim de abril, um envelope de cor parda, sem remetente, fazia parte da volumosa correspondência do promotor Mauro Rockenbach, da Promotoria Especializada Criminal. Dentro do envelope havia evidências que ajudariam a montar a fase seis da operação, concretizada ontem em São Martinho. O conteúdo informava sobre a existência de um resfriador de leite – onde o produto é armazenado depois de recolhido por transportadores nas propriedades rurais – clandestino, no interior de Taquaruçu do Sul, pequeno município agrícola no norte do Estado. Fotos e relatos detalhados do que ocorria no resfriador convenceram os promotores que valia apurar.
Com uma equipe enviada à região, foram 48 horas de investigação. A primeira dificuldade foi localizar o resfriador. O trabalho precisa ser feito de maneira discreta – o objetivo é preservar as provas e a identidade do denunciado. Não é fácil ser discreto, porque qualquer veículo ou pessoa estranha chama atenção.
A equipe voltou a Porto Alegre com as informações básicas sobre o caso. Depois, houve cruzamento da investigação com dados dos envolvidos em fraudes. Foi descoberto que os responsáveis pelo resfriador clandestino tinham ligações com o veterinário Daniel Riet Villanova, preso na primeira operação.
Também foi constatado que haviam comprado ureia – usada para disfarçar a mistura de água no leite. Por último, a investigação observou que o leite era vendido para um posto de recolhimento pertencente à Confepar, uma cooperativa do Paraná sob suspeita de receber alimento adulterado.
Cooperativa atua no RS há dois anos
Com forte participação no norte do Paraná, a união de cooperativas paranaenses Confepar é velha conhecida dos produtores gaúchos, já que pelo menos há dois anos vinha ao Rio Grande do Sul em busca de leite.
A estratégia, considerada incomum no setor, porque cooperativas costumam comprar produtos apenas de associados, não agradou fabricantes gaúchos, que reclamavam de aumento de preço do produto com a entrada do competidor.
A Confepar processa cerca de 1 milhão de litros de leite por dia, o que a coloca em oitavo lugar no ranking de maiores laticínios do país. Com sede em Londrina e com 32 anos de atuação, a cooperativa foi citada na segunda fase da Operação Leite Compen$ado, em maio de 2013.
Presidente do Conseleite do Paraná, Ronei Volpi, afirmou ontem que “fraude é caso de polícia”:
– É preciso apurar, e caso seja confirmada a participação, a punição deve ser exemplar. Uma notícia dessas deixa os consumidores desconfiados e prejudica o setor – pondera.
Em nota, a Confepar reiterou que é “terminantemente contra qualquer tipo de adulteração no leite”. A cooperativa destacou também que sempre colaborou com as investigações do Ministério Público.
CADU CALDAS
OPERAÇÕES ANTERIORES
-1ª - 8/5/2013, Ibirubá, Ronda Alta, Boa Vista do Buricá, Horizontina e Guaporé
-2ª - 22/5, Rondinha, Boa Vista do Buricá e Horizontina
-3ª - 7/11, Três de Maio
-4ª - 14/3/2014, Tupanciretã, Panambi, Santo Augusto, Ijuí, Entre-Ijuís e outros municípíos
-5ª - 8/5, Paverama, Imigrante, Teutônia, Arroio do Meio, Encantado e outros municípíos.
CONTRAPONTOS
O QUE DIZEM AS DEFESAS DOS ACUSADOS DE ENVOLVIMENTO COM A FRAUDE
Fernando Júnior Lebens - O advogado Clóvis Willms informou que a defesa irá tomar conhecimento do processo antes de se pronunciar.
Alcenor Azevedo dos Santos - O advogado Marcos Lazaroto afirmou que seu cliente “é um pequeno produtor de leite que desconhece os motivos da acusação”.
As defesas de Diego André Reichert e de Cleomar Canal não foram localizadas até as 19h de ontem.
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