quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

A BUROCRACIA QUE MATA



ZERO HORA 07 de janeiro de 2016 | N° 18407


EDITORIAIS



O episódio da paciente do Sistema Único de Saúde (SUS) que foi chamada para uma consulta 11 anos depois de sua morte ilustra com crueldade as falhas do atendimento público nessa área, mas sobretudo a falta de condições quase generalizada dos municípios para atender demandas que não param de crescer. A consulta havia sido solicitada há 15 anos, em Alvorada, para tratamento de uma febre reumática. Em 2004, a paciente acabou morrendo em decorrência de uma pancreatite. Mesmo que o atraso e a causa da morte não tenham relação direta, o fato é exemplar de erros nessa área e que, em muitas outras circunstâncias, acabam por abreviar a vida de pacientes dependentes do Sistema Único de Saúde.

A falha é atribuída à troca do sistema de informática da Secretaria Municipal de Saúde. Mas o SUS falha também por falta de verbas, por má gestão, por processos superados e pela relação sempre problemática entre os entes que deveriam mantê- lo como o mais essencial de todos os serviços públicos. Por tudo isso, o que aconteceu com a paciente somente comunicada depois do falecimento acaba por configurar o retrato da depreciação de um sistema que acumula deficiências de toda ordem. A origem de quase todos os problemas está nas estruturas – do atendimento básico ao procedimento mais complexo –, que deveriam ser compartilhadas por União, Estados e municípios.

Não há clareza sobre as atribuições de cada um e não se cumpre o que determina a Constituição, de que a saúde é um direito de todos, porque foram criadas obrigações sem a previsão racional de recursos. Tanto que, a cada ano, a União se debate com orçamentos insuficientes e Estados e municípios também se queixam da incapacidade de cumprirem o que a lei determina. Além disso, recursos escassos são criminosamente desviados pela corrupção. As mudanças somente acontecerão quando União e governos estaduais e municipais forem cúmplices em suas responsabilidades e corrigirem falhas históricas num sistema que sistematicamente desperdiça recursos e vidas.