sexta-feira, 31 de outubro de 2014

SEGURANÇA E SAÚDE NA PAUTA



ZH 31 de outubro de 2014 | N° 17969


EDITORIAL



Foram vagas na campanha eleitoral as abordagens da maioria dos candidatos a cargos executivos aos planos capazes de viabilizar mudanças em duas áreas essenciais, mas precarizadas pelo descaso oficial ao longo de décadas. Saúde e segurança são setores enredados no emaranhado de atribuições de União, Estados e municípios. É repetitivo o argumento utilizado pela União de que o SUS, consagrado pela Constituição como serviço universal, igualitário a todos os brasileiros, não avança por deficiências das instituições estaduais e dos municípios.

A acusação se inverte quando a União é apontada como culpada pela escassez de verbas e pela falta de apoio a programas de prevenção, serviços de emergência, hospitais, tratamento especializado e cirurgias. A presidente reeleita deve trabalhar para que a saúde deixe de ser a maior de todas as vergonhas nacionais. A realidade e pesquisas entre usuários apontam essa como a área mais deficiente do país. Não há desculpas para o colapso que transformou doentes e familiares em protagonistas de um drama permanente, sem atendimento ágil, sem vagas em hospitais e sem acesso a consultas em muitas cidades.

Programas como o Mais Médicos podem ter contribuído para amenizar deficiências, mas há muito mais a fazer para combater carências, desperdícios e corrupção em estruturas completamente degradadas. É vergonhoso que uma demanda por cirurgia provoque espera de mais de ano, e que em alguns Estados os doentes sejam amontoados em espaços sem a mínima condição de serem aceitos como ambiente hospitalar.

A área da segurança passa pelos mesmos conflitos de competência, porque a maioria das tarefas é atribuição dos Estados. Essa desculpa predominou nos debates, com algumas ressalvas que devem se transformar em atitude concreta, como a promessa da presidente reeleita de que pretende manter a experiência bem-sucedida da Copa de unificação operacional das polícias.

O certo é que os Estados não dispõem de recursos para enfrentar o crescimento da criminalidade. E que a União precisa aperfeiçoar os mecanismos de controle de entrada de armas e drogas no país, ou tudo que for feito pelos governadores não terá o efeito esperado. A segurança deve ser tratada de forma integrada, com a racionalização de quadros e recursos, sem a desculpa de que essa é essencialmente uma tarefa constitucional dos Estados.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Não concordo. De novo o editorial de ZH confunde o direito á segurança com forças de segurança, e de novo acolhe a ideia de centralizar e politizar uma área técnica de justiça criminal. É preciso consolidar a responsabilidade federativa e sistematizar a justiça criminal envolvendo o judiciário, o mp, a defensoria e as forças policiais e prisionais na garantia do direito da população à justiça e segurança, amparado por leis duras contra o crime e pleno cumprimento da lei de execuções penais. Caso contrário, as forças de segurança se transformarão de exércitos dos governadores em exércitos da União.

sábado, 25 de outubro de 2014

PERDA DE LEITOS HOSPITALARES




O Estado de S.Paulo 24 Outubro 2014 | 02h 06


OPINIÃO



Mais um estudo - desta vez do Conselho Federal de Medicina (CFM) - coloca em evidência a grave crise por que passa a rede pública de saúde. Ele mostra, com base em dados do Ministério da Saúde, que de julho de 2010 a julho de 2014 houve uma redução considerável de leitos de internação colocados à disposição da população pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O trabalho vem corroborar as conclusões de outros semelhantes, realizados recentemente, sobre essa tendência.

O número de leitos do SUS caiu de 336,2 mil para 321,6 mil naquele período - uma redução de 14.671 -, e o Rio de Janeiro foi o Estado mais afetado. Ele perdeu 5.977 leitos, ou 40,7% do total, como mostra reportagem do jornal O Globo. O Ministério da Saúde não nega seus próprios números, como não poderia deixar de ser, mas tem uma visão muito diferente da do CFM sobre a questão. Alega que a necessidade de internação hospitalar diminuiu nos últimos anos, como consequência, entre outras coisas, de programas de prevenção de doenças e do Saúde da Família, e que ao mesmo tempo cresceu muito o número de outros tipos de leitos.

Em ocasiões anteriores em que o problema foi levantado, as autoridades da área de saúde observaram que se deve levar em conta também a redução de leitos no setor de psiquiatria, justificada por terem surgido novas formas de tratamento que dispensam a internação.

De fato, como o próprio CFM reconhece, os chamados leitos complementares saltaram de 24.244 para 27.148 nos quatro anos do estudo. Os leitos de observação passaram de 80.742 para 91.710 no período e, como faz questão de ressaltar o Ministério, os leitos de UTI, ditos de maior complexidade, aumentaram de 15.509 para 19.394, um crescimento de 25% nos últimos três anos.

Uma coisa, porém, não exclui a outra. Do fato de a criação desses leitos ser uma necessidade não se deduz que ela justifique a eliminação de leitos de internação, e menos ainda na grande quantidade registrada. Tem razão, por isso, o vice-presidente do CFM, Mauro Ribeiro, quando recomenda não confundir as duas coisas. "Usam-se afirmações verdadeiras e justificativas falsas. Quando se coloca que há um aumento da tecnologia, medicações mais eficientes e tempo de internação menor do que há 20 anos, isso é verdadeiro. Mas usar isso para fechar leitos é justificativa falaciosa. Há filas para cirurgias eletivas e superlotação nos prontos-socorros", afirma.

Não são apenas a simples constatação que qualquer um pode fazer pessoalmente e as frequentes reportagens de jornais e televisões, estas com cenas particularmente chocantes, que comprovam a superlotação dos hospitais, com doentes atendidos nos corredores. Trabalhos técnicos de inegável seriedade fazem o mesmo.

Um estudo do Tribunal de Contas da União, feito em 2013, em 116 hospitais distribuídos por todos os Estados e o Distrito Federal, que constitui uma amostra representativa do sistema público de saúde, mostrou que nele faltam leitos, profissionais de saúde, medicamentos e equipamentos. A maioria dos dirigentes das unidades avaliadas, 64%, disse existir superlotação nos setores de emergência. Não foram poucos os casos constatados de pacientes atendidos em corredores, em macas e até em cadeiras.

A conclusões quase idênticas - algumas até mais chocantes - chegou um estudo posterior, feito por deputados da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, representantes do Conselho Federal de Medicina e do Ministério Público Federal em oito unidades de atendimento de urgência espalhadas pelo País. "Existem casos que são verdadeiros acampamentos de guerra. As pessoas são depositadas ali", denunciou um dos membros do grupo, deputado Arnaldo Jordy (PPS-PA).

É grave e preocupante, sim, a eliminação de 14.671 leitos hospitalares em quatro anos, porque, se eles pudessem ser compensados pelos milhares de outros criados corretamente, como pretende o Ministério da Saúde, a situação não seria essa mostrada por tais estudos.


 

A SAÚDE PÚBLICA ESQUECIDA



O Estado de S.Paulo 25 Outubro 2014 | 02h 04


OPINIÃO



Durante os 12 anos em que o PT está no poder, o Ministério da Saúde deixou de aplicar cerca de R$ 131 bilhões no Sistema Único de Saúde (SUS), conforme dados do Conselho Federal de Medicina (CFM). Diante dessa realidade, não é de estranhar que a saúde pública continue recebendo notas de avaliação tão baixas pelos brasileiros. A prioridade da população não é a prioridade do governo.

De 2003 até 2014, o Orçamento-Geral da União autorizou um pouco mais de R$ 1 trilhão para o Ministério da Saúde. Os valores efetivamente gastos totalizam, no entanto, R$ 891 bilhões. Resultado: R$ 131 bilhões deixaram de ser aplicados na saúde pública. O CFM traduz essa cifra da seguinte forma: com esse valor seria possível, por exemplo, construir 320 mil Unidades Básicas de Saúde de porte I, ou edificar 93 mil unidades de pronto atendimento de porte III - com capacidade para atender até 450 pacientes por dia -, ou aumentar em quase 3 mil o número de hospitais públicos de médio porte.

As consequências de um corte desse vulto são evidentes. Segundo relatório do Tribunal de Contas da União, do início do ano, o SUS enfrenta "problemas graves, complexos e recorrentes": falta de leitos, profissionais, medicamentos e insumos hospitalares, equipamentos e instalações adequadas. Neste ano, a situação é idêntica: dos R$ 107,4 bilhões autorizados, foram gastos apenas R$ 80 bilhões. "A população brasileira tem o direito de saber onde, como e se os recursos que confiamos aos governos estão sendo bem aplicados. No caso da saúde, isso é ainda mais proeminente, tendo em vista as dificuldades de infraestrutura que milhares de pacientes, médicos e outros profissionais de saúde enfrentam todos os dias", afirmou Carlos Vital, presidente do CFM.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) já havia alertado para o fato de que, entre os países que possuem um sistema universal de saúde - como o SUS -, o Brasil tem o menor porcentual de participação do setor público (União, Estados e municípios) no investimento per capita em saúde. Segundo a entidade não governamental Contas Abertas, na Inglaterra o investimento público em saúde é cinco vezes maior do que o brasileiro.

Ainda que em tese o Brasil conte com o SUS, o brasileiro cada vez mais tem de recorrer ao sistema privado de saúde - ou seja, paga duas vezes pela saúde, nos impostos e nas mensalidades dos planos. Esse fenômeno de busca por um plano de saúde complementar se reflete nos números. Atualmente, o gasto público com saúde representa 45,7% do total aplicado em saúde. Em países cujo sistema é semelhante ao brasileiro, no qual se oferece um sistema universal, os gastos públicos giram em torno de 70% do total gasto com saúde no país. E se essa realidade é amarga para o brasileiro que tem de pagar duas vezes pela saúde, mais amarga ainda é para aqueles que - não tendo como pagar um plano de saúde privado - ficam dependentes de uma saúde pública tão mal gerida.

Essa má gestão fica evidente, por exemplo, ao olhar os investimentos do governo federal na saúde pública. Segundo informa o CFM, durante os 12 anos de PT no poder federal, foram autorizados R$ 81 bilhões para investimentos em saúde. No entanto, foram efetivamente gastos apenas R$ 30,1 bilhões. E o ano de 2014 vai se mostrando como mais um exemplo de que a saúde não é uma prioridade no orçamento deste governo. O Ministério da Saúde conta com uma dotação orçamentária para investimentos neste ano de quase R$ 10 bilhões. Porém, até setembro, apenas R$ 3,5 bilhões haviam sido efetivamente investidos. Isso faz com que o Ministério da Saúde esteja, no item investimentos, atrás dos Ministérios dos Transportes, da Defesa, da Educação e do Desenvolvimento Agrário.

O diagnóstico é claro: a saúde pública não é prioridade orçamentária do governo do PT. Há outras coisas que atraem mais a atenção da administração petista, como vai se descobrindo a cada dia que passa. Seria de esperar que a população fosse mais bem atendida nessa área, que - como há muito se constata - é sua prioridade.

terça-feira, 21 de outubro de 2014

FRAUDE NA REVALIDAÇÃO DE DIPLOMAS PARA PROGRAMA MAIS MÉDICOS



Do G1 MT  18/10/2013 12h37

Esquema de revalidação de diploma de medicina é desarticulado pela PF. Pessoas que não teriam diploma se inscreveram para revalidação. Esquema foi descoberto após denúncia da UFMT para a Polícia Federal.

Denise Soares



A Polícia Federal realiza nesta sexta-feira (18) a operação "Esculápio" contra um esquema de uso de diplomas e documentos falsos de medicina em Mato Grosso e outros 13 estados brasileiros. Segundo informações da PF, as investigações começaram após a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) identificar 41 pessoas que se inscreveram para revalidar o diploma de medicina e que alegaram ter estudado em instituições bolivianas. No entanto, essas pessoas não teriam concluído o curso de medicina ou nunca foram alunos daquelas instituições.

O objetivo era concluir os estudos em universidades federais ou ingressar no Programa Mais Médicos do governo federal. A PF informou ao G1 que pessoas que trabalham nas próprias universidades bolivianas forneciam documentos para esse grupo. O falso diploma tinha a marca da instituição e detalhes específicos da universidade.

A PF afirmou que a operação ocorre contra fraudes na revalidação de diplomas, sendo que a UFMT possui um programa próprio de revalidação para estrangeiros e não participa do Programa Revalida do Ministério da Educação (MEC). As pessoas que foram citadas na investigação não eram bolivianos, mas brasileiros que buscavam exercer a medicina no país.

Ministro defende investigação

O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, afirmou que a operação não tem relação com o Mais Médicos, mas defendeu a investigação para evitar fraudes no Revalida. "É uma operação da Polícia Federal que não tem nada a ver com o Mais Médicos. É em cima de estudantes que falsificavam diplomas para poder participar do Revalida", disse o ministro em entrevista na manhã desta sexta-feira ao visitar um centro de saúde na cidade de Samambaia, a 30 km de Brasília.

O ministro ressaltou que a operação partiu de denúncias da UFMT, em Mato Grosso, mas que a investigação acabou atingindo outros estados. "O Ministério da Saúde tem uma grande cooperação com a Polícia Federal também no programa Mais Médicos. É uma ação importante da Polícia Federal para evitar fraudes no programa Revalida".

Padilha disse também que o governo faz uma checagem sobre registros e antecedentes criminais de estrangeiros inscritos no Programa Mais Médicos. "É feita uma checagem antes com a Polícia Federal, que faz todo o acompanhamento. Inclusive se tem algum problema é excluído ou não aceito qualquer tipo de documentação desses profissionais", ponderou.

Segundo o ministro, a operação pode contribuir fortemente para que não exista qualquer tipo de fraude ou tentativa de inscrição no programa de profissionais que não sejam médicos. ''Nós estamos sendo muito rigorosos. O registro agora é feito pelo Ministério da Saúde com a parceria com a Polícia Federal e poderá irá excluir qualquer tentativa como essa também", completou.

Em nota, o MEC afirmou que a operação não tem qualquer relação com o Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos, que faz parte da Instituição de Educação Superior Estrangeira (Revalida), do Inep.

Mandados em diversos estados

Os mandados de busca e apreensão contra as 41 pessoas identificadas foram expedidos pela 7ª Vara Criminal da Justiça Federal de Mato Grosso. As buscas devem ser feitas em Alagoas, Acre, Amazonas, Bahia, Ceará, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Paraná, Paraíba, Pernambuco, Rondônia, Rio Grande do Sul e São Paulo. Conforme a PF, a UFMT fez contato com três universidades da Bolívia, que confirmaram que entre os inscritos no programa de revalidação, 41 pessoas nunca foram alunos ou não concluíram o curso nessas instituições.

Operação Esculápio, deflagrada pela Polícia Federal em Mato Grosso. (Foto: Reprodução/TVCA)

A PF analisou documentos encaminhados pela UFMT e constatou que, dos investigados que se inscreveram no programa de revalidação, 29 foram representados por cinco advogados ou despachantes, que teriam subrogado outras pessoas para realizar a inscrição dos supostos médicos.

Em Cuiabá, a PF procura por duas pessoas citadas no esquema e uma terceira em Tangará da Serra, a 242 quilômetros de Cuiabá. Os policiais também cumprem o mandado em Barra do Garças e Jaciara. Os suspeitos podem responder pelos crimes de uso de documento falso e falsidade ideológica.

O nome da operação, Esculápio, remete ao deus da medicina e da cura na mitologia greco-romana.


Entenda o esquema

- 41 pessoas investigadas conseguiam diplomas falsos de medicina em universidades na Bolívia;

- Através de procuradores e intermediários, o grupo tentava ingressar na UFMT;

- O objetivo dos investigados era, então, fazer prova de revalidação;

- Após ter a situação regularizada através da fraude, os investigados queriam ingressar no programa Mais Médicos.

sábado, 18 de outubro de 2014

O MÉDICO E AS PROMESSAS NA SAÚDE



ZH 18 de outubro de 2014 | N° 17956


FERNANDO WEBER MATOS*



Se boa parte das promessas feitas nos palanques fosse cumprida, a saúde pública no Brasil seria mesmo de “excelência”, para usar o termo ufanista empregado pelo ex-presidente Lula em 2006, numa de suas visitas ao Rio Grande do Sul

Com mais dinheiro injetado na saúde, a assistência seria de melhor qualidade e os médicos trabalhariam em condições dignas. O governo poderia implantar um plano de carreira no sistema público de saúde, a exemplo do que existe no Judiciário, para promover a interiorização dos médicos e demais profissionais da saúde.

Sim, o médico sozinho nos lugares mais afastados pouco pode fazer em termos de resolutividade se não tiver estrutura e uma equipe de trabalho. Só assim, ele pode prestar o atendimento que o cidadão brasileiro merece, diminuindo a necessidade de encaminhamento do paciente para outros centros.

Neste 18 de outubro, Dia do Médico, diante das dificuldades impostas ao trabalho médico em função do investimento insuficiente e da má gestão da saúde em todos os níveis, queremos reiterar que estamos e sempre estaremos ao lado do médico que, mesmo com dificuldades, trabalha por dias melhores na saúde e não mede esforços para atender seus pacientes.

Por isso, repudiamos com veemência qualquer tentativa de atribuir mazelas do sistema público de saúde aos médicos.

Lamentavelmente, a saúde dos palanques e dos horários políticos no rádio e na TV é muito diferente daquela que encontra o cidadão comum – não aquele que pode recorrer a hospitais particulares de ponta – quando necessita atendimento em situação de emergência, seja portador de um plano de saúde privado ou dependente do SUS.

Então, estamos diante de ações equivocadas, que não atendem aos interesses e clamores da sociedade. Como pode estar no caminho certo uma política que só tem feito menosprezar o médico registrado nos Conselhos de Medicina? Personagem central de qualquer programa sério de saúde, o médico não é valorizado adequadamente, diferente dos profissionais importados para o programa Mais Médicos.

Não podemos ficar calados, de braços cruzados, diante de ações que atingem o médico e toda uma sociedade que sempre soube valorizar a nobre atividade daqueles a quem todos recorrem – inclusive seus maiores detratores – e que têm como objetivo de vida curar, salvar e amenizar sofrimento.

Presidente do Cremers

domingo, 5 de outubro de 2014

ROBÔS CIRÚRGICOS E MÉDICOS SEM PACIENTES



ZERO HORA 05 de outubro de 2014 | N° 17943


NELSON MATTOS*

Na última semana, tive a oportunidade de falar sobre as transformações causadas pela revolução digital na área de saúde em uma conferência de Medicina em Gramado. Como saúde é uma área de interesse de todos, achei oportuno compartilhar alguns dos pontos da minha palestra na coluna deste mês.

Possibilitada pela popularização dos computadores, mas realmente criada pelo desenvolvimento da internet, a adoção de tecnologias baseadas na web, inteligência artificial, robótica e várias outras áreas da computação, a revolução digital está transformando a medicina.

A digitalização de registros médicos progrediu muito nos últimos anos devido ao acesso remoto e ao processamento na nuvem que a internet permite. Vários hospitais no mundo praticamente já não usam mais papel, pois quase tudo é digitalizado imediatamente: dados pessoais dos pacientes, seu histórico médico, resumo de todas as consultas e os pareceres médicos, resultado de exames, e assim por diante. Com essa digitalização e a coleta e transmissão de dados remotamente, a internet está sendo usada para telemedicina, ou seja, a prestação de serviços médicos a distância através de videoconferência. Ela é amplamente utilizada não só para prestar serviços médicos às áreas remotas da África, sem médicos, mas também para pacientes no mundo desenvolvido. Um número crescente de hospitais rurais nos Estados Unidos está usando a telemedicina para prestar cuidados especializados. Vários Estados americanos já aprovaram legislação que obriga as empresas de seguro de saúde a prestar serviços de telemedicina.

A digitalização de dados médicos e a comunicação entre aparelhos eletrônicos estão sendo combinadas com robótica para a criação de máquinas para melhorar vários procedimentos cirúrgicos. Os resultados são impressionantes, superando o dos médicos que operam sem tais aparelhos. Hoje em dia, minúsculos braços robóticos conseguem operar a parte interna do coração sem a necessidade de abrir o peito do paciente, pois são introduzidos por uma pequena incisão entre as costelas.

Membros artificiais, isto é, braços e pernas biônicas, já estão sendo implantados no corpo humano com um desempenho melhor do que as partes do corpo que estão substituindo. Para ter uma ideia de quão sofisticados esses membros artificiais podem ser, veja a palestra do senhor Hugh Herr do MIT Media Lab no YouTube. Busque por “Hugh Herr Zeitgeist” e clique no link da palestra “The World We Dream – Hugh Herr Zeitgeist Americas 2012”. Mesmo que você não consiga entender o inglês, a palestra vale a pena para se verem as pernas biônicas.

E, apesar do impacto incrível que a revolução digital já está tendo na área de medicina, eu acredito que estamos recém no comecinho de tais transformações. Nos próximos anos, vamos ver avanços extraordinários implementados cada vez mais rápido, uma vez que agora também empresas de tecnologia estão focando na área de saúde e investindo no uso de tecnologias da revolução digital para melhorar a medicina e a saúde. Google anunciou no ano passado um novo empreendimento na área de saúde – Calico, que é uma tentativa de prolongar a vida das pessoas desacelerando o envelhecimento e as doenças relacionadas ao envelhecimento. Também recentemente, Google anunciou a Smart Contact Lens: uma lente de contato com um chip que lê o nível de glicose na lágrima. Esse chip faz uma leitura por segundo e, através de uma antena embutida, transmite os dados da leitura para um smartphone, médico, ou outro computador para ser analisada. No futuro, sensores como esse serão colocados dentro do corpo humano para coletar constantemente todos os dados vitais, como pressão, temperatura, glicose… Ao longo do tempo, esses dados permitirão uma análise muito mais detalhada da saúde do corpo humano.

O implante médico de tais sensores já é comum para uso a curto prazo. Por exemplo, quando alguém tem um ataque epilético, pode ter eletrodos colocados na superfície do cérebro para detectar a origem do ataque. O sistema é atualmente utilizado apenas por poucos dias, mas, no futuro, posso imaginar um monitoramento a longo prazo. Um chip desenvolvido no início deste ano monitora os níveis de proteína e ácidos no sangue. É perfeito para situações de emergência quando o acompanhamento constante de tais níveis são de extrema importância. O próximo passo será permitir que esses dispositivos administrem doses de remédio para corrigir os problemas. Já posso imaginar a combinação de sensores dentro da corrente sanguínea, do coração e do cérebro alertando problemas de saúde, como ataques cardíacos, antes que eles aconteçam e administrando doses certas de remédios para evitar tais problemas. Um outro exemplo é o que está sendo desenvolvido em Cambridge: um sistema de pâncreas artificial que irá ligar um medidor de glicose implantado sob a pele a uma bomba de insulina, criando um sistema autônomo que monitora e corrige o nível de açúcar no sangue. Tudo sem nenhuma intervenção humana. O teste em pessoas começará ainda neste ano.

O que ainda evita o implante de tais sensores em grande escala é o fato de eles terem uma vida útil muito curta e por isso terem que ser substituídos em pouco tempo. Claro que isso não é desejável, mas é um bom começo. E eu tenho certeza de que logo vamos descobrir materiais que durarão muito mais tempo dentro do corpo humano. E, uma vez que isso aconteça, milhões de novos aplicativos para telefones celulares serão desenvolvidos para executar muitas das tarefas que os médicos e enfermeiras fazem hoje em dia. Assim, muitos médicos não vão mais lidar com os pacientes diretamente, mas passarão o tempo todo trabalhando com equipes de informatas desenvolvendo tais aplicativos. E nós, não médicos, vamos usar os aplicativos sem precisar de orientação médica. Para ilustrar isso, veja no YouTube o vídeo da Scanadu – uma empresa norte-americana que está desenvolvendo o que eles chamam de médico móvel. Busque por “scanadu” e clique no link com o título “Scanadu Trailer”. Quando isso acontecer, seremos muito mais autossuficientes!


*DOUTOR EM CIÊNCIAS DA COMPUTAÇÃO, GAÚCHO, RESIDENTE NO SILICON VALLEY, CALIFÓRNIA

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

MOBILIZAÇÃO COM MUITA FORÇA NA PERUCA



ZERO HORA 03 de outubro de 2014 | N° 17941


CIDADANIA PASSO A PASSO DA SOLIDARIEDADE



Febre nas redes sociais, campanhas para doação de fios a crianças e mulheres com câncer é a primeira etapa de um processo que envolve um trabalho de quatro dias. ZH mostra o caminho percorrido pelas madeixas até chegar às novas donas. O sonho de Eduarda Moro, 10 anos, depende da doação de cabelo de pelo menos duas pessoas e de um trabalho de quatro dias. Em recuperação após um transplante de medula, a menina aguarda para este mês uma peruca na Casa de Apoio do Instituto do Câncer Infantil (ICI), em Porto Alegre. As madeixas que cobrirão a cabeça raspada há quatro meses serão doadas pela ONG Cabelaço, que promove a confecção de perucas para crianças em tratamento com quimioterapia.

– Estou com muita saudade do meu cabelo, porque eu adorava usar tiaras, fazer tranças – relembra a garota.

Para que Duda volte a utilizar os adereços coloridos, são necessários 120 gramas de cabelos. Na perucaria, as mechas são separadas de acordo com a textura e a cor. Foi o que aconteceu com o cabelo doado por Laísa Castro, 24 anos: unido a outros fios castanhos lisos, formou a peruca que Genessi Mendes, 59 anos, recebeu na última quarta-feira. Diagnosticada com câncer de mama em julho, a dona de casa fez a primeira quimioterapia há dois meses – quando teve de raspar o cabelo, que já caía em grande quantidade.

O encontro entre as duas foi marcado por sorrisos emocionados e sentimento de gratidão.

– Ver que a dona Genessi está feliz é uma realização para mim. Um ato corriqueiro de uma pessoa pode mudar a vida de quem precisa – afirma a estudante de nutrição.

LETÍCIA RECEBEU DE VOLTA OS CACHOS

Estagiária do Instituto da Mama do Rio Grande do Sul (Imama), Laísa começou a trabalhar com a causa já com a intenção de doar cabelo. Como ainda não tinha os 15 centímetros mínimos necessários, esperou um mês para fazer o corte. Em poucas semanas, seus fios já estavam na vitrine do banco de perucas da instituição esperando por alguma mulher que quisesse cobrir a cabeça com um penteado chanel.

– Foi amor à primeira vista. Experimentei e adorei na hora – contou Genessi.

O cuidado das cerca de 200 perucas do Imama fica a cargo de Sandra Masiero, proprietária da estética Cabelo Mais. Ela financia a higienização e a manutenção dos adereços, além de transformar as mechas doadas em perucas – Sandra diz precisar de duas a três doações para fazer uma peruca. No local, lenços e chapéus também podem ser retirados por tempo indeterminado.

Supervisora de projetos do Imama, Rita de Cássia da Cunha ressalta que todo o cabelo é proveniente de doações espontâneas, não de campanhas. A cada semana são emprestadas de 10 a 15 perucas para mulheres que tratam do câncer de mama no Sistema Único de Saúde (SUS).

Há cinco meses morando na Casa de Apoio do ICI, Débora Letícia Tavares, 13 anos, teve uma surpresa há cerca de um mês. O cabelo cacheado, cortado no início do tratamento de quimioterapia, virou uma peruca e foi devolvido à menina de Vale do Sol, na região central do Estado.

– Já estava com medo de não ver mais as minhas molinhas – contou, enrolando um dos cachinhos que cobrem novamente sua cabeça.