David Uip
Não é de hoje que se apontam os grandes problemas da saúde pública nacional. Os especialistas são unânimes: o SUS (Sistema Único de Saúde) é subfinanciado e, em alguns casos, há problemas sérios de gestão que devem ser corrigidos.
Recorrentemente, a situação pré-falimentar das Santas Casas e hospitais filantrópicos, penalizados pela defasagem da tabela de pagamentos do Ministério da Saúde, vem sendo utilizada como o grande exemplo da escassez de recursos para custear a assistência em saúde para a população mais carente.
Mas a situação é ainda mais estarrecedora quando se analisam, especificamente, números relativos aos hospitais de ensino, aqueles que realizam os procedimentos mais complexos, como tratamentos cardíacos, transplantes, cirurgias oncológicas e radioterapia. Os hospitais de ensino são também referência na produção de conhecimento científico e formação de recursos humanos na área da saúde.
No Estado de São Paulo, há 45 hospitais de ensino, que realizam 1.471 procedimentos de alta complexidade de um total de 4.332 definidos pelo SUS. Esses serviços, que possuem um total de 14,6 mil leitos, realizaram no ano passado 634 mil internações e 61,8 milhões de atendimentos em ambulatório.
Chama a atenção o fato de que, enquanto a inflação acumulada pelo IPCA entre 2008 e 2012 foi de 31,9%, os repasses do SUS federal no mesmo período para custear internações e atendimentos ambulatoriais nos hospitais de ensino de São Paulo cresceram apenas 17,9% --isto é, menos da metade.
Mesmo somando outras fontes de receita, como repasses das universidades e do Tesouro estadual, doações, emendas parlamentares e vendas de bens e serviços, esses hospitais faturaram no ano passado 26,9% a mais do que em 2008 em termos nominais, mas, descontada a inflação, o dinheiro diminuiu.
Na contramão do financiamento, o número de procedimentos complexos nessas unidades vem aumentando. Em 2012, foram realizadas 44,4% mais angioplastias coronarianas, por exemplo, do que em 2008. Também houve, no período, crescimento de 65,5% no número de cirurgias de prótese de quadril, de 17,7% em revascularizações do miocárdio e de 34,8% em craniotomias.
Levando-se em consideração, ainda, que os hospitais de ensino do SUS paulista recebem pacientes dos quatro cantos do Brasil em busca de tratamento altamente especializado, sem nenhuma compensação financeira, o quadro se agrava ainda mais sob o ponto de vista das fontes de receita.
O governo do Estado de São Paulo vem sendo parceiro dos hospitais de ensino que prestam relevantes serviços aos usuários do SUS.
Além do auxílio financeiro extra às Santas Casas, a Secretaria de Estado da Saúde investe R$ 500 milhões em uma política de modernização dos hospitais universitários, para aquisição de equipamentos e renovação dos parques tecnológicos.
Para reforçar o atendimento de alta complexidade, o governo paulista também aposta na ampliação do tratamento de câncer por meio da Rede Hebe Camargo e o fortalecimento dos 71 serviços oncológicos credenciados em todo o Estado.
Por esses e outros motivos, medidas estruturantes e integradas precisam ser priorizadas se o objetivo for o aprimoramento do SUS e a melhoria da qualidade na assistência.
A saúde do Brasil reivindica que a União destine ao SUS 10% da renda corrente bruta, o que representa R$ 136,2 bilhões para 2014 (até agora o governo liberou só R$ 90 bilhões). E se indignará com apenas 15% da renda líquida, que retira R$ 26,7 bilhões desse total.
DAVID UIP, 61, médico infectologista, é secretário de Estado da Saúde de São Paulo
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