sábado, 28 de abril de 2012

O PROTESTO DOS MÉDICOS

OPINIÃO O Estado de S.Paulo - 28/04/2012

Centenas de médicos se reuniram no último dia 25, em várias capitais do País, em praças, avenidas ou locais de grande movimento, para chamar a atenção dá população e do poder público para suas reivindicações de aumento de remuneração por parte dos planos de saúde e melhoria das condições de trabalho. As manifestações não interromperam o funcionamento de consultórios e clínicas. "Optamos por não prejudicar, de nenhuma forma, o atendimento ao usuário. Somente as lideranças médicas estão participando desses atos", disse Florisval Meinão, presidente da Associação Paulista de Medicina.

O movimento dos médicos, que pode programar um novo protesto em junho, é resultado de mais um dos contrastes que marcam o setor de saúde no País. Em vista da precariedade do SUS, que deveria proporcionar atendimento universal de saúde, os planos privados de assistência médica têm crescido a uma média de 10% ao ano desde 2000 e contam hoje com cerca de 50 milhões de usuários em todo o País.

Apesar disso, os médicos credenciados pelas empresas operadoras desses planos constituem uma das categorias mais desprotegidas do País, tanto no que diz respeito à remuneração quanto às condições de trabalho. São 15 as reivindicações dos médicos credenciados, conforme documento entregue à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) pelo Conselho Federal de Medicina, a Associação Médica Brasileira e a Federação Nacional dos Médicos. A principal é o aumento da remuneração para R$ 80 por consulta. Os médicos credenciados recebem hoje, em média, R$ 50 por consulta. Como os médicos não têm piso salarial, esse valor pode ser bastante inferior. No Rio Grande do Sul, os honorários são de R$ 37 por consulta, segundo a Associação de Medicina de Grupo daquele Estado, e, em outras regiões do País, há planos que pagam apenas R$ 12, como informa o Sindicatos dos Médicos de São Paulo (Simesp). Além disso, não há data-base para reajuste, contratos formalizados nem prazo fixo para pagamento de honorários. Em certos casos ocorrem práticas consideradas abusivas.

Segundo líderes da categoria, a instrução normativa da ANS, que prevê um reajuste anual, não é cumprida e as operadoras se recusam a negociar. No ano passado, a categoria reivindicou R$ 60 por consulta, sem êxito. Com um pagamento baixo, é menor o interesse dos médicos em trabalhar para algumas empresas, o que resulta em menos médicos credenciados e maior tempo de espera para consultas ou cirurgias.

Os médicos pedem também o fim da interferência das operadoras de planos de saúde em suas relações com os pacientes. É bastante comum o envio de planilhas aos médicos, com os valores dos procedimentos a adotar em determinados tratamentos. "Os médicos que apresentam um gasto elevado para as operadoras estão sendo descredenciados", afirma Otelo Chino, diretor do Simesp. Com as exceções de praxe, há planos que preveem reembolso de despesas por cirurgias ou tratamentos mais dispendiosos, mas, na hora de receber, o usuário verifica que grandes parcelas foram "glosadas", isto é, a operadora do plano se considera desobrigada a pagar aquela despesa. As explicações ao cliente vêm sempre envoltas em linguagem técnica, mostrando que muitas empresas têm seus especialistas em reduzir, tanto quanto for possível, os custos terapêuticos. Os clientes se sentem lesados, pois a quantia reembolsada às vezes não corresponde nem de longe ao que lhes foi prometido.

Assim, o desentendimento entre as operadoras e os médicos "respinga no consumidor", como disse Maria Inês Dulci, coordenadora da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor, que apoiou o movimento de abril. Segundo ela, houve poucos avanços em relação à manifestação semelhante realizada no ano passado, e persistem muitas dúvidas a esclarecer quanto aos convênios médicos, principalmente quanto às coberturas e aos prazos de atendimento. É geral a reclamação de falta de diálogo com as operadoras.

Essa situação exige uma atuação mais vigilante por parte da ANS.

sábado, 21 de abril de 2012

A AGONIA DA ESPERA

DIRCEU RODRIGUES, PRESIDENTE DA AMRIGS - ZERO HORA 21/04/2012

O Rio Grande do Sul precisa – e muito – de verbas para a saúde e este fato se torna muito presente quando se sabe que os hospitais estão sempre lotados. E não somente com portadores de outras doenças, mas com os politraumatizados pelo trânsito. Hoje, 21 de abril, é o Dia Nacional da Paz no Trânsito. Infelizmente, não é uma data a ser comemorada. É uma data de tristeza e de conscientização. São pessoas que morrem todos os dias, vitimadas pelas imprudências no trânsito. Outras tantas permanecem nas emergências dos hospitais – que não têm recursos suficientes para atender às demandas –, aguardando uma vaga.

A Associação Médica do Rio Grande do Sul, no ano passado, participou ativamente de ações para um trânsito mais seguro. Trouxemos para Porto Alegre um totem, que contabiliza as mortes ocorridas no trânsito. Também realizamos, juntamente com a Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, uma Caminhada pela Paz, para conscientizar os motoristas dos perigos do trânsito.

Infelizmente, ainda impactantes pela incontroversa presença entre nós, os dados do Detran apontam que, até fevereiro, 297 pessoas morreram no Rio Grande do Sul vítimas de acidentes de trânsito. Ao todo, foram 259 acidentes, que envolveram 426 veículos. Mais uma vez, lamentavelmente, estes números mostram que muitas pessoas ainda não tiveram a devida consciência dos perigos que podem enfrentar quando são pedestres desatentos ou quando entram em um veículo que está sendo dirigido por quem usou bebida alcoólica.

Como entidade médica, a Amrigs se preocupa com essas questões, que estão intimamente relacionadas à saúde das pessoas. Vamos nos mobilizar para conseguir 1 milhão de assinaturas do povo gaúcho. Este manifesto buscará através do movimento Saúde Rio Grande – Um Milhão De Razões Para Cumprir A Lei, a adoção de uma posição que torne pública uma posição sobre a destinação dos recursos para a saúde. Isso através do imediato cumprimento do que foi determinado pela Constituição, pela aplicação do percentual de 12% da receita líquida de impostos na área de saúde, visto ser uma indispensável e inadiável necessidade da população.

É necessário destacar que em 2011, conforme dados do Balanço do Estado do Rio Grande do Sul e do Tribunal de Contas do Estado, o governo estadual deixou de aplicar R$ 1.107.164.056,93 (um bilhão, cento e sete milhões, cento e sessenta e quatro mil e cinquenta e seis reais e noventa e três centavos). Este valor é a metade do que deveria destinar para o cuidado com a saúde dos gaúchos!

sexta-feira, 20 de abril de 2012

SOU MÉDICO, MEU TRABALHO TEM VALOR

Florentino Cardoso - Presidente da Associação Médica Brasileira, JORNAL DO COMÉRCIO, 20/04/2012

O título deste artigo foi slogan de uma campanha das entidades médicas nacionais em 2004, pela valorização do trabalho médico e da medicina. Passados quase oito anos, a situação pouco mudou, a despeito da luta incessante de instituições como a Associação Médica Brasileira (AMB). É certo que conquistas foram obtidas, como no recente movimento na saúde suplementar. Em vários estados do Brasil, operadoras de saúde promoveram reajustes em consultas durante 2011. No entanto, ainda não chegaram aos patamares mínimos reivindicados pelos médicos nem resolveram a dramática defasagem dos demais procedimentos. A exploração do trabalho médico impacta diretamente a qualidade da medicina, assim como a assistência aos cidadãos. Para quitar suas contas e garantir a sobrevivência, médicos são obrigados a acumular diversos empregos, cumprindo jornadas de 60, 70 ou mais horas semanais. Indivíduo algum, seja de que área for, consegue manter a excelência do seu trabalho com tamanha sobrecarga.

Paralelamente, o Sistema Único de Saúde (SUS) sofre com recursos insuficientes, impedindo a prática da boa medicina. A triste consequência surge com significativa parcela de profissionais qualificados afastando-se cada vez mais da rede pública. Isso sem falar nos salários irrisórios; na tabela do SUS que (só a título de exemplo) remunera uma consulta básica de clínico geral, ginecologista e pediatra em menos de R$ 3,00; na falta de um plano de cargos e vencimentos, de uma carreira de estado, na violência nas periferias, entre tantos outros complicadores. Tem sido conhecida por todos as péssimas condições de trabalho e de assistência no SUS, ocasionando frustração e desmotivação. Quanto mais carente a região e mais necessitada a população pior é o quadro, bem evidenciado nas longas filas de espera por consultas, exames e cirurgias. Mortes evitáveis ocorrem, especialmente nas grandes emergências. Como presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), registro publicamente para que fique bem claro: reagiremos à altura em nome da boa prática médica e da adequada assistência ao povo brasileiro. Jamais defenderemos castas, pois queremos uma mesma medicina para todos. Sou médico e tenho compromisso com a vida, com a medicina e com a saúde da população.

MULHER ACIDENTADA MORRE POR FALTA DE ATENDIMENTO MÉDICO


Mulher atropelada em Alvorada morre por falta de atendimento médico. Erta tinha ferimentos graves e morreu quarta-feira no Hospital de Alvorada. Médico tentou transferi-la, mas não conseguiu. Eduardo Rodrigues - DIÁRIO GAÚCHO, 20/04/2012

A falta de leitos na rede hospitalar da Capital pode ter sido a causa de mais uma morte na fila do Sus. No começo da noite de quarta-feira, a diarista Erta Marisa Strevenski, 50 anos, foi internada com fratura exposta no joelho direito, esmagamento de um dos rins e traumatismo craniano no Hospital de Alvorada. Como o caso era complexo, os médicos tentaram transferi-la para hospitais da Capital, mas não havia vagas. Enquanto os familiares lutavam para encontrar um leito, a paciente morreu.
No domingo, Gleci da Silva Geraldo, 58 anos, morreu no Hospital Conceição durante a espera por atendimento, tendo passado parte do tempo deitada no chão ou sentada em cadeiras na Emergência.

- Vítima de um acidente inusitado

Ao contrário de Gleci, que sofria de câncer, Erta foi vítima de um acidente inusitado. Minutos depois de sair de um minimercado, na Rua Primavera, no bairro de mesmo nome, em Alvorada, a diarista foi atingida por um Palio desgovernado e sem motorista. Segundo a filha da vítima, Aline Strevenski, 29 anos, o condutor teria estacionado o carro em uma lomba, sem puxar o freio de mão.

- Há dois meses, ela recebeu a notícia da cura de um câncer no pâncreas, após seis anos de tratamento no Hospital de Clínicas, e agora acontece isso-lamentou Aline.
Socorrida e ainda consciente, Erta foi levada para o hospital, mas o quadro se agravou.

Recurso à Justiça

O médico Fábio Germany ligou para o Samu estadual fazer a transferência para o HPS ou para o Hospital Cristo Redentor, referências no atendimento de traumatologia na Capital, mas nenhum deles tinha leitos. Outros hospitais teriam sido contatados, também sem sucesso. O médico, então, recomendou que ingressassem na Justiça. Não houve tempo.

O sepultamento foi ontem no Cemitério Municipal São José Operário. A família registrou ocorrência na 1ª DP e pretende ingressar na Justiça contra o dono do veículo e contra os hospitais.

O que dizem os hospitais

- Samu Estadual - Afirma que fez contato com o HPS e o Cristo Redentor, mas não havia leitos;

- HPS - Disse que a regulação deveria ser feita pelo Samu Estadual, mas não confirmaram se haviam sido contatados;

- Cristo Redentor - Não retornou a ligação da reportagem;

- HPS de Canoas - Afirma que não recebeu nenhuma ligação da família e não é referência para pacientes de Alvorada;

- Hospital de Viamão - Não retornou a ligação da reportagem;

- São Lucas da Puc - Não retornou a ligação da reportagem;

- Mãe de Deus - Recebeu uma ligação, confirmou a existência de leito, mas disse que o familiar queria falar com o médico, o que não é permitido;

Passo a passo de uma drama

17h de quarta-feira - Erta sai de casa e compra açúcar num minimercado, e mamão e cigarros em outro. Percorre um trajeto de cerca de 500m.

17h20min - Após sair do segundo estabelecimento, ela é atingida pelas costas por um Fiat Palio vermelho desgovernado, na Rua Primavera, no bairro de mesmo nome em Alvorada. O veículo passa por cima da vitima e prossegue cerca de 600m até ser parado por moradores. Segundo parentes da vítima, o motorista havia saído do carro sem puxar o freio de mão. Ainda consciente, Erta é socorrida pelo Samu, com fratura exposta do joelho direito e um corte no lado direito da cabeça.

18h03min - A paciente ingressa no Hospital de Alvorada. Além da fratura no joelho, os médicos confirmam o traumatismo craniano e esmagamento de um dos rins. Diante da gravidade do caso, é necessária a transferência para a Capital, e o médico faz o pedido para o Samu Estadual, que diz ter entrado em contato com o Cristo e o HPS, sem resultado.

18h35min, 19h e 19h50min - Preocupado, o cirurgião-geral Fábio Germany liga três vezes para o Hospital Cristo Redentor na tentativa de conseguir leito, mas não há vagas disponíveis. Também são feitas ligações para o HPS da Capital, o HPS de Canoas e o Hospital de Viamão.

20h - O médico então comunica, por escrito, à família que a paciente corre risco de morte e que precisa fazer uma cirurgia de urgência. Recomenda que ingressem na Justiça para garantir leito.

21h - Enquanto o advogado prepara petição (pedido), os filhos de Erta ligam para os hospitais São Lucas da Puc e Mãe de Deus, na Capital. Os hospitais teriam o leito, mas não neurocirurgiões disponíveis para fazer o procedimento.

21h45min - Erta tem a primeira parada cardiorrespiratória e é reanimada.

22h10min - A paciente tem a segunda parada, mas não resiste.

22h25min - Confirmada a morte.

terça-feira, 17 de abril de 2012

A SAÚDE DEGRADADA


EDITORIAL ZERO HORA 17/04/2012

A dramática situação enfrentada por pacientes do setor privado de saúde, que vem revelando dificuldades semelhantes à da rede do SUS, exige providências imediatas para evitar o agravamento dos problemas nessa área. No caso do atendimento a clientes de planos particulares, as distorções, apontadas por reportagens de Zero Hora, precisam de medidas imediatas e eficazes, capazes de adequar a rede de atendimento à demanda por serviços. É um risco deixar que a situação se deteriore mais ainda, com a superlotação de hospitais, incluindo as emergências, além de esperas dramáticas por vagas e para uma consulta com especialista ou exames mais sofisticados.

As explicações para o quadro deplorável enfrentado hoje são óbvias e, por isso, deveriam ter exigido medidas preventivas. Diante das adversidades enfrentadas por quem depende de atendimento pelo SUS e do aumento da renda média dos brasileiros, cada vez mais pessoas estão recorrendo aos planos privados. O resultado é que, em apenas uma década, o número de usuários praticamente dobrou no Estado, num ritmo que não foi acompanhado pela rede particular de assistência.

Apenas nos últimos cinco anos, o número de clientes de operadoras de saúde no Rio Grande do Sul cresceu 35%, enquanto a ampliação do número de vagas desvinculadas do SUS limitou-se a 7,5%. Esse descompasso gritante se reflete na prática em emergências e consultórios lotados. Como, na área de saúde, os setores público e privado são interligados, a sobrecarga não afeta apenas um lado, prejudicando a ambos.

Desde a universalização do atendimento, com a instituição do SUS, o setor privado tem funcionado como um alívio para o sistema e como uma comodidade para quem pode pagar. A instabilidade registrada hoje também na área particular faz soar um alarme que não pode ser ignorado por quem tem a responsabilidade de garantir um mínimo de atenção a enfermos em busca de atendimento.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

OBESIDADE: UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA

Um problema de saúde pública - por Roberto Fernandes da Costa, Doutor em Ciências Aplicadas à Pediatria – Unifesp, e pós-doutorando em Ciências do Movimento Humano – UFRGS - ZERO HORA 13/04/2012

Não faz muito tempo, doenças como hipertensão, diabetes tipo 2 e dislipidemias eram tidas como males quase exclusivos de adultos. Entretanto, este quadro vem mudando, sobretudo pela associação dessas doenças com a obesidade, que acomete cada vez mais crianças e adolescentes.

O sedentarismo e a alimentação inadequada estão entre os principais fatores causais da obesidade na infância e adolescência em todo o mundo. Nos últimos 30 anos, a proporção de crianças obesas em nosso país quadriplicou, segundo dados do IBGE.

Ainda causa espanto a ocorrência de infarto ou acidente vascular encefálico antes dos 40 anos de idade. Principalmente quando as pessoas são “aparentemente saudáveis”. Mas é importante destacar que esses acontecimentos denotam apenas o desfecho de um problema que começou muitos anos antes, provavelmente na infância.

O consumo exagerado de sal, açúcar e calorias, contidos nos alimentos industrializados e nos fast foods, tão atraentes às populações pediátricas, associado ao sedentarismo imposto pela utilização desenfreada de jogos eletrônicos, televisão e internet, contribui para a epidemia de obesidade e suas consequências danosas à saúde.

Entre elas, está a síndrome metabólica, caracterizada pela soma de pelo menos três fatores de risco para doença arterial coronariana, dentre os quais obesidade abdominal, hipertensão arterial, elevados níveis de glicemia e triglicerídeos sanguíneos, baixos níveis de HDL-Colesterol. Estudo recente realizado em escolas municipais de Porto Alegre mostrou que 39,7% dos adolescentes obesos, de 10 a 14 anos de idade, já apresentavam a síndrome.

A situação é preocupante e demonstra a necessidade de medidas urgentes, pois esses adolescentes são candidatos aos agravos relacionados à síndrome. Além disso, mesmo aqueles que apresentam somente um ou dois fatores de risco, se não receberem a devida atenção, poderão aumentar o número de fatores em um futuro não muito distante.

Considerando-se que 95% dos casos de obesidade estão relacionados com o estilo de vida, o primeiro passo é a prevenção. A prática de exercícios físicos e hábitos alimentares saudáveis deve começar na infância.

Entretanto, embora os pais tenham responsabilidade na prevenção da obesidade e das doenças crônicas, o poder público também deve agir, afinal, trata-se de um problema de saúde pública. Campanhas educativas para estimular a alimentação saudável e a prática de exercícios físicos, atuação conjunta de secretarias de Saúde e Educação, monitoramento do estado nutricional dos escolares, regulamentação da propaganda de alimentos dirigida ao público infantil, por exemplo, já constituiriam um bom começo.

Investir na prevenção desses males em idades precoces significa economizar em tratamentos na fase adulta, além de possibilitar um envelhecer mais saudável.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

DESCAMINHOS NA SAÚDE

José Serra, ex-governador, ex-prefeito de São Paulo, foi ministro da Saúde - O ESTADO DE SÃO PAULO, 12/04/2012

Os escândalos nos hospitais federais no Rio de Janeiro fazem parte da rotina entranhada na política brasileira de hoje. Paralelamente, ilustram a falta de rumo na saúde do País.

Todas as grandes inovações que deram certo nesse setor vêm dos anos 1990. Começaram no governo Itamar Franco, com a incorporação do antigo Inamps ao Ministério da Saúde (MS), abrindo caminho para a universalização e integração do atendimento entre as três esferas de governo, dentro de um sistema único. No governo FHC sucederam-se as conquistas: o Piso de Atenção Básica, pago de forma regular e automática aos municípios pelo MS, e a implantação do Programa de Saúde da Família (PSF), que atingiu 16 milhões de famílias. As despesas com atenção básica saltaram de 17% para cerca de 25%.

Nesse período se deu a batalha dos medicamentos: o combate às falsificações, a introdução dos genéricos, a redução de tributos dos remédios de uso continuado e dos antibióticos, o enfrentamento das restrições excessivas das patentes, a generalização e ampliação da distribuição gratuita de medicamentos básicos e de maior complexidade. Pela primeira vez o item "custos" passou a ser uma preocupação obsessiva do ministério a fim de extrair mais de cada real gasto. E pela primeira vez investimos em recursos humanos, formando mais de 200 mil auxiliares e técnicos de enfermagem em cursos modelares espalhados pelo Brasil.

Foi a época também do salto definitivo na produção e cobertura de vacinas, bem como da implantação dos mutirões de prevenção e de cirurgias eletivas. Ou da campanha contra a aids, a melhor e mais bem-sucedida de todo o mundo em desenvolvimento. Com o novo Sistema Nacional de Transplantes, o Brasil tornou-se o segundo maior do planeta nessa área. As leis antitabagistas, ponto alto da prevenção de doenças, deram certo e nosso país se tornou vanguarda nessa batalha.

No plano institucional, houve a gestão plena nos municípios maiores, a lei que regulamentou os planos de saúde, a criação da Agência Nacional de Saúde (ANS) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) nos moldes do FDA norte-americano - ambas com diretorias aprovadas pelo Senado, sem indicações político-partidárias. Por fim, houve a recuperação da estrutura e da dignidade da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), voltada para o combate às endemias. Nela foi criada a exigência de qualificação formal mínima para cargos de direção. Conseguiu-se ainda aprovar a PEC 29, que fixou pisos mínimos para os gastos em saúde nas três esferas de governo e delegou à lei complementar o poder de regulamentar, mudar e aperfeiçoar os mecanismos de financiamento.

Enfim, essa foi a era das inovações nacionais na saúde em nosso país. A partir de então seu estoque estagnou. Algumas foram mantidas por inércia, como o PSF, os sistemas de vacinação e de transplantes e, mal e mal, o combate à aids. Outras sofreram retrocesso ou foram pervertidas por loteamento político e corrupção, como no caso da Funasa. Diga-se que a medida que exigia certificação para os altos cargos dessa agência foi revogada logo no início do governo Lula, em 2003.

O loteamento passou a dominar o setor da saúde, especialmente cruel no caso da ANS e da Anvisa. É fácil entender, nesse contexto, por que os prazos de aprovação de um medicamento genérico triplicaram. São agências poderosas e o preço para vender facilidades depois de criar dificuldades pode ser imenso. Preocupações práticas com custos e formação de recursos humanos foram para o beleléu. Os mutirões foram extintos por terem, supostamente, marca tucana. Cessou a ofensiva pela massificação dos medicamentos genéricos. Tirou-se a Anvisa do sistema de registro de patentes, enfraquecendo o poder de negociação do MS quanto aos preços de novos medicamentos. Até hoje a ANS não consegue cobrar o ressarcimento dos planos de saúde por clientes atendidos no SUS.

Consagrou-se, também, a gestão publicitária da saúde, descarregando em cima de Estados ou municípios as despesas, mas faturando a iniciativa. Exemplos? As UPAs e o Samu. Das primeiras (cópia das AMAs de São Paulo), o MS financia a construção, mas o custeio, muito maior, é bancado... pelos municípios. Com o Samu o esquema se repete: o governo federal envia os veículos, mas quem paga a operação, infinitamente mais cara? Os municípios! Resultado? Ambulâncias cada vez mais encostadas.

A PEC 29 ficou valendo, mas a lei complementar que deveria regulamentá-la, prevista para 2004, só foi aprovada em 2011, depois de anos de obstrução pelo governo do PT, que impediu um equilíbrio maior na distribuição das despesas. No final dos anos 1990 a União comparecia com 55% das despesas da saúde. Em 2010, com 45%!

O escândalo nos hospitais federais no Rio pode ser compreendido a partir desse ambiente. Em 1998 trocamos todas as diretorias desses hospitais, que são numerosos, pois vêm do Rio capital federal. Além de cortar custos, iniciamos a descentralização, transferindo quatro das unidades para o município do Rio, em contratos que previam o repasse dos recursos necessários. Mas o PT sempre combateu essa medida e seu governo não se empenhou nas negociações, necessárias diante das dificuldades naturais do processo. O resultado foi uma intervenção desastrada na saúde da cidade em 2005, com motivação corporativa e eleitoral, e a volta dos hospitais à órbita federal, na contramão do que preconiza o SUS, jogando-os na rota da deterioração e da roubalheira.

Note-se que o loteamento no Brasil tem uma peculiaridade: o MS cochicha que estava resistindo às nomeações políticas, mas exclui delas o partido do governo, o PT, o que mais loteia. E foi precisamente um petista histórico e desqualificado para as funções que embolsou, confessadamente, pelo menos R$ 200 mil.

Os descaminhos da saúde no Brasil não estão aí por acaso. São fruto do descaso e da incompetência metódica, continuada e convicta.

JUDICIÁRIO VIROU UMA FORMA DE ACESSO AO SUS

Jessica Gustafson, especial - JORNAL DO COMERCIO, 11/04/2012

A Constituição de 1988 estabelece que a saúde é um direito do cidadão e, portanto, é dever do Estado fornecê-la. Não é de hoje que se sabe que o acesso ao sistema não é tão simples e que, muitas vezes, acaba caindo nas mãos da Justiça. O Judiciário atua, então, como a última instância para se conseguir medicamento, leito ou tratamento, através do Sistema Único de Saúde (SUS). Para discutir o acesso aos serviços públicos de saúde e a judicialização do setor, a Câmara Temática de Proteção Social do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES-RS), o Conselhão, realizou uma reunião ontem com a presença dos gestores da área.

Eugênio Terra, juiz estadual do Tribunal de Justiça (TJ), afirmou que o trabalho recebido pelo Judiciário é a ponta do problema, pois a judicialização virou uma forma de acesso à saúde. “Os gargalos no setor existem e são muito grandes. A Constituição prevê que o SUS atenda a todos, que seja integral a todas as necessidades. Hoje ele não e acessível a toda a população”, criticou. De acordo com o juiz, mesmo com a implantação da informatização no sistema de consultas, o problema não foi resolvido.

Assim, se um paciente chega até uma consulta e o médico não comparece por algum motivo, o usuário volta para o final da fila de marcação. “Por isso existem pessoas há quatro anos esperando por uma cirurgia. Isso não é razoável. O Judiciário então intervém para garantir o direito à saúde. Nós não podemos negar esse acesso”, ressaltou. Terra disse ainda que as decisões são sempre baseadas em pareceres médicos e que a intervenção só acontece quando existe necessidade. Segundo ele, esta situação tem que conscientizar o Executivo sobre a importância da ampliação do sistema de saúde.

O secretário estadual de Saúde, Ciro Simoni, informou que existe a meta de construir mais serviços de saúde regionais, para que os locais de atendimento estejam mais próximos das pessoas. “Também estamos trabalhando na ampliação das Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs). Hoje, muitas delas são financiadas apenas com recursos estaduais. Estamos esperando o investimento por parte do Ministério da Saúde”, explicou.
De acordo com Simoni, o sistema de saúde, da mesma forma que acesso e qualidade, é uma das maiores preocupações do governo.

Sobre o âmbito municipal, Marcelo Bósio, secretário da Saúde de Porto Alegre, relatou os últimos investimentos na área. O cadastro único dos cidadãos, a informatização das marcações de consultas, a implantação do Cartão SUS, que integra todos os pacientes, e a colocação de banda larga em 145 dos 187 locais de atendimento existentes na Capital foram algumas das ações realizadas para agilizar o sistema. Bósio também admitiu que existe um déficit muito grande na especialidade de ortopedia, mas que as áreas de hepatite e cardiologia foram melhoradas. “Democratizar o acesso é o maior desafio. Precisamos diminuir a distância entre os cidadãos e o serviço e melhorar a articulação dos gestores, trabalhadores e usuários do sistema de saúde”, concluiu.

Ministério Público Federal discute discriminação sofrida por parte de usuários do sistema único

O ingresso de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) em recepções diferentes daquelas destinadas aos pacientes particulares e de convênios nos hospitais que atendem tanto particulares quanto SUS foi pauta de reunião realizada no Ministério Público Federal (MPF) no Rio Grande do Sul na segunda-feira.

A matéria já havia sido objeto de recomendação ao Ministério da Saúde (MS) no sentido de que fosse proibida a adoção de recepções diferenciadas, uma destinada aos pacientes particulares ou àqueles que possuem plano de saúde privado e outra aos usuários do SUS. Os representantes do MS comprometeram-se a encaminhar uma resposta do órgão ao MPF.

Conforme as procuradoras da República Suzete Bragagnolo e Ana Paula Carvalho de Medeiros, é inadmissível a existência de qualquer tipo de discriminação. Um inquérito civil sobre o tema foi instaurado a partir de representação do ex-secretário de Saúde de Porto Alegre Lúcio Barcelos e tramita no Núcleo da Saúde e Previdência Social da Procuradoria da República no Rio Grande do Sul.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

SAÚDE É PRIORIDADE PRINCIPAL PARA A COPA


PESQUISA NA CAPITAL. Além de tratar dos preparativos para o Mundial, porto-alegrenses avaliam os problemas da cidade e os governos Tarso e Dilma - ZERO HORA 09/04/2012

Segurança pública, atendimento hospitalar e transporte terrestre são as três áreas que, na opinião dos porto-alegrenses, devem estar entre as prioridades da prefeitura nos preparativos para a Copa do Mundo de 2014. O cenário faz parte de pesquisa Ibope encomendada pelo Grupo RBS.

A atenção da população aos temas da segurança e da saúde também aparece no cotidiano das pessoas. Questionados sobre as áreas nas quais a população da Capital mais enfrenta problemas, os entrevistados indicam saúde (76%), a educação (49%) e a segurança pública (40%) – somadas as três primeiras opções dos eleitores.

A preocupação com a saúde obtém maiores índices entre os eleitores com renda familiar de até dois salários mínimos (82%) e com escolaridade de 5ª a 8ª série do Ensino Fundamental (89%). Já a educação preocupa mais jovens de 16 a 24 anos (56%) e os entrevistados com renda familiar maior que cinco salários mínimos.

Para melhorar o trânsito e facilitar a mobilidade urbana, 31% dos entrevistados apontaram como solução direcionar investimentos ao transporte coletivo. Para outros 22%, a mobilidade melhoraria com a duplicação e o prolongamento de avenidas. O incentivo ao transporte coletivo é maior entre os eleitores com até a 4ª série do Ensino Fundamental (36%) e entre aqueles com com renda familiar inferior a dois salários mínimos (36%).

O Ibope também verificou a opinião dos porto-alegrenses sobre às gestões do governador Tarso Genro e da presidente Dilma Rousseff. Para 67%, a administração de Dilma é ótima ou boa. O governo Tarso obtém 51% no mesmo quesito. Somados, os entrevistados que consideram a gestão do prefeito José Fortunati ótima e boa representam 55% – de acordo com dados publicados na edição de domingo.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

SAÚDE LEGAL!

Mário henrique Osanai, Médico - zero hora 05/04/2012

A sociedade brasileira clama por cuidados intensivos para a saúde. A mobilização para a aplicação de mais recursos, conforme determina a Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012, é uma providência necessária.

Mas é preciso muito mais do que isso!

O quadro está exposto, com dramáticas cenas que evidenciam a má gestão do dinheiro da população. Dinheiro da saúde, quando aplicado de forma incompetente, representa morte e sofrimento. Quando não aplicado, significa massacre implacável. Não são números e estimativas, apenas. São as vidas de um povo!

Ações urgentes e emergenciais são necessárias para o saneamento deste caos. Muito pode ser feito, como fiscalização rigorosa, apuração de responsabilidades e punições exemplares. Isso representaria as fases de diagnóstico, planejamento e tratamento radical. Medidas paliativas já não bastam, e não é momento para desperdiçar a chance de cura. É inequívoca a necessidade de mais recursos para a saúde. Desde que sejam acompanhados por resultados, sem distorções e com qualidade perceptível. Se o recurso é escasso, que seja aplicado de forma inteligente, competente e eficaz. Quem desperdiça o que não tem?

Não é aceitável que se terceirize a saúde para empresas clandestinas, com funcionários fantasmas e comprovado desrespeito ao ser humano. Morrer por atendimento inadequado nunca será uma opção razoável. Não há justificativa para a falta de assistência, mesmo admitindo a limitação de recursos. Como esperar qualidade, se não existem condições mínimas para profissionais e pacientes? É preciso coragem, inteligência, lisura e determinação para mudar. Sem isso, o resultado já é conhecido e vivido, todos os dias.

A corrupção na saúde é algo abominável e ainda mais hedionda por não permitir defesa às suas vítimas. A incompetência segue na mesma linha, junto com a impunidade. Com raras opções decentes, em um deserto de respeito, a população continua vulnerável aos discursos vazios e às migalhas da hipocrisia. Cada centavo aplicado na saúde deve ser demonstrado à população e fiscalizado pelas autoridades competentes em benefício de toda a sociedade. Qualquer uso indevido deverá ser punido, conforme as responsabilidades apuradas. Cumpra-se a lei! E que sejam atendidas as exigências de três pilares (recursos financeiros, competência e responsabilidade), para que a saúde brasileira possa ser, finalmente, “tri legal”!