terça-feira, 26 de março de 2013

REFÉM DO SUS

26 de março de 2013 | N° 17383

DEFICIÊNCIA NO SUS

Justiça determina cirurgia de jovem. Vendedor espera há 82 dias por operação no joelho direito em Lajeado



A espera de Alex Gabriel Labres, 23 anos, que aguarda há 82 dias por uma cirurgia pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em Lajeado, no Vale do Taquari, pode estar chegando ao fim. Ontem, a Justiça concedeu antecipação de tutela para que Estado e município realizem a operação em 24 horas, a partir da intimação.

Se isso não ocorrer, a intervenção deve ser feita na rede particular, e o valor a ser pago – quase R$ 20 mil –, será bloqueado dos cofres públicos.

– Com a decisão judicial, a família não terá que custear o procedimento. E, mesmo não obtendo o encaminhamento da cirurgia pelo Estado ou pelo município no prazo indicado, esperamos que o procedimento seja feito até quarta-feira – revela Débora Fernandes, advogada de Labres.

Devido a um acidente de moto ocorrido em 3 de janeiro, o jovem perdeu parte do osso do joelho direito. Desde então, o vendedor de autopeças está internado no Hospital Bruno Born, à espera de uma cirurgia de reconstrução e alargamento dos ossos. O problema é que o hospital não tem a estrutura necessária para a intervenção cirúrgica.

Nestes casos, a conduta padrão seria transferi-lo para outro hospital. Mas, diante da burocracia para obter leitos via SUS e da falta de especialistas, o caso se arrasta há quase três meses. Enquanto isso, devido à demora, a lesão já provocou infecção mais de uma vez. O diretor médico do hospital, Sérgio de Macedo Marques, afirma que o tempo pode agravar a situação e até provocar consequências mais graves, como trombose e dificuldade na cicatrização.

Na última sexta-feira, o titular da 16ª Coordenadoria de Saúde de Lajeado, José Harry Saraiva Dias, informou que o Estado estava tomando providências para internar Labres em um hospital de Porto Alegre, com referência em traumatologia. Na ocasião, admitiu que houve uma falha na comunicação entre o hospital e a Secretaria Estadual de Saúde (SES).

Ontem, por meio da assessoria de imprensa, a SES informou que ainda não havia sido intimada da decisão. Apesar disso, revelou que negociava a possibilidade de transferência do paciente para o Hospital São Vicente de Paulo, em Passo Fundo, onde haveria condições para realizar a cirurgia. Até o início da noite, porém, Labres permanecia internado em Lajeado.


ENTREVISTA - “Não aguento mais esperar”

Alex Gabriel Labres - Vendedor



Há quase três meses à espera de uma cirurgia, Alex Gabriel Labres, 23 anos, diz já ter perdido as esperanças de ser atendido pelo SUS.

Zero Hora – Quais são as dificuldades do senhor neste momento?

Alex Gabriel Labres – As dificuldades são muitas, mas o pior de tudo é estar longe da minha família e da minha namorada. Para me encontrar, eles têm de vir para o hospital, mas se sentem mal de me ver assim. Acabam vindo menos.

ZH – Quais são as consequências dessa demora?

Labres – Estou sofrendo há mais de 80 dias. É uma humilhação. Tenho medo de, se não fizerem nada logo, perder a perna.

ZH – Como é o teu dia a dia no hospital?

Labres – Eu durmo dia e noite para não ver o tempo passar. Minha esperança está na rede particular. Não aguento mais esperar pelo SUS. Se até hoje não tivemos nenhum resultado positivo, não consigo pensar que agora vai vir.



quarta-feira, 20 de março de 2013

CUSTO DA OBESIDADE


ZERO HORA 20 de março de 2013 | N° 17377

REDE PÚBLICA. Custo com obesidade é de R$ 488 milhões

Valor também é referente a 26 doenças relacionadas ao excesso de peso


O custo com internações e tratamentos relacionados à obesidade na rede pública apenas no ano de 2011 pode ter chegado próximo de R$ 490 milhões – mais do que o dobro do investimento previsto pelo governo do Estado em saúde neste ano. Um quarto desse valor está relacionado à obesidade grave.

É o que estima um estudo conduzido pela Universidade de Brasília (UnB) e divulgado ontem pelo Ministério da Saúde. A estimativa leva em conta tanto o atendimento de problemas diretamente relacionados à obesidade quanto cuidados com 26 doenças relacionadas ao excesso de peso – por exemplo, diabetes, hipertensão arterial e diversos tipos de câncer.

Do custo total de R$ 488 milhões estimado para 2011, R$ 166 milhões estão ligados a doenças isquêmicas do coração, R$ 30 milhões ao câncer de mama e R$ 27 milhões ao diabetes.

Por terem maior participação na população brasileira com obesidade grave (1,14% das mulheres contra 0,44% dos homens), as mulheres tiveram maior participação neste custo – cerca de R$ 328 milhões.

O ministério estima que cerca de 15% dos brasileiros sejam obesos. Como comparação, esse percentual chega a 20,5% na Argentina, 25,1% no Chile e 27,6% nos Estados Unidos.

No Rio Grande do Sul, a situação também é preocupante. De acordo com a pesquisa Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), de 2011, Porto Alegre ocupa a segunda posição no ranking de capitais com maior índice da população acima do peso (19,6% dos habitantes está obeso ou com excesso de peso), ficando atrás apenas de Macapá (AP).

Para especialistas, o fato de os gaúchos estarem no topo dessa lista tem origem em diversos fatores. O tipo de alimentação herdada dos colonizadores alemães e italianos (que prioriza comidas gordurosas), os maus-hábitos alimentares, condições climáticas, o sedentarismo e até a predisposição genética são exemplos.

– Verificamos que vários pacientes que atendemos têm consumo de energia abaixo do normal. Mas o problema mesmo é alimentação incorreta – afirma o diretor do Centro da Obesidade e Síndrome Metabólica do Hospital São Lucas da PUC, Cláudio Cora Mottin.

Com o aumento de pessoas com peso excessivo, cresce também a procura pela cirurgia bariátrica. Conforme a Secretaria Estadual da Saúde, no ano passado foram realizados 240 procedimentos – 45 a mais do que em 2010. No momento, existem 2,4 mil pessoas aguardando esse tipo de operação. A estimativa é de que tenham sido gastos R$ 32 milhões com cirurgias desse tipo no Brasil em 2011.

– A cirurgia bariátrica seria uma solução, mas a primeira opção é o tratamento clínico – revela o coordenador do Centro de Tratamento da Obesidade do Hospital Santa Casa, Luiz Alberto De Carli.

Esta é a primeira vez que o levantamento nacional é feito. Isso impede avaliar o crescimento dos gastos com obesidade e doenças relacionadas com períodos anteriores.

Comercialização de bebidas açucaradas deve ser debatida

O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, anunciou ontem um pacote de medidas para prevenção e oferta de tratamento aos pacientes. Entre elas, aumento de verba para cirurgias, inclusão de novas técnicas para operação e alteração da idade mínima e máxima para cirurgia bariátrica. A partir de agora, não há mais idade máxima para indicação da cirurgia e a idade mínima foi reduzida de 18 para 16, quando há risco para o paciente. As mudanças já haviam sido anunciadas em 2012. Para o ministro, medidas como a proibição da venda de bebidas açucaradas em embalagens grandes, defendida pelo prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, devem ser debatidas.

– Eles têm índice de obesidade maior – afirmou.

Algo que, avalia, poderia justificar medidas mais restritivas.

*Com agências de notícias

HOMERO PIVOTTO* | ESPECIAL

domingo, 17 de março de 2013

O COMBATE AO HPV

O Estado de S.Paulo, 17 de março de 2013 | 2h 10


OPINIÃO


Demorou, mas finalmente o combate ao papiloma vírus humano (HPV) entrou na ordem do dia e está sendo estudada a adoção de medidas concretas nesse sentido pelo poder público. Como existe vacina contra essa doença, que causa a morte de milhares de homens e mulheres por ano, essas são providências que já deveriam ter sido tomadas. Há estudos que comprovam que de 50% a 80% das mulheres sexualmente ativas - e homens, numa porcentagem menor - são infectadas por um ou mais dos vários tipos de HPV. A maioria das infecções é combatida espontaneamente pelo organismo, mas uma parte razoável se transforma em tumor canceroso.

O que se espera agora é que o governo federal acelere as providências necessárias para a distribuição gratuita da vacina em todo o País. Se isso já tivesse sido feito, não se estaria agora às voltas com a suspeita de irregularidades na compra, pelo governo do Distrito Federal, de vacinas a preço três vezes superior ao do oferecido pela Organização Pan-Americana de Saúde, como mostrou reportagem do Estado. Certamente cansado de esperar pela ação do Ministério da Saúde - a exemplo do que estão tentando fazer também o Amazonas e o Rio de Janeiro -, ele resolveu se adiantar a ela.

"O HPV pode levar ao câncer de colo do útero. Uma morte inaceitável. Por isso, decidimos agir", afirma a gerente da Secretaria da Saúde do Distrito Federal que cuida do setor de oncologia, Cristina Scandiuzzi. Segundo ela, esse tipo de câncer é a quinta causa de morte de mulheres ali, com mais de 80 casos por ano.

Com a devida autorização dos pais, a secretaria espera fazer a vacinação de todas as adolescentes - tanto nas escolas públicas como privadas - entre 1.º e 25 de abril. Muitas vidas serão salvas, o que é o mais importante, mas mesmo assim é lamentável que esse resultado seja atingido a um preço tão alto. Cada dose da vacina - são necessárias três - custará R$ 75,50. Se fosse adquirida da Organização Pan-Americana de Saúde, seu preço seria de US$ 13,8 (cerca de R$ 28).

É de esperar que os governos do Rio de Janeiro e do Amazonas, onde foram aprovadas leis que os autorizam a oferecer vacinação gratuita contra o HPV na rede estadual, sejam mais cuidadosos na compra do produto, evitando o preço exagerado - é o mínimo que se pode dizer - do Distrito Federal.

O problema do HPV deixa mais uma vez evidente a incapacidade da área de saúde do governo federal de reagir com a indispensável rapidez ao desafio de doenças graves. Neste caso, com a agravante de que a solução é fácil, tendo em vista a existência de um medicamento comprovadamente eficaz. A vacina reduz a incidência de infecções persistentes e a probabilidade de desenvolver câncer de colo de útero em mais de 90% das mulheres imunizadas.

Ao participar de um debate na Comissão de Assuntos Sociais do Senado sobre projeto da senadora Vanessa Grazziotin (PC do B-AM), que estabelece a vacinação gratuita contra o HPV para mulheres de 9 a 40 anos, o secretário de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde, Jarbas Barbosa, afirmou que se estima em R$ 600 milhões anuais o custo da aplicação da medida, com prioridade para as adolescentes, que constituem o grupo mais vulnerável à doença.

Essa parece ser mesmo a intenção do governo, pois se sabe que o Ministério está negociando com fabricantes da vacina um acordo para a transferência de tecnologia para sua produção aqui. Se a negociação chegar a bom termo, ela poderá ser distribuída gratuitamente aos Estados. Mas, como isso pode demorar, o mais correto é, nesse meio tempo, comprar a vacina da Organização Pan-Americana de Saúde.

Por duas razões. A primeira é a gravidade do problema. Estima-se em mais de 18.400 os novos casos da doença e em 4.800 as mortes que ela provoca por ano. E sua incidência é maior entre as mulheres de baixa renda e menor escolaridade das Regiões Norte e Nordeste.

A segunda é que aquele custo é relativamente barato, se considerarmos as vidas que a vacinação salva e também que os gastos com o tratamento da doença que não se evita, na rede pública de saúde, são muito mais elevados.

CUSTO DA SAÚDE VIP DOS SENADORES TRIPLICA EM 10 ANOS


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - VERBAS FARTAS E ILIMITADAS PARA ATENDER A SAÚDE VIP DOS SENADORES É UMA AFRONTA À FALTA DE RECURSOS PARA ATENDER A SAÚDE DO POVO QUE DETÉM O MANDATO DELES.


Despesa com assistência médica do Senado quase triplica em uma década

Valores pagos para garantir o atendimento de parlamentares, dependentes, funcionários e pensionistas superou meio bilhão de reais de 2003 a 2012

Débora Álvares e Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo, 16/03/2013


BRASÍLIA - O uso de dinheiro público para pagar as despesas médicas do Senado quase triplicou entre 2003 e 2012. O cálculo é atualizado, ou seja, a inflação do período já está descontada. Os gastos, que superam meio bilhão de reais numa década, incluem despesas dos atuais 81 parlamentares, seus dependentes e ex-parlamentares, além dos 6.300 funcionários e pensionistas.

No ano passado, o último da gestão José Sarney (PMDB-AP) à frente do Senado, o desembolso bateu o recorde da década: R$ 115,2 milhões dos cofres federais. O aumento foi de 38% em relação a 2011, quando o desembolso chegou a R$ 71,3 milhões.

Em 2012, as consultas e exames feitos pela estrutura do Senado ou fora dele ultrapassaram em R$ 10 milhões o orçamento previsto para custeio médico, cujo valor era de R$ 105,2 milhões. Trata-se de um orçamento maior do que o reservado em 2012 pelo Ministério da Educação para o Hospital Universitário de Brasília (HUB), vinculado à Universidade de Brasília (UnB), de R$ 88,7 milhões.

Aliado de Sarney e alvejado por uma ação penal e uma série de protestos online, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) voltou ao comando da Casa no início de fevereiro tentando criar uma agenda positiva com o anúncio de uma reforma administrativa que prevê o fim do atendimento ambulatorial do serviço médico do Senado para servidores e senadores.

Funcionários da Secretaria de Assistência Médica e Social (SAMS) do Senado, onde são realizados os atendimentos, disseram ao Estado que o serviço funcionará só até sexta-feira, para atender aos exames e às consultas que estavam agendados.

Emergência. Com a extinção do departamento, apenas o atendimento de emergência será mantido no Senado, cedendo parte do corpo funcional para o governo do Distrito Federal. Renan informou, por meio da assessoria de imprensa, que vai reduzir "drasticamente" despesas com assistência médica com medidas futuras. Ele não quis adiantar quais serão as mudanças.

Servidores e usuários do serviço médico já fizeram protestos e o sindicato da categoria recorreu à Justiça para impedir a mudança, que, pelas contas de Renan, vai gerar uma economia de R$ 6 milhões por ano. Se comparada com a previsão de gastos para os serviços médicos este ano, que é de R$ 105,2 milhões, a economia será apenas de 5,7%. O orçamento total do Senado este ano é de R$ 3,54 bilhões.

A explosão de gastos do Senado foi detectada após consulta no Siga Brasil, o banco de dados de acompanhamento da execução orçamentária da Casa. Em 2003, os registros oficiais apontam uma despesa de R$ 24,7 milhões. Se aplicada a inflação do período, calculada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o valor passa para R$ 40,8 milhões. O gasto, ainda assim, é quase duas vezes menor que o atual.

Questionado via Lei de Acesso à Informação Pública sobre o motivo do aumento dos gastos com as despesas médicas nos últimos dois anos, o Senado explicou que, em 2011, houve um corte na rubrica do orçamento. Por essa razão, informou, as despesas com assistência médica precisaram ser custeadas por um fundo reserva, constituído pelas contribuições mensais e participações dos servidores para o Sistema Integrado de Saúde (SIS), o plano de saúde dos funcionários. Isso gerou, de acordo com a Casa, a grande diferença de despesas de um ano para o outro.

Ao confrontar as informações com o Orçamento da União, no entanto, o Estado não encontrou a realidade informada pelo Senado. Ao contrário. De 2010 para cá, a rubrica "assistência médica" tem sido privilegiada com cada vez mais verba - o valor disponível é apenas uma referência para os gastos, que ora são menores do que está na rubrica, ora são maiores. A peça aprovada pelo Congresso na terça-feira mantém os R$ 105 milhões inicias do ano passado, valor que acabou sendo extrapolado.

Intimidade. Em relação ao fato de o ano passado ter atingido o valor mais elevado com despesa de saúde na década, o Senado disse que os gastos são variáveis, mas não podem ser detalhados em respeito à "proteção legal à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas".

sexta-feira, 15 de março de 2013

COMBATE À DENGUE É OBSTRUÍDA PELA INSEGURANÇA


ZERO HORA 15 de março de 2013 | N° 17372

DENGUE NA CAPITAL

Agentes ficam do lado de fora em 40% das residências. Visitas educativas para prevenir a dengue esbarram em recusas de moradores e em casas fechadas



O agente de combate a endemias Urubatã dos Santos ia começar a percorrer as ruas do bairro Chácara das Pedras, em Porto Alegre, na manhã de ontem. Ele iria fazer a quarta tentativa de vistoriar algumas casas quando a pedagoga Daiane Kaminski de Mello, 37 anos, parou o carro no meio-fio, baixou o vidro e perguntou:

– Tu és da vigilância sanitária?

Devidamente identificado, o rapaz foi conduzido até a casa de Daiane, uma quadra adiante, para conferir se os mosquitos que ela tinha guardado em um pote transparente eram ou não da dengue.

– Já tinha ligado para a prefeitura porque andava desconfiada que os mosquitos eram diferentes – comenta.

A confirmação de que se trata ou não do Aedes aegypti depende da análise laboratorial. A visita do agente é apenas de orientação, para banir possíveis focos do mosquito. No pequeno reservatório de uma fonte desativada no jardim, Santos coletou a primeira amostra de uma larva suspeita.

No pátio, o agente despejou água e colocou clorofila nos ralos. Também conferiu a quantidade de pastilhas de cloro na piscina e pediu uma escada para ver a calha. A cada passo, a moradora recebia uma orientação para manter a prevenção em dia.

– São ações muito simples. Se isso for feito uma vez por semana, já afasta o risco – ensina Santos.

Capital tem 25 casos autóctones da doença

O interesse de Daiane pelas lições do agente é exceção. De todas as investidas da equipe de combate à dengue na Capital, 40% esbarram na resistência dos moradores, informa a coordenadora do Controle Operacional de Dengue, Maria Mercedes Bendati.

– As pessoas cobram ação do poder público, mas elas precisam fazer sua parte para controlar a infestação – reforça a chefe da Divisão de Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual da Saúde, Marilina Bercini.

Porto Alegre contabiliza 25 casos contraídos na cidade. O Ministério Público estuda medidas legais para os casos em que os agentes são impedidos de entrar nas casas.

Tecnologia ajuda a prevenir doença

Em Porto Alegre, quando o agente de controle da dengue conclui a visita, ele cola uma etiqueta na casa. O selo tem um código QR, que segue lógica semelhante à do código de barras. O agente fotografa a etiqueta com um smartphone e cadastra o imóvel, com o endereço, o nome e o telefone do morador no aplicativo Dengue Report. Na próxima visita, ele atualiza o cadastro no sistema, fotografando de novo a etiqueta. Assim, é possível acompanhar o controle da infestação em cada bairro, em tempo real. Sistema semelhante é usado para atualizar o mapa de infestação, por meio de vistorias semanais em 714 armadilhas instaladas em 22 bairros.

TAÍS SEIBT

PERGUNTAS E RESPOSTAS

Como posso ter certeza de que o agente é da equipe de controle da dengue? - Os agentes andam uniformizados. Os itens variam em cada município. Na Capital, eles usam camiseta verde, colete, boné e mochila da equipe de prevenção. No crachá de identificação do Instituto Municipal de Saúde da Família (Imesf) consta o nome completo, o número de matrícula e o RG. Com esses dados, o morador pode confirmar se aquele é um agente da vigilância sanitária, por meio do telefone 156. A prefeitura não disponibiliza essas informações na internet para manter a privacidade dos funcionários.

Por que não é possível agendar a visita? - De acordo com a coordenadora do Controle Operacional de Dengue da prefeitura de Porto Alegre, Maria Mercedes Bendati, não é possível agendar a visita por conta do número de agentes – são 120 para atuar em 40 bairros. A estratégia adotada é retornar em horários diferentes ao local onde a casa estava fechada.

Por que não é divulgado um cronograma das visitas em cada bairro? - Maria Mercedes informa que cada região tem características diferentes, o que torna difícil prever o número de visitas que podem ser realizadas por cada agente nas diferentes áreas da cidade. Uma das estratégias já utilizadas pela prefeitura é anunciar a ação por meio de carros de som.

PARA EVITAR A DENGUE

- Feche caixas d’água, tonéis e latões
- Limpe os bebedouros de animais
- Guarde garrafas vazias com o gargalo para baixo
- Guarde os pneus velhos sob abrigos
- Mantenha desentupidos ralos, canos, calhas, toldos e marquises
- Não acumule água nos pratos dos vasos de plantas, encha-os com areia
- Coloque embalagens de vidro, lata e plástico em uma lixeira bem fechada
- Mantenha a piscina tratada o ano todo
- Coloque areia nos cacos de vidro dos muros da residência
- Não deixe acumular água em pneus, pratinhos de plantas. Em bromélias, a dica é esguichar água entre as folhas com uma mangueira, uma vez por semana, para manter a planta livre de larvas

SINTOMAS DA DOENÇA - Febre, dor de cabeça, nas articulações, nos músculos e atrás dos olhos, indisposição, perda de apetite, náusea e vômitos, manchas vermelhas no tórax e nos braços. Com sintomas, não utilize medicamento com ácido acetil-salicílico, beba muita água e consulte um médico

quarta-feira, 13 de março de 2013

A UTI QUE QUEREMOS

ZERO HORA 13 de março de 2013 | N° 17370 ARTIGOS


Cristiano Franke*


O surgimento das primeiras unidades de cuidados intensivos ocorreu no início dos anos 50 devido a um grande número de doentes acometidos por uma epidemia de poliomielite grave, com necessidade de respiração artificial. Os milhares de doentes salvos resultaram no constante aprimoramento destas unidades e concentração nestes locais de profissionais especializados no atendimento de doentes graves.

Com o crescimento da expectativa de vida da população, a alta prevalência de chamadas doenças da civilização (diabetes, obesidade, doenças cerebrovasculares, entre outras) e a epidêmica violência urbana em alguns locais têm ocasionado uma lacuna crescente entre a procura por unidades de tratamento intensivo e a capacidade de oferta deste tratamento especializado. As UTIs consomem quantidades crescentes de recursos financeiros e humanos mundialmente.

A oferta de leitos de cuidados intensivos no nosso país e no RS (13 e 17 por 100 mil habitantes respectivamente – dados do censo 2010 da Amib (Associação de Medicina Intensiva Brasileira) é maior que a de muitos países desenvolvidos (11,5 na Europa), embora com substanciais diferenças regionais, como a grande concentração na região metropolitana do nosso Estado. A disponibilidade de UTIs e de profissionais de alta qualificação (no sistema de saúde público, privado e complementar) marcou a terapia intensiva gaúcha nacionalmente e mundialmente.

As diferentes demandas têm resultado em algumas situações como o trabalho em UTI por profissionais não especializados, sem entendimento adequado, o tratamento de doentes graves fora de unidades especializadas, ou o trabalho de muitos profissionais capacitados em jornadas extraordinárias e extenuantes, ambas ocasionando um tratamento não ideal. A incidência da conhecida síndrome de burnout (associada ao trabalho excessivo e estressante, levando a desinteresse, despersonalização e desumanização) é extremamente elevada entre os profissionais de UTI, com consequências negativas para os trabalhadores, os doentes e seus familiares. Muitas vezes, o tratamento e atenção dada a um familiar de um doente em estado crítico é referido como frio e comercial.

A necessidade de uma gestão adequada dos recursos é extremamente importante para, tecnicamente, poder disponibilizar o cuidado adequado ao maior número de doentes. A sociedade científica, representando os especialistas que trabalham na UTI, está organizada para participar deste debate, que já acontece em todo o mundo. É imprescindível a participação, nesta discussão, de todos os segmentos representativos da sociedade, com a devida transparência, para a construção da UTI que todos queremos.

*MÉDICO INTENSIVISTA, PRESIDENTE DA SOCIEDADE DE TERAPIA INTENSIVA DO RIO GRANDE DO SUL (SOTIRGS)

terça-feira, 12 de março de 2013

SAÚDE FANTASMA


ZERO HORA 12 de março de 2013 | N° 17369

PÁGINA 10 | Rosane de Oliveira

Dedos de silicone

Não será surpresa se a médica Thauane Nunes Ferreira, flagrada pela Guarda Municipal em Ferraz de Vasconcelos (SP) com seis dedos de silicone para fraudar o ponto eletrônico, for dessas mulheres que protestam contra a corrupção na política distribuindo mensagens, falsas ou verdadeiras, na internet. Porque bater em políticos é um dos mais populares esportes nacionais, praticado por gente séria e idealista e por delinquentes que cometem pequenos, médios e grandes delitos.

Presa em flagrante, a doutora denunciou uma quadrilha da qual faziam parte 11 médicos e 20 enfermeiros. Profissionais que deveriam estar trabalhando no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) mandavam em seu lugar um dedo de silicone com o qual enganavam o equipamento de identificação digital.

O caso é mais um a ilustrar a tese de que a corrupção está entranhada no dia a dia dos brasileiros. Quem se dá ao trabalho de carregar dedos de silicone para trapacear o ponto eletrônico e encobrir faltas de colegas está praticando um ato tão condenável quanto o de um parlamentar que aceita propina para votar a favor de determinado projeto. Ambos estão enganando a sociedade a que deveriam servir, com o agravante de que profissionais da área da saúde têm compromisso com a vida. Se um paciente morrer por falta de atendimento decorrente da ausência de médicos que mandam dedos de silicone em seu lugar, de quem é a culpa?

Este não é o primeiro caso de fraudes envolvendo médicos. Recentemente, a polícia descobriu uma quadrilha que fraudava vestibulares de Medicina para garantir a aprovação de quem pagava para entrar na faculdade, tirando a vaga de estudantes honestos e dedicados. O esquema durou tanto tempo, que alguns dos vestibulandos que entraram em faculdades de Medicina pela porta dos fundos já são médicos. Qual é a ética de um médico que entra na universidade por meio de uma fraude?

De um profissional da área médica envolvido na venda de vagas na universidade, pode-se esperar tudo, inclusive que pratique abortos ilegais ou desligue os aparelhos de um paciente para abrir vaga na Unidade de Tratamento Intensivo.


ALIÁS - Se existem esquemas para fraudar o ponto biométrico, imagine-se o que ocorre Brasil afora nas repartições públicas em que a presença é atestada pelo chefe de um setor ou pela assinatura em um livro.

segunda-feira, 11 de março de 2013

PLANO DE SAÚDE MUDA DE NOME E ESCAPA DE PUNIÇÃO

FOLHA.COM 11/03/2013 - 04h00

Plano de saúde muda de nome e escapa de punição da ANS


ANDREZA MATAIS
DE BRASÍLIA

Vitrine do governo na saúde, o programa de monitoramento dos planos privados é investigado pelo Ministério Público Federal por suspeita de favorecimento.

A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) é acusada de poupar a Unimed Rio excluindo o nome da operadora de uma das listas de empresas suspensas por não cumprirem prazos de atendimento de consultas.

Antes de ser punida, a própria empresa pediu a suspensão dos planos, escapando da sanção. No mesmo dia, registrou novos produtos, autorizados pela agência, com nomes diferentes.

A Folha revelou ontem que as reclamações dos usuários de planos à ANS podem levar até 12 anos para serem analisadas. O PPS, partido de oposição, anunciou que pedirá a convocação do presidente da agência ao Congresso Nacional.


Editoria de Arte/Folhapress 



Um dia antes de a ANS fechar a lista dos planos que seriam punidos, a Unimed Rio pediu à agência a suspensão voluntária de 109 planos, que representam 80% de sua carteira de clientes.

Desses, 34 estavam na lista de planos mal avaliados pelo governo e que seriam punidos com a suspensão das vendas.

O pedido da suspensão voluntária foi feito às 15h --a duas horas do fim do expediente na agência-- do dia 18 de setembro de 2012. A ANS atendeu a operadora no mesmo dia.

Ao aceitar a suspensão voluntária, a agência excluiu a Unimed Rio da lista, alegando que não poderia suspender algo que já não era mais comercializado.

A publicidade dada à punição do governo é considerada pelas operadoras a maior sanção, pois afeta a credibilidade das empresas.

Além disso, quando a agência determina a suspensão das vendas, a operadora só pode retomar a comercialização após comprovar que regularizou a situação.

As empresas também são multadas em valores que chegam a R$ 100 mil. Tais punições não são aplicadas quando o pedido de suspensão é voluntário.

Os procuradores querem saber por que quatro operadoras que também estavam com os planos suspensos tiveram os nomes divulgados, ao contrário da Unimed Rio.

No mesmo dia em que pediu a suspensão, a Unimed Rio ingressou com outra demanda na agência. Solicitou o registro de 40 novos planos --todos com nomes análogos aos que tinham sido suspensos.

Surgiram o Unimed 2, Unimed Alfa 2, Unimed Alfa 2 Dental, Unimed Beta 2 Dental, entre outros. A ANS autorizou o registro dos novos planos no dia seguinte.

No site da agência, informa-se que esse procedimento depende de várias etapas, com análise e prévia aprovação pelo órgão técnico.

OUTRO LADO

A Unimed disse que desconhece o procedimento do Ministério Público do Rio para investigar a razão de ter seu nome excluído da lista de operadoras punidas.

"Dessa forma, não tem como comentar o assunto", afirmou, por sua assessoria.

A empresa informou que pediu o registro de novos planos "pela necessidade de reformulação dos mesmos, adequando a oferta da rede de prestadores em cada produto e atendendo a demandas dos próprios clientes."

De acordo com a Unimed Rio, a mudança era estudada há meses pela cooperativa e o período em que ela ocorreu não tem relação com a agenda de fiscalização da agência.

A ANS disse que a Unimed Rio solicitou a suspensão de diversos planos por falta de interesse na comercialização.

Segundo a agência, "é praxe no mercado" pedidos de suspensão voluntários. "A Unimed Rio, inclusive, assinou em fevereiro um termo de compromisso com a ANS."

O órgão regulador afirmou que divulga a lista dos planos suspensos de forma cautelar apenas "para proteção dos beneficiários."

domingo, 10 de março de 2013

12 ANOS PARA JULGAR OPERADORAS DE SAÚDE

FOLHA.COM 10/03/2013 - 04h00

ANS leva até 12 anos para julgar operadoras de planos de saúde

ANDREZA MATAIS
DE BRASÍLIA

Órgão do governo responsável por fiscalizar os planos de saúde, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) leva até 12 anos para analisar processos em que operadoras de planos de saúde são acusadas de irregularidades contra seus clientes.

Nas últimas três semanas, a Folha analisou 765 processos julgados pela diretoria da ANS entre janeiro e fevereiro. Desses, 522 tramitavam havia cinco ou mais anos na agência.

Os outros 243 processos levaram de um a quatro anos para conclusão. Operadoras condenadas ainda podem recorrer à Justiça para escapar das multas que vão de R$ 5.000 a R$ 1 milhão.

A demora faz com que punições sejam canceladas e multas reduzidas porque anos depois da abertura do processo regras foram extintas ou alteradas.

A ANS não tem poder para determinar que a operadora respeite a lei atendendo ao consumidor. A multa, porém, serve como prova para o usuário recorrer à Justiça.

Há ainda casos em que a multa sugerida foi reduzida ou anulada pela diretoria colegiada da agência, composta por indicações políticas, sem que as explicações para tanto fossem registradas em ata.

Em 2008, a primeira instância da ANS propôs multa de R$ 294 mil contra a Unimed Pelotas por incluir aditivo nos contratos sem a concordância dos usuários.

A diretoria de fiscalização se posicionou pela redução do valor da multa para R$ 21 mil. Alegou que o cálculo que se baseia no número de clientes da operadora estava errado.

Cinco anos depois, a diretoria da ANS mandou arquivar o processo. Na ata da reunião da diretoria, não há explicações dos motivos. A página da ANS na internet apenas detalha os processos julgados nos anos de 2004 a 2009.

QUEIXAS

Os planos de saúde lideram o ranking de reclamações dos consumidores elaborado pelo Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) há 12 anos.

As queixas são as mesmas que levam anos aguardando julgamento da ANS: negativa de cobertura, reajuste por faixa etária e anual e descredenciamento de serviços.

Em 2005, a Fundação Geraldo Correia, que administra o hospital São João de Deus (MG), foi acusada de recusar um cliente por ter mais de 50 anos à época, o que é proibido por lei. Da queixa até a aplicação de multa de R$ 10 mil passaram-se oito anos.

UM A UM

Os processos são analisados de forma individualizada pela ANS e passam por várias instâncias. Ou seja, se clientes de cinco empresas diferentes fizerem a mesma queixa, serão abertos cinco processos.

A agência só analisa casos conjuntamente quando as ações são coletivas.

Dos processos julgados pela ANS neste ano, dois foram abertos há 12 anos. Em ambos os casos, a agência revogou as punições porque as regras que a justificaram não estavam mais em vigor.

Num dos casos, a empresa sonegou informação sobre o responsável por repassar dados dos clientes à ANS. A legislação obriga o repasse porque as operadoras precisam ressarcir o governo caso seus clientes usem o SUS (Sistema Único de Saúde) ocupando o lugar de quem não têm condições de pagar um plano.


quarta-feira, 6 de março de 2013

MÃO DA JUSTIÇA PARA TER DIREITO BÁSICO


ZERO HORA 06 de março de 2013 | N° 17363

SAGA DA SAÚDE


O drama de um bebê que ficou três dias à espera de transferência para unidade para tratar suas queimaduras, resolvido com interferência judicial, expõe mais uma vez a realidade de superlotação em UTIs e centros especializados no Estado.

Três dias depois que a água fervente da caneca em que pretendia preparar café foi derramada e queimou 30% do corpo de seu filho, de um ano e três meses, a dona de casa Aline de Moura Krack, 19 anos, conseguiu enfim a transferência do menino para uma unidade especializada no tratamento de queimados em Porto Alegre, por determinação judicial.

Mais do que um drama pessoal, a peregrinação do paciente de Santa Vitória do Palmar em busca de atendimento expõe o drama da falta de leitos de alta complexidade pelo Sistema Único de Saúde. Como resultado, famílias como a de Diego Welinton de Moura Jardim, têm recorrido à Justiça para garantir o que deveria ser um direito básico.

Celebrada pelos parentes com alívio, a chegada do bebê ao Hospital Cristo Redentor, na manhã de ontem, após transferência de avião do Hospital Universitário de Rio Grande até o aeroporto Salgado Filho, foi precedida de uma agonia conhecida por quem enfrenta longas filas no sistema de saúde. Na primeira tentativa de atendimento, no Hospital Santa Casa de Santa Vitória do Palmar, foram seis horas de espera por um pediatra. Neste intervalo, recebeu um primeiro atendimento clínico.

– O que mais me doeu foi que o doutor falou: “não posso fazer nada por ele”. Tu ali com o filho nos braços, parecia que estava morto, e o pediatra diz que não pode fazer nada? – revolta-se a mãe.

A chegada do especialista, à 1h da madrugada, pouco aliviou o sofrimento, pois a primeira tentativa de contato com a Central de Leitos se revelou vã. A informação era de que não havia vagas em UTIs pediátricas nem em unidades para queimados. Desesperados, parentes e amigos registraram a falta de especialista em ocorrência policial e acionaram o conselho tutelar, que levou o caso à promotoria. Com o esforço, conseguiram, por meio de liminar judicial, a transferência para o Hospital Universitário de Rio Grande. O problema é que esta instituição tampouco estava equipada para tratar do bebê: não dispunha de UTI pediátrica, nem de unidade para queimados. Após nova determinação judicial, o menino acabou transferido para o Hospital Cristo Redentor, na manhã de ontem.

– Agora sim meu filho está onde devia estar. Pra mim ele nasceu de novo. Lá em Santa Vitória pensava que não ia mais ter ele. Ele já está se movimentando, apontando o que quer – comemorou a mãe, que pouco antes do embarque para Porto Alegre viu o filho abrir os olhos pela primeira vez desde o acidente, e ouviu dos médicos do Cristo Redentor que o filho terá de ficar internado por pelo menos três semanas na unidade.

A concentração da rede de alta complexidade nos arredores de Porto Alegre é um dos problemas a serem enfrentados para encurtar a angústia dos pacientes e suas famílias. No caso de UTIs neonatais, por exemplo, 57% das vagas estão na região metropolitana da Capital. O secretário da Saúde, Ciro Simoni, destaca o esforço para descentralizar o número de vagas, mas admite que há percalços no caminho (confira a entrevista na página ao lado).

Enquanto isso, casos como o de Diego estão longe de ser exceção.

– É uma dificuldade diária encontrar leitos – conta a diretora técnica do Hospital Universitário de Rio Grande, Susi Lauz.

JÚLIA OTERO E LETÍCIA DUARTE


ENTREVISTAS

 “A família se precipitou” - Ciro Simoni - Secretário Estadual da Saúde


Dizendo ter sido informado do caso do bebê Diego por Zero Hora, o secretário estadual da Saúde, Ciro Simoni, afirmou ontem à tarde que não pode levar a culpa “todas as coisas porque alguém lá na ponta não faz”. Minimizando as falhas do sistema de saúde que administra, responsabilizou a Justiça e a família por decisões equivocadas e precipitadas. Confira a seguir trechos da entrevista:

Zero Hora – Este não é o primeiro caso em que bebês só conseguem ser transferidos para leitos especializados, de UTI ou na ala de queimados, após decisão judicial. Por que isso acontece?

Ciro Simoni – Não precisava, acontece que eles se precipitaram desde o início. Tanto que a primeira decisão judicial foi uma decisão errada, porque mandou para um hospital que não tinha nem UTI pediátrica, nem tratamento para queimados. Se mandassem ao menos para a Santa Casa em Rio Grande, que tem atendimento para queimados, já era outro assunto. Porque essa criança não precisou de UTI nunca, nem está precisando agora. Ela precisava de atendimento para queimados. Nós temos atendimentos para queimados lá em Rio Grande, no Pronto Socorro em Porto Alegre, no Cristo Redentor.

ZH – A culpa é do juiz?

Simoni – Não é do juiz, é que já começou errado. A família se precipitou, entende? Foi no juiz, o juiz já mandou para o hospital universitário de Rio Grande, que não tem nem UTI.

ZH – E por que essa demora em conseguir a transferência para a unidade de queimados? No Cristo Redentor havia vagas disponíveis na unidade de queimados ontem, mas mesmo assim o Estado só realizou a transferência depois da ordem judicial.

Simoni – Eu entrei no circuito quando li a Zero Hora, ontem. E vimos que tinha vaga no Cristo. Às três ou quatro horas da tarde telefonamos para Rio Grande, disseram “ah, então nós vamos mandar”. Agora de manhã (ontem) vimos que o paciente não veio, mas estávamos esperando. Qual a dificuldade? Eu não posso adivinhar. Eu não posso levar a culpa de todas as coisas porque alguém lá na ponta não faz.

ZH – As pessoas acabam recorrendo à Justiça porque o Estado parece que não tem essa agilidade...

Simoni – Mas não é. A médica telefonou para Rio Grande e disseram que não tinha vaga. No sábado de noite não tinha, mas depois se conseguiu. Só que daí já tinha a decisão judicial e não podia transferir.

ZH – O senhor tem dito que o número de leitos está adequado à população, mas 57% dos leitos em UTI neonatal estão concentrados na Região Metropolitana. Isso não é uma distorção?

Simoni – Não fui eu quem fiz isso. Eu estou tentando remediar essa situação. Tanto que nós estamos abrindo 10 leitos em UTI pediátrica em Rio Grande, que só não está funcionando porque não tem pessoal, porque o Ministério Público Federal não deixa que contrate. E já repassei R$ 1 milhão para o Hospital São Francisco de Pelotas para que eles possam se adaptar, para ter 10 neonatal e 10 pediátricas.

ZH – Também são comuns casos de falta de médicos, como na UTI de Canguçu, que acabou fechada no ano passado, por falta de profissionais. As entidades médicas dizem que o problema são os baixos salários, que não atraem os médicos.

Simoni – Ora, ora, não faltam profissionais por causa disso. Podem até em outras áreas, mas em UTI não faltam. O problema é que as pessoas não querem trabalhar em Canguçu. Em Rio Grande tem pessoal, e não podem contratar, é uma questão burocrática. Mas eu peguei essa herança. Nós já ampliamos 70 leitos em UTI no Estado.


“Não raramente a Justiça tem de intervir” - Quelen Van Caneghan - Juíza da Vara da Infância


A juíza Quelen Van Caneghan, titular da Vara da Infância e Juventude da comarca de Santa Vitória do Palmar, foi quem concedeu a liminar para transferência do bebê Diego. Confira abaixo entrevista sobre o tema:

Zero Hora – Foi a senhora quem deu a primeira liminar para entrada da criança no Hospital Universitário de Rio Grande?

Quelen Van Caneghan – Sim. Eu estava de plantão e, por volta, das 2h30min de domingo, chegou até mim o pedido de transferência para o Hospital Universitário (HU) de Rio Grande e eu, imediatamente, aprovei. Mas, mais tarde, ficamos sabendo que a indicação do hospital de Santa Vitória estava equivocada. No HU, não há UTI pediátrica ou para queimados.

ZH – E a senhora sabia disso?

Quelen – Não. O juiz fica limitado a tomar decisão com base no pedido, não tenho como questionar uma prescrição médica, se pressupõe que aquele seria o ideal.

ZH – E haverá alguma investigação a respeito dessa indicação equivocada do hospital de Santa Vitória?

Quelen – Na verdade cabe à família tomar providências, se acha que aquilo prejudicou o bebê. No caso, se tivéssemos a informação correta, poderíamos tê-lo enviado diretamente a Porto Alegre, sem passar por Rio Grande.

ZH – E o pedido complementar da primeira liminar, que ordenava transferir o bebê de Rio Grande para Porto Alegre, também foi a senhora quem concedeu?

Quelen – Sim, foi deferido ontem (segunda-feira) e cumprido hoje (terça-feira).

ZH – A senhora acompanhou outros casos parecidos?

Quelen – Ano passado também houve uma situação de bebê que precisava ser internado em uma UTI pediátrica e os parentes tiveram que entrar na Justiça para garantir a vaga. Não raramente a Justiça tem de intervir para garantir um direito mínimo do cidadão, em razão de burocracias administrativas, de omissão dos gestores da saúde pública e até mesmo negligência nos atendimentos, submetendo a população a uma espera demasiada, que coloca em risco a própria vida e desconsiderando situações legais que impõem prioridades e encaminhamentos, sobretudo tratando-se de menor em estado grave.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Como ocorre com as políticas prisionais, há um descaso generalizado do poder político nas políticas de saúde pública com a conivência dos parlamentos e com a leniência da justiça. Ações superficiais e imediatistas são sempre tomadas pela justiça, sem qualquer força para acabar definitivamente com este descaso e com as negligências das autoridades de Estado que causam sofrimento e morte numa população que paga as taxas de impostos mais elevados do mundo para manter a máquina pública mais cara do planeta. Assim, deve-se apoiar e aplaudir o ativismo judicial exercido neste caso, mesmo que pontual, para obrigar o poder político a adotar soluções para casos particulares. A nossa esperança  é esperar pelo dia em que a justiça brasileira declarar sua independência do poder político e começar a exercer seu papel coativo na democracia brasileira, com sistema, agilidade e comprometimento.