domingo, 4 de outubro de 2015

SUICÍDIO NA INFÂNCIA E NA ADOLESCÊNCIA. É PRECISO ROMPER O SILÊNCIO

 
ZERO HORA 04 de outubro de 2015 | N° 18314


ITAMAR MELO



CRESCE O NÚMERO DE CASOS entre crianças e adolescentes brasileiros. No Rio Grande do Sul, estudo deste ano mostra que, entre 2005 e 2013, houve 4.658 tentativas por autointoxicação


No começo deste ano, uma menina de Porto Alegre subiu no telhado de sua casa e ameaçou atirar-se lá do alto. Os pais foram chamados às pressas no trabalho. Levada ao Centro de Promoção da Vida e Prevenção ao Suicídio do Hospital Mãe de Deus, a garota contou que tentara se matar porque ninguém lhe dava atenção na família. O pai e a mãe passavam os dias fora, do início da manhã até a noite. A menina tinha oito anos.

Um garoto da mesma faixa etária ingressou na emergência do hospital, pouco tempo atrás, por ter ingerido uma moeda. O otorrino retirou o objeto e liberou o paciente. Uma semana depois, ele retornou. Desta vez, havia engolido várias moedas. Na investigação, descobriu-se que a motivação para a atitude era tristeza.

Situações desse tipo estão se tornando mais comuns nesta década, segundo diferentes levantamentos, resultando em aumento de mortes entre crianças e adolescentes. Conforme a publicação Mapa da Violência, que se baseia em dados coletados pelo Ministério da Saúde, as faixas em que as taxas de suicídio mais cresceram no Brasil, entre 2002 e 2012, foram as dos 10 aos 14 anos (40%) e dos 15 aos 19 anos (33,5%). No Rio Grande do Sul, de acordo com estatísticas da Secretaria Estadual da Saúde, ocorreram 60 suicídios nesse grupo em 2013, o maior número desde 2009.

Essas mortes são a face trágica de um problema muito mais abrangente, que diz respeito às tentativas de tirar a própria vida. De acordo com os registros existentes no Centro de Informações Toxicológicas (CIT), 4.658 crianças e adolescentes gaúchos tentaram se matar, apenas por autointoxicação, entre 2005 e 2013.

– Até hoje, jamais tínhamos constatado tentativas em idade tão tenra. E agora está acontecendo isso. É uma novidade, uma coisa pouco estudada, um novo mundo. Por enquanto, estamos apenas detectando o problema. Precisamos de pesquisas e de uma política específica. Porque a metodologia de prevenção para criança e adolescente tem de ser outra. Para começar, é mais difícil de detectar o risco, porque eles não verbalizam tanto quanto a pessoa mais velha – observa o psiquiatra Ricardo Nogueira, coordenador do Centro de Promoção da Vida e Prevenção ao Suicídio.

Para o médico Vitor Stumpf, voluntário do Centro de Valorização da Vida (CVV), as tentativas de suicídio ente crianças e adolescentes são um problema muito negligenciado, pouco conhecido até mesmo por profissionais.

– A massa dos pediatras não tem conhecimento nessa área. Neste mês de outubro, tentei de todos os jeitos incluir uma mesa sobre suicídio em um congresso de pediatria. Negaram – afirma.

PESQUISA APONTA PARTICULARIDADES

Os dados do CIT foram dissecados em uma dissertação de mestrado defendida na UFRGS em maio. De autoria da psiquiatra da infância e da adolescência Berenice Rheinheimer, o trabalho trouxe dados alarmantes, indicando tendência de forte aumento nas tentativas no universo dos oito aos 17 anos (abaixo dessa idade, os casos são automaticamente classificados como acidente). Em 2005, foram 492 episódios. Em 2013, apesar de a população da faixa etária ter recuado consideravelmente, os casos subiram para 626.

– Uma das coisas que chocam em relação a esses números é que a comunicação de casos ao CIT é voluntária. A realidade pode ser bem pior do que a registrada – sustenta Berenice.

Se o suicídio entre adultos já está envolto por silêncios e tabus, é ainda mais entre crianças e adolescentes. A sociedade, em geral, não aceita a ideia de que eles possam querer se matar. Pais de adolescentes que se mataram tendem à negação, uma reação ao sentimento de culpa. Além disso, é escasso o conhecimento sobre que lógica rege os suicídios juvenis e sobre como preveni-los – os estudos e a experiência existentes dizem respeito basicamente a pessoas mais velhas.

A pesquisa de Berenice ajuda a iluminar algumas das diferenças e particularidades. Ao analisar os dados do CIT, ela descobriu que crianças e adolescentes tendem a tentar o suicídio no segundo semestre do ano – com destaque para o mês de outubro –, talvez como um reflexo de dificuldades escolares. Entre adultos, existem estudos demonstrando que a preferência é pelo verão. Berenice percebeu também que as crianças atentam contra a vida em dias de semana – nas outras faixas etárias, o ato tende a ocorrer no sábado ou no domingo.

– Chamou a atenção que a véspera de Natal foi o dia com menos casos ao longo de nove anos. Depois, veio o Dia das Crianças. É um achado que não esperávamos. Não há relato sobre isso em lugar nenhum. Pode ter relação com o fato de nessas datas as crianças estarem em casa, com as famílias, mais satisfeitas. É uma hipótese – observa a pesquisadora.

As tentativas de suicídio por autointoxicação envolvendo crianças e adolescentes também espantam em razão das substâncias utilizadas. Enquanto em outros países os relatos envolvem a ingestão de analgésicos, por aqui as tentativas relacionadas a medicamentos são principalmente com antidepressivos (23,47%), ansiolíticos (20,76%), antitérmicos (15,20%) e anticonvulsivantes (13,01%). Em 98,5% das situações, a tentativa é realizada em casa.

– Como é que nossas crianças estão tendo acesso a essa medicação? É uma falha das famílias e da área da saúde, por não orientar que esses medicamentos têm de ficar escondidos – alerta Berenice.



ENTREVISTA

“O bullying está fortemente associado”


CARLOS ESTELLITA-LINS - Coordenador do Grupo de Pesquisa de Prevenção ao Suicídio da Fundação Oswaldo Cruz (RJ)



Por que aumentou o suicídio na infância e na adolescência?

O que há são explicações epidemiológicas. É como na economia. Por que a bolsa subiu? Você encontra três ou quatro eventos importantes relacionados e diz que deve ter sido por isso. Esse tipo de critério cientítico é bastante frouxo, mas é o melhor que a gente tem. A partir dos nove anos, você tem dados de suicídio. A partir dos 12 anos, já é relevante. O modelo do suicídio é sofrimento psíquico grande, depressão, ansiedade. No caso do jovem, é importante mencionar, existem situações de violência. A violência no Brasil não diminuiu, ela cresceu.

A violência da sociedade tem um impacto no suicídio?

Tem, por alguns mecanismos obscuros e outros claros. Situações de violência geram sofrimento psíquico, geram perdas. E especialmente o abuso, a violência física, com humilhação. Uma forma de violência institucional, que é o bullying, está fortemente associada ao suicídio no adolescente.

Alguma pressão social nova surgiu sobre os adolescentes nos últimos anos?

O aumento é, na verdade, uma curva de elevação. Não está marcando um acontecimento novo. O ponto que a gente pode discutir é a digitalização da sociedade, a virtualização. Há vantagens, mas cada vez mais a gente começa a observar as perdas, os malefícios, que ainda estão sendo estudados.

Que tipo de impacto teria a onipresença da internet?

No adolescente, a gente discute se há síndromes e distúrbios novos. A pessoa ficar vivendo num mundo virtual, levando a um maior afastamento, introspecção, a mais depressão, a um isolamento.

A internet facilita também o acesso a informaçõoes sobre suicídio?

Isso é preocupante, porque o conhecimento dos meios muitas vezes é buscado por quem está com ideação suicida. Ele pode começar a planejar, e isso auxilia. Outro aspecto são ambientes virtuais onde se pode falar tudo, exortar o jovem a fazer. Onde, de modo inconsequente, protegida pelo anonimato, a pessoa exorta o suicídio, dá conselhos, banaliza. A gente viu casos de meninas que foram humilhadas, que tiveram suas imagens eróticas divulgadas de maneira ilegal. É uma forma de cyberbullying. Isso gerou uma forma de suicídio menos típica, que não está relacionada com sofrimento psíquico continuado, e sim com o amor-próprio. Isso é uma novidade. É muito grave.






quinta-feira, 27 de agosto de 2015

CARTA DE UMA MÉDICA




Fernanda Melo


"Dilma, deixa eu te falar uma coisa!

Sou Fernanda Melo, médica, moradora e trabalhadora de Cabo Frio, cidade da baixada litorânea do estado do Rio de Janeiro.

Este ano completo 7 anos de formada pela Universidade Federal Fluminense e desde então, por opção de vida, trabalho no interior. Inclusive hoje, não moro mais num grande centro. Já trabalhei em cada canto...

Você não sabe o que eu já vi e vivi, não só como médica, mas como cidadã brasileira. Já tive que comprar remédio com meu dinheiro, porque a mãe da criança só tinha R$ 2,00 para comprar o pão.

Por que comprei?
Porque não tinha vaga no hospital para internar e eu já tinha usado todos os espaços possíveis (inclusive do corredor!) para internar os mais graves.

Você sabe o que é puxadinho?

Agora, já viu dentro de enfermaria? Pois é, eu já vi. E muitos. Sabe o que é mãe e filho dormirem na mesma maca porque simplesmente não havia espaço para sequer uma cadeira?

Já viu macas tão grudadas, mas tão grudadas, que na hora da visita médica era necessário chamar um por um para o consultório porque era impossível transitar na enfermaria?

Já trabalhei num local em que tive que autorizar que o familiar trouxesse comida ( não tinha, ora bolas!) e já trabalhei em outro que lotava na hora do lanche (diga-se refresco ralo com biscoito de péssima qualidade) que era distribuído aos que aguardavam na recepção.

Já esperei 12 horas por um simples hemograma. Já perdi o paciente antes de conseguir um mera ultrassonografia. Já vi luva descartável ser reciclada. Já deixei de conseguir vaga em UTI pra doente grave porque eu não tinha um exame complementar que justificasse o pedido.

Já fui ambuzando um prematuro de 1Kg (que óbvio, a mãe não tinha feito pré natal!) por 40 Km para vê-lo morrer na porta do hospital sem poder fazer nada. A ambulância não tinha nada...

Tem mais, calma! Já tive que escolher direta ou indiretamente quem deveria viver. E morrer...

Já ouvi muito desaforo de paciente, revoltando com tanto descaso e que na hora da raiva, desconta no médico, como eu, como meus colegas, na enfermeira, na recepcionista, no segurança, mas nunca em você.

Já ouviu alguém dizer na tua cara: meu filho vai morrer e a culpa é tua?
Não, né? E a culpa nem era minha, mas era tua, talvez. Ou do teu antecessor. Ou do antecessor dele...

Já vi gente morrer! Óbvio, médico sempre vê gente morrendo, mas de apendicite, porque não tinha centro cirúrgico no lugar, nem ambulância pra transferir, nem vaga em outro hospital?

Agonizando, de insuficiência respiratória, porque não tinha laringoscópio, não tinha tubo, não tinha respirador?

De sepse, porque não tinha antibiótico, não tinha isolamento, não tinha UTI?

A gente é preparado pra ver gente morrer, mas não nessas condições.
Ah Dilma, você não sabe mesmo o que eu já vi!
Mas deixa eu te falar uma coisa: trazer médico de Cuba, de Marte ou de qualquer outro lugar, não vai resolver nada!
E você sabe bem disso.

Só está tentado enrolar a gente com essa conversa fiada. É tanto descaso, tanta carência, tanto despreparo...
As pessoas adoecem pela fome, pela sede, pela falta de saneamento e educação e quando procuram os hospitais, despejam em nós todas as suas frustrações, medos, incertezas...

Mas às vezes eu não tenho luva e fio pra fazer uma sutura, o que dirá uma resposta para todo o seu sofrimento!

►O problema do interior não é falta de médico. É falta de estrutura, de interesse, de vergonha na cara. Na tua cara e dessa corja que te acompanha!◄

Não é só salário que a gente reivindica.
Eu não quero ganhar muito num lugar que tenha que fingir que faço medicina. E acho que a maioria dos médicos brasileiros também não.

Quer um conselho?

Pare de falar besteira em rede nacional e admita: já deu pra vocês!

Eu sei que na hora do desespero, a gente apela, mas vamos combinar, você abusou!

Se você não sabe ser "presidenta", desculpe-me, mas eu sei ser médica, mas por conta da incompetência de vocês, não estou conseguindo
exercer minha função com louvor!

Não sei se isso vai chegar até você, mas já valeu pelo desabafo!"


FONTE:
Marina Ines Acorde Brasil Ribeirão Preto - SP
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segunda-feira, 24 de agosto de 2015

RADIAÇÃO DE CELULARES PODE SER PREJUDICIAL À SAÚDE

 

G1 FANTÁSTICO Edição do dia 23/08/2015


Estudo mostra que radiação de celulares pode ser prejudicial à saúde. Cientista ucraniano garante que essa radiação tem efeito sobre o organismo. O tema, porém, divide opiniões.





Nas grandes cidades do mundo e até nas que não são tão grandes assim, a gente vê telefones celulares, e suas torres, pra todo lado. Esses equipamentos emitem um tipo de radiação que os cientistas diziam que era inofensiva. Entre os pesquisadores, o tema divide opiniões. Você vai ver, agora, as conclusões de um levantamento supercompleto feito a partir de cem artigos científicos que tratam desse assunto. E que cuidados devemos tomar.

São Paulo vista do alto! Um mar de concreto e de antenas, muitas de telefonia móvel. São Paulo vista de baixo: um fluxo constante de pessoas e de telefones celulares.

Avenida Paulista, um dos pontos mais movimentados e mais altos de São Paulo. Esse é um lugar cercado de radiação e de ondas eletromagnéticas, que, é claro, a gente não consegue ver.

Se a gente voltasse no tempo, para 1985, a quantidade de radiação eletromagnética. Se ela fosse visível, seria mais ou menos como mostrado no vídeo acima. Mas agora, 30 anos depois, com celulares, tablets e computadores para todo lado, os cientistas calculam que a quantidade de radiação eletromagnética aumentou muito: 250 mil vezes. Se essas ondas fossem visíveis, você não conseguiria enxergar mais nada.

Mas toda essa radiação é segura para saúde? O tema divide opiniões. Enquanto muitos cientistas duvidam que a radiação de baixa intensidade provoque algum tipo de dano, outros discordam.

Um levantamento supercompleto, recém-publicado, de pesquisadores da Ucrânia e dos Estados Unidos concluiu: essas ondas eletromagnéticas podem não ser tão inofensivas como se pensava.

“Essa energia entra nos tecidos. Estamos falando de efeitos de radiação no organismo”, afirma o biólogo molecular Segiy Kyrylenko.

O estudo reforça o que já tinha sido divulgado em um relatório de 2011, da Organização Mundial da Saúde (OMS). Trinta e um cientistas, de 14 países, decidiram incluir a radiação dos celulares na mesma categoria da emissão de gases de automóveis e do café, o grupo 2B, dos agentes possivelmente cancerígenos.

“Os efeitos dessa radiação são evidentes, detectáveis e temos que ter cuidado”, garante Kyrylenko.

Um dos autores do levantamento mais recente, o ucraniano Sergyi Kyrylenko, passa uma temporada na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Dos 100 trabalhos que o grupo dele analisou, 93 detectaram algum tipo de efeito em organismos vivos das ondas dos celulares, chamadas de radiação de baixa frequência. Kyrylenko destaca uma dessas pesquisas, feita pela própria equipe ucraniana.

“Nós pegamos ovos de codorna e colocamos um celular comum por cima. Depois de três dias expostos à radiação do aparelho, o desenvolvimento dos ovos acelerou. Depois de cinco dias, no entanto, o desenvolvimento dos mesmos ovos desacelerou. Não estamos dizendo que isso pode causar danos. O que estamos falando é que essa radiação tem algum efeito no organismo, não é neutra”, relata Kyrylenko.

Essa radiação neutra tem um outro nome: radiação não-ionizante. Isso quer dizer que ela não tem energia suficiente para quebrar moléculas, como a do DNA, e fazer estragos no nosso corpo.

Já um outro tipo de radiação sabidamente provoca danos: a radiação ionizante. Ela causa doenças, inclusive o câncer. É a radiação das bombas atômicas e dos raios-x, que são muito úteis, mas precisam ser aplicadas em doses baixas.

Mas se a radiação não-ionizante não tem energia suficiente para romper moléculas e causar doenças, então como é que ela afeta os organismos vivos? Os cientistas têm uma forte suspeita.

O que boa parte dessas pesquisas está detectando lá nas células tem um nome complicado, mas é fácil de explicar: é o estresse oxidativo. Quando a gente respira, o oxigênio faz muito bem, é claro. Mas ele também produz substâncias que podem causar doenças, são os radicais livres. Só que dentro do nosso organismo, existem substâncias que combatem os radicais livres. Só que no estresse oxidativo há um desequilíbrio, fica sobrando radical livre no organismo e isso pode levar a muitas doenças.

“São danos que podem levar ao desenvolvimento de tumores” afirma Kyrylenko.

Nos consultórios e salas de cirurgia, opiniões diferentes. O doutor Antonio de Salles, professor de neurocirurgia da Universidade da Califórnia, toma precauções.

“Eu uso bastante celular, claro, mas eu tento evitar colocar na orelha, com o alto falante do telefone. Eu acho que nós devemos usar o celular distante do nosso corpo”, aconselha o neurocirurgião.

Guilherme Lepski, também neurocirurgião e treinado na Alemanha, tem uma visão oposta:

“Eu não acredito muito nesse risco prático do celular na formação de tumores. É possível que exista algum risco? É possível. Eu particularmente acho que esse risco deve ser mínimo, muito pequeno ou, eventualmente, não existente”, diz Lepski.

E o doutor José Renato Félix Bauab, neurologista clínico, espera por mais pesquisas.

“Têm alguns estudos que conseguiram comprovar que a proximidade ao crânio, naquele lado do cérebro, você tem um aumento de metabolismo. Mas ainda não conseguiu-se ainda uma comprovação de lesão ao DNA”, pondera Bauab.

Mas o neurocirurgião Antonio de Salles lembra que os celulares são um fenômeno recente, e muitas vezes, na medicina, é preciso tempo para os efeitos ficarem claros. “Quando os anos se passam e se seguem apropriadamente os estudos e os pacientes, a gente começa a ver isso”, diz Salles.

O representante dos fabricantes afirma:

“Usar celular é seguríssimo. Os celulares que são colocados para comercialização seguem determinados padrões definidos pela Organização Mundial de Saúde. E esses limites têm uma margem de segurança enorme”, afirma Aderbal Bonturi Pereira, diretor do Fórum de Fabricantes de Celulares.

Enquanto o debate prossegue, os cientistas dão dicas para você se proteger.

1) Use o celular longe do corpo. “Principalmente, quando o celular está fazendo a conexão, que é quando a radiação está mais forte. Depois, é só usar o viva voz”, recomenda Kyrylenko.

2) Prefira mensagens de texto a ligações. “A radiação não-ionizante será menor”, diz Salles.

3) Não durma com o celular perto da cabeça.

4) Não carregue o aparelho no bolso.

5) E, por fim, importante! Enquanto houver dúvidas, evite que crianças usem o celular.

“O osso é mais fino, as células estão em desenvolvimento”, esclarece Salles.

“Não é para jogar fora os celulares, mas para usar com sabedoria” afirma Kyrylenko.

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

MAIS UM HOSPITAL VAI FECHAR! MAS QUEM SE IMPORTA?



ZERO HORA 06 de agosto de 2015 | N° 18249


CARLOS ROBERTO SCHWARTSMANN



Em sua edição de 1º de agosto, ZH publicou a mais triste notícia para a nossa saúde: o Hospital Parque Belém está prestes a fechar. Porto Alegre deve ser a única cidade do mundo que, em tempo de paz, permitiu que fossem fechados nove hospitais nos últimos anos. Onde estavam nossos governantes? Hiroshima e Nagasaki perderam seus hospitais no mesmo dia e no mesmo momento, mas estavam em guerra. Nós nunca estivemos em guerra. Segundo o Simers, o déficit de leitos em Porto Alegre é superior a 4 mil.

A nossa querida Santa Casa, de 211 anos, maior hospital filantrópico que atende pelo SUS no Brasil, se vê constrangida a reduzir o número de seus leitos, pois no ano passado bateu o recorde histórico e inconcebível de R$ 102 milhões de prejuízo com o SUS. É necessário magia para tapar um rombo como esse que, entre outras coisas, obriga o hospital a se submeter aos indignos empréstimos do nosso sistema bancário. Tal situação impede a manutenção adequada, a ampliação e a modernização de qualquer hospital. E, certamente, essa realidade sombria não pode ser imputada a uma má administração.

O governo federal lavou as mãos quando municipalizou a saúde. Há 20 anos, não há reajuste nos exames laboratoriais. Por uma análise de glicemia o sistema paga R$ 1,85. Somente o tubo a vácuo do exame custa em torno de R$ 3. A diária hospitalar é simplesmente ridícula: R$ 16,19. Nenhum hotel ou motel de quinta categoria pode sobreviver com tais preços. A consulta médica especializada é R$ 10. Por uma cesariana, o obstetra e toda a equipe médica recebem R$ 150,05. Para tratar uma fratura do fêmur, os três ortopedistas, mínimo necessário para realizar a cirurgia, recebem conjuntamente R$ 145,07.

Nestes tempos precários, toda a rede de saúde está contaminada. Os convênios viraram SUS e o SUS virou Misericórdia. O número de médicos que atendem pelo sistema vem diminuindo drasticamente ano após ano. Os pacientes do Interior sabem bem do que estou falando!

Os colegas que atendem pelo SUS são abençoados e cumprem – esfarrapados, mas com honra – o juramento de Hipócrates: “Em primeiro lugar está o bem do paciente”.

Será muito difícil alcançar essa meta sem hospitais!

Médico e professor universitário

quinta-feira, 16 de julho de 2015

DIAGNÓSTICO DE 2012 DO TCU SOBRE DESCONTROLES NA SAÚDE


ZERO HORA 16 de julho de 2015 | N° 18228



INFORME ESPECIAL | Tulio Milman



DIAGNÓSTICO 1

Diante de informações veiculadas pelo Informe Especial sobre descontroles na área da saúde, o Tribunal de Contas da União se manifestou. Na condição de órgão responsável pela fiscalização de recursos federais, debruçou-se sobre a questão em 2012. As principais conclusões:

-Inconsistência do planejamento da contratação de serviços de saúde.

-Ausência de ampla divulgação, como regra geral, das necessidades de serviços a serem contratados, especialmente na área ambulatorial.

-Falhas na formalização dos procedimentos de seleção das instituições privadas de assistência à saúde mediante chamamento público.

-Pagamento a prestadores de serviços de saúde da rede privada sem a formalização do competente contrato.

-Definição genérica do objeto dos contratos firmados com prestadores de serviços hospitalares e ambulatoriais pagos por produção e ausência do respectivo Plano Operativo.

-Ausência de definição nos contratos de prestação de serviços de saúde, tanto ambulatoriais quanto hospitalares, ou de designação formal, dos responsáveis pela fiscalização da sua execução.

-Distribuição dos serviços hospitalares e ambulatoriais contratados não está compatível com os quantitativos estimados para população de cada município.

-Ausência ou deficiência no acompanhamento, controle e avaliação dos serviços contratados.

-Pagamento indevido a entidades filantrópicas que aderiram ao processo de contratualização (Portarias GM/MS n. 1.721/2005, SAS/MS n. 635/2005 e GM/MS n. 3.123/2006).



DIAGNÓSTICO 2

Feitas as constatações, o TCU formalizou uma série de determinações à Secretaria Estadual da Saúde. O cumprimento das decisões foi monitorado por meio do processo 003.321/2015-0. O relatório está pronto, mas ainda não foi julgado. O valor fiscalizado chegou a R$ 1,39 bilhão.



BOA NOTÍCIA


A disposição do governo estadual e dos hospitais é de dialogar. Ganham todos.





quarta-feira, 15 de julho de 2015

SOCORRAM OS QUE ESTÃO DOENTES



ZERO HORA 15 de julho de 2015 | N° 18227



PAULO SERGIO ROSA GUEDES



Um amigo e colega, excelente médico e pessoa profundamente interessada na saúde de seus pacientes – aspecto este que o distingue – me pediu que o ajudasse num tema de interesse geral, referente à saúde pública. Disse-me ele: “Precisamos nos unir na defesa dos pacientes, esta é uma luta na qual vale a pena investir”.

Instigou-me a participar dessa luta em face de achar que eu possuo dotes para escrever – o que não sustento que seja bem assim – e que, por isto, poderia colaborar com o problema, de conhecimento geral, do descaso que genericamente tem sido dedicado aos integrantes de nossa sociedade que necessitam de cuidados médicos.

Meditei sobre o pedido. Interessei-me pelo tema, muito, é claro, pela grande consideração que tenho por ele – meu amigo e colega – e pela imensa importância que tem o bom atendimento das pessoas.

Assim, esclareci, para mim mesmo, alguns aspectos fundamentais do país em que vivemos, os quais, sinteticamente, descrevo nestas linhas. Sem nenhuma intenção de crítica banal e/ou destrutiva, passo a enumerá-los:

1. Não possuímos mais uma rede ferroviária. Isto nos leva a não termos estradas de rodagem em boas condições – o que se torna impossível – nem possibilidade de transportar cargas aos portos ou a locais onde necessitam ser desembarcadas;

2. Mantemos um sistema financeiro cujo objetivo maior consiste em aumentar os lucros, com absoluta independência da relação trabalho/ganho;

3. Cultivamos um desinteresse visível pelo uso de nossas hidrovias, o que repercute da mesma maneira que o citado no item 1 acima;

4. E, para não me alongar, pois muito mais teria a dizer, nos especializamos num sistema de ensino muito mais burocrático do que realmente formador da personalidade de nossos jovens.

Ora, se é verdade o que sinteticamente descrevi, não temos como promover um eficiente trabalho de atendimento médico – que precisa bem menos de dinheiro do que de vontade política – e é extremamente imprescindível ao nosso desenvolvimento.

Encerro afirmando o que sempre e permanentemente soubemos: a omissão de socorro é crime previsto em nosso Código Penal.

*Médico

sábado, 11 de julho de 2015

RESOLVAM, SENHORES GOVERNANTES!




ZERO HORA 11 de julho de 2015 | N° 18223


EDITORIAL



A situação da saúde é dramática demais para ser debitada apenas ao Executivo, embora a iniciativa de uma convocação de poderes para impedir o caos deva partir do governador.O clamor de um número a cada dia maior de pacientes desatendidos, em consequência da aceleração nos atrasos de repasses por parte do governo estadual, exige uma urgência ainda maior na solução desse drama, que impõe à população as consequências da crise financeira sob a forma de sofrimento físico e psicológico. Municípios gaúchos de maior porte, como Porto Alegre, vêm recorrendo ao Judiciário na tentativa de assegurar os repasses. Os demais prometem partir para ações individuais, depois que o Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Estado, representando 497 prefeituras gaúchas, teve uma liminar negada.

Ainda assim, é preciso que as providências não ocorram apenas por força da lei, mas pela conscientização de que essa área não pode ser relegada ao desamparo pelo poder público.

Intensificado a partir dessa semana, o problema é consequência direta da crise do setor público. De 2000 até agora, a participação da União nos recursos destinados à saúde pública caiu de 60% para 40%. A situação, que já era difícil, foi agravada com a queda do Produto Interno Bruto (PIB) e com a necessidade de o governo federal recorrer ao ajuste fiscal. O atraso nos repasses por parte do governo do Estado acelerou o fechamento de alas de instituições de saúde e até mesmo de hospitais, sobrecarregando os dos maiores municípios, que se veem compelidos a recorrer ao Judiciário. Em consequência, pacientes ficam sem vaga nas emergências hospitalares e precisam aguardar ainda mais tempo por uma consulta com especialista.

Todos sabemos que, no setor público gaúcho, os recursos estão escassos e que o governo está imobilizado por sucessivas decisões judiciais com o objetivo de garantir o pagamento de salários em dia a grupos de servidores.

Ainda assim, todos os ocupantes de funções públicas – o governador, os secretários, os parlamentares, os juízes e os demais integrantes da administração – estão nos seus cargos para resolver os problemas dos cidadãos.

Questões relacionadas a essa área não podem esperar, pois a demora pode agravar o quadro dos pacientes e até mesmo levar à morte em muitos casos. A situação da saúde é dramática demais para ser debitada apenas ao Executivo, embora a iniciativa de uma convocação de poderes para impedir o caos deva partir do governador.

quinta-feira, 9 de julho de 2015

JUSTIÇA MANDA GOVERNO REPASSAR RECURSOS PARA A SAÚDE



ZERO HORA 09 de julho de 2015 | N° 18221


CRISE NA SAÚDE. TJ manda governo do Estado repassar recursos para Canoas


PREFEITURA DIZ QUE ATRASO na área ultrapassa R$ 10 milhões, colocando em riscos os atendimentos



O desembargador Eugênio Facchini Neto, integrante do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), concedeu liminar para que os recursos destinados à área da saúde, de responsabilidade do Estado, sejam repassados ao município de Canoas.

O mandado de segurança, com pedido de liminar, de autoria da prefeitura, afirma que repasses integrais não estão sendo realizados desde janeiro, somando atrasos que ultrapassam R$ 10 milhões. De acordo com Facchini Neto, ainda que sejam públicas e notórias as dificuldades financeiras do Estado e que decisões judiciais não fazem com que o dinheiro apareça, do ponto de vista jurídico, há dever constitucional do governador de cumprir a legislação, honrando compromissos legalmente assumidos.

No processo, o desembargador coloca que “se o Executivo realmente não dispuser de dinheiro em caixa para honrar seus compromissos, então adotará as medidas que entender necessárias ou inevitáveis, assumindo, porém, os ônus políticos e a responsabilidade jurídica daí decorrentes. Governar também significa enfrentar crises e assumir responsabilidades. Ao Judiciário é que falece legitimidade institucional para autorizar descumprimento de normas ou compactuar com isso”.

O desembargador menciona, ainda, diversos artigos da Constituição Federal, afirmando a relevância do tema e destacando que é dever do Estado repassar de forma regular e automática os recursos destinados à saúde, não cabendo decidir se repassa ou não os valores. Foi concedida a liminar em parte, determinando que os repasses de julho e dos meses seguintes sejam feitos de forma integral.

O mérito do processo será julgado pelo Órgão Especial do TJRS, para manter, ou não, a decisão – mas ainda não há data definida para isso. A Procuradoria- Geral do Estado (PGE) informou que está analisando a decisão para ver o que fará daqui para frente.

EM DIVERSAS CIDADES
-O Hospital Montenegro suspendeu atendimentos de especialistas, exames e procedimentos eletivos, por exemplo.
- A Fundação Hospitalar Centenário São Leopoldo, referência para 17 municípios, fechou, no início de junho, o serviço de neurocirurgia devido ao atraso de repasses desde 2014 (que chegaram a cerca de R$ 3,7 milhões).
- Na Santa Casa de Porto Alegre, 77 leitos serão fechados nos próximos meses e 41 já deixaram de funcionar há cerca de duas semanas como uma medida emergencial para reduzir prejuízos.

quarta-feira, 8 de julho de 2015

CRISE NA SAÚDE



ZERO HORA 08 de julho de 2015 | N° 18218


EDITORIAIS



A precariedade da estrutura de saúde vem sendo agravada pela crise financeira do Estado, com as piores consequências para as populações de baixa renda. O drama do momento é a falta de recursos para atendimentos básicos, que atinge não só os serviços das prefeituras, mas em especial os hospitais filantrópicos. Degrada-se um sistema de compartilhamento de responsabilidades, que há muito não conta com as contrapartidas previstas em lei. É uma situação crônica, com impasses administrativos e políticos e um confronto que se estabelece agora também na Justiça.

A decisão de prefeituras de recorrer ao Judiciário é o mais recente e dramático episódio de um desentendimento antigo e que por isso mesmo não pode ser creditado apenas às limitações do governo Sartori. É direito dos municípios a cobrança, via judicial, de repasses atrasados pelo Estado, que comprometem o atendimento às populações. Mas chega-se assim a um impasse que terá de ser resolvido pelo bom senso, com a contribuição do próprio Judiciário. A grande interrogação, nessas circunstâncias, é esta: como estabelecer prioridades em meio a tantos conflitos, muitos dos quais prolongados pelas ações judiciais?

O governo alega que são exatamente as deliberações do Judiciário, que garantem o pagamento a servidores de diversas categorias, as causadoras da falta de recursos para a saúde. Seria cômodo demais, para todos os envolvidos – incluindo-se os juízes –, alegar que assim se cumprem as leis. Se as urgências não forem levadas em conta, de acordo com o alcance social de cada serviço, o que irá prevalecer, a cada conflito, será a demanda de determinados grupos. A saúde pública está acima desses interesses.

terça-feira, 23 de junho de 2015

A AGONIA DOS HOSPITAIS



ZERO HORA 23 de junho de 2015 | N° 18203


EDITORIAIS



Uma perversa combinação de redução no repasse de recursos com problemas crônicos agravou abruptamente a situação dos hospitais gaúchos que atendem pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O quadro é mais preocupante no caso das instituições filantrópicas, que no Rio Grande do Sul atendem 75% dos pacientes do sistema. Como a agudização da crise ameaça a realização de milhões de procedimentos anuais, a situação precisa ser enfrentada agora, antes que os danos se disseminem por centenas de municípios gaúchos, prejudicando a saúde da população.

O SUS, que teve como um de seus principais méritos a universalização do atendimento, sofre particularmente pela falta de alocação de recursos oficiais necessários para assegurar um mínimo de eficiência nessa área. A particularidade de a gestão ser tripartite, com responsabilidades financeiras que se diluem no âmbito da União, dos Estados e dos municípios, contribui para agravar o problema. O fato concreto, porém, é que o ajuste fiscal reduziu as verbas federais para a saúde pública, o Estado descontinuou repasses que já vinham em atraso desde o governo anterior, e os municípios não têm cacife para bancar o que falta.

Os dramas que essa situação provoca exigem ações imediatas. Líderes políticos e representantes das três instâncias da federação precisam se unir e encontrar saídas eficazes e imediatas. A regionalização do atendimento pode ser uma alternativa, mas não é a única. É preciso melhorar a gestão dos hospitais, pagar os servidores em dia e garantir logo um atendimento menos indigno aos pacientes.

domingo, 21 de junho de 2015

A FALTA DE REPASSES FAZ MUNICÍPIOS INVESTIREM MAIS EM SEUS HOSPITAIS



ZERO HORA 21 de junho de 2015 | N° 18201


SAÚDE TERMINAL. Municípios investem mais do que a lei exige

A falta de repasses estaduais e federais vem forçando os municípios a investirem cada vez mais em seus hospitais. Segundo dados do Tribunal de Contas do Estado (TCE), dos 497 municípios gaúchos, 229 aplicaram, em 2014, entre 20% e 30% do que arrecada com impostos. Sendo que a exigência mínima legal é de 15%. Do total, oito chegaram a aplicar mais de 30% e apenas um, Porto Lucena, investiu menos (14,59%).

Conforme a Famurs, os municípios destinam cerca de R$ 80 milhões mensais ao atendimento nos hospitais públicos e filantrópicos. Responsável pela operação do Hospital Centenário, a prefeitura de São Leopoldo, no Vale do Sinos, gastou 38,8% da arrecadação de impostos em saúde. Mas nem o topo do ranking de investimentos garantiu a excelência esperada.

Na última segunda-feira, os médicos decidiram entrar em greve, alegando salários atrasados há nove meses. Antes disso, em 1º de junho, o município havia anunciado a decisão de não mais atender a pacientes de cidades vizinhas nas especialidades de neurologia e neurocirurgia. Com credencial de alta complexidade desde 2012, a Secretaria de Saúde local diz não receber da União recursos capazes de dar suporte ao atendimento dos pacientes de toda a região de abrangência, estimada em 800 mil habitantes.

A reclamação é que, enquanto São Leopoldo recebe R$ 1,9 milhão oficiais, a vizinha Novo Hamburgo tem direito a R$ 4,9 milhões. Por isso, a prefeitura leopoldense tenta renegociar os valores com a União, uma vez que o Estado já descartou aumento nos repasses.

– O Estado está absolutamente surdo conosco. Alega que não tem recursos. Não abre negociação para nada – reclama o secretário de Saúde, Júlio Galperim.

Médico de formação, o prefeito Anibal Moacir afirma que decidiu abrir mão de serviços e obras em outras áreas da administração para tentar garantir a manutenção dos serviços do hospital.

– Se tivesse orçamento sobrando, investiria mais em capina e varrição. Além disso, várias ruas e calçamentos são pedidos para mim, e não posso fazer porque estou investindo na saúde. Mas a saúde é o mais importante de tudo – sentencia.



Estado quer regionalizar atendimento

Titular da Secretaria Estadual de Saúde desde janeiro, o médico João Gabbardo planeja reformular a estrutura de saúde pública. A redistribuição do atendimento, que começará pelos hospitais do Litoral Norte e mais tarde deverá ser implementada nas outras regiões, prevê o estabelecimento de instituições regionais capazes de atender a casos graves ou complexos, com UTI, UTI Neonatal e médicos de todas as especialidades. As instituições menores, que receberão casos mais simples, também funcionarão como pontos de triagem do sistema e, em caso de necessidade, enviarão os pacientes para os hospitais regionais. Apenas procedimentos de alta complexidade, como transplantes de órgãos, seriam enviados para os grandes centros, como Porto Alegre.

– Os regionais, para atenderem às situações de maior gravidade, não podem receber os casos simples. Esses têm de ficar nos hospitais menores. Além disso, os hospitais menores têm de estar harmonizados com o atendimento dos ambulatórios, com os postos do Programa de Saúde da Família (PSF), com as Unidades Básicas de Saúde e com as UPAs, que farão o atendimento ambulatorial – explica Gabbardo.

ORÇAMENTO PASSA POR READEQUAÇÃO

O secretário diz que a distribuição do atendimento será estudada de forma individual, considerando as características de cada região. No caso do Litoral, como não há um hospital de grande porte capaz de centralizar as operações, o atendimento de alta complexidade será dividido entre Tramandaí, Capão da Canoa e Osório.

Segundo Gabbardo, o modelo irá racionalizar os recursos, evitando um grande número de internações hospitalares desnecessárias. Conforme ele, 25% das internações registradas no país são de pessoas que precisariam de algum tipo de auxílio mas que não teriam de ser hospitalizadas.

– A gente não vai fazer isso de uma hora para outra. Mas, em algum momento, a gente tem de começar – afirma Gabbardo.

O secretário ainda discorda do que os dirigentes de hospitais chamam de corte de recursos. Segundo ele, as instituições receberão em 2015 um valor maior do que o pago no ano passado. Com os números na memória, o secretário escreve em uma folha em branco a progressão dos valores repassados aos hospitais nos últimos anos – R$ 150 milhões (2010), R$ 300 milhões (2011), R$ 450 milhões (2012) e R$ 600 milhões (2013). Sobre 2014, diz que, embora o prometido pelo Estado tenha sido R$ 1,1 bilhão, na prática, as instituições embolsaram R$ 900 milhões – a diferença deve-se ao não pagamento, pelo governo, dos valores referentes a outubro e novembro, recursos para os quais, segundo ele, não há no momento a menor perspectiva de pagamento.

Empenhando no que chama de “adequação dos gastos com o disponível no orçamento”, Gabbardo diz que o aperto no orçamento da secretaria inclui gastos com passagens, telefones, diárias, treinamentos, combustíveis e consultorias.




“Tu colocas mais dinheiro no sistema, mas isso não se reverte para a população”

JOÃO GABBARDO, Secretário estadual de Saúde



ZH falou com o secretário na tarde de sexta-feira. Ele afirma que os gestores de hospitais filantrópicos reclamam injustamente do corte do incentivo para a realização de atendimentos via SUS. Segundo Gabbardo, em 2015 as instituições receberão mais recursos do que em 2014. O secretário também rebate as críticas sobre a redução no valor pago mensalmente pelo Estado pela produção das instituições. Conforme ele, o objetivo da medida é garantir o cumprimento dos contratos, evitando que recebam por serviços não executados.

Quais as causas da atual crise dos hospitais?

Neste momento, o que está aparecendo mais é uma insatisfação dos hospitais com o fato de não estarmos mantendo o incentivo (conhecido como Ihosp) para atendimentos SUS nos filantrópicos do Estado. Há uma tentativa de demonstrar que a falta deste recurso vai trazer prejuízo à população. Então, agora, qualquer coisa que acontece, dizem: “Isso aí é por falta do Ihosp, isso aí é por falta do Ihosp”. Tem hospitais que não têm nada a ver. Os casos de Capão da Canoa e Torres não têm nada a ver com a questão financeira. No entanto, estão dando como exemplo: “Está aí, mais dois hospitais que estão deixando de atender”. Isso faz parte da questão política do processo. Querem passar para a população essa ideia. Para demonstrar que esse dinheiro vai fazer falta, a Santa Casa (da Capital) chega e anuncia: vai fechar cem leitos. Qual a repercussão para a população? Que todas aquelas pessoas que se internavam na Santa Casa vão deixar de ser atendidas. Não é verdade. A PUC ofereceu substituir os atendimentos que a Santa Casa não quer fazer. Então, se um não quer fazer, outro vai fazer. Nós temos alternativas para isso.

Por que o senhor discorda dos valores pedidos pelos hospitais?


Como é que vou entender que, no Brasil inteiro, todo mundo atende pela tabela (do SUS)? Eles dizem que a tabela tem uma defasagem de 40% a 50%. A gente está passando, como incentivo, mais do que os 40% ou 50%. Muito mais. Para cada R$ 1 que eles recebem pela produção de serviços, a Secretaria da Saúde bota, em média, mais R$ 3,50. Então, se a tabela tem uma defasagem de 40% a 50%, como é que tu botas R$ 3,50, de média, e não resolve o problema? Como é que se explica? É média: para alguns, dá menos, para outros, dá mais. Tem hospitais que recebem R$ 7 para cada R$ 1 do SUS. Este é um outro problema: a Secretaria de Saúde fez convênios no passado com diferentes hospitais, com sistemáticas diferentes de valorização. Então, alguns hospitais estão recebendo mais do que deviam. Não tenho a menor dúvida disso. E tem hospitais que estão recebendo menos. Não houve um processo harmônico.

O que levou o Estado a reavaliar os valores referentes à produção repassados aos hospitais?

A forma como foram feitos os contratos no passado. Os hospitais recebiam por produção. E se mudou isso um pouco nos últimos anos. Passou-se a repassar recursos globais para os hospitais, independentemente da produção, com valores fechados. Isso faz com que muitos hospitais recebam aquele valor, mas terminem entregando menos do que deviam, para não faltar ou para sobrar dinheiro. Então, tu botas mais dinheiro no sistema, e a população continua sendo prejudicada. Porque, quando tu fazes isso, prevendo que o hospital vai fazer 300 internações em um mês e ele faz 200, tu deixaste 100 internações sem ocorrer. O cidadão vai correr de um hospital para outro, porque o primeiro está dizendo que não tem vaga e que não atende mais, porque não quer atender mais. Então, tu colocas mais dinheiro no sistema, mas isso não se reverte em favor da população. Pelo contrário: a população fica ainda mais prejudicada.

Isso vai ser revisto?

Já estamos revendo. Estamos descontando, inclusive, os valores que eles receberam e que não atenderam. Isso nunca foi feito.

O SUS E A MÁ GESTÃO


ZERO HORA 21 de junho de 2015 | N° 18201


MARCELO MONTEIRO E MAURÍCIO TONETTO

SAÚDE TERMINAL. O SUS e a má gestão, por especialistas



A medicina denomina falência múltipla de órgãos os casos de morte causados por uma sequência de fatores desencadeados sucessivamente, culminando com o colapso do organismo. Segundo agentes envolvidos com a gestão da saúde consultados por ZH, uma série de problemas do passado e do presente ameaça o futuro dos hospitais que atendem pelo SUS (leia no quadro o jogo de empurra).

Para o presidente do Sindicato Médico do RS, Paulo de Argollo Mendes, uma chaga que atinge os hospitais é a falta de profissionalismo na gestão:

– Muito frequentemente, hospitais do Interior são geridos de maneira amadorística, sem administração qualificada, e isso, naturalmente, resulta em dificuldades – aponta Mendes.

Sérgio Freitas, sócio-diretor da Falconi Consultores – empresa que já trabalhou em hospitais como o Einstein, de São Paulo –, afirma que a preocupação com o profissionalismo em administrar instituições de saúde é um fenômeno recente no Brasil.

– Isso ainda é novo. E, às vezes, instituições menores sentem muito mais isso, sofrem mais com as dificuldades que encontram.

Segundo ele, uma razão para a crise em alguns hospitais está no porte das instituições. Na opinião de Freitas, unidades com menos de 40 leitos não são viáveis economicamente – uma vez que a estrutura básica a ser mantida exige a presença de um mínimo de profissionais de diversas áreas. Nos hospitais pequenos, no entanto, sem a possibilidade de otimizar a estrutura e garantir ganhos em escala, o surgimento de dificuldades financeiras é apenas questão de tempo.

– Em vários Estados e municípios, ter um hospital era visto como um sinônimo de boa atenção em saúde. No entanto, quando você cria hospitais deste porte, eles não têm escala para sobreviver.

Neste aspecto, a situação gaúcha torna-se particularmente grave. No Estado, segundo a Secretaria de Saúde, existem 188 instituições com menos de 50 leitos, incluindo filantrópicas, privadas e municipais.

A professora Lígia Bahia, do Laboratório de Saúde Pública da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), lembra que outra falha envolvendo a gestão do SUS é a falta de planejamento para que o projeto, em teoria excelente, torne-se positivo à população.

– O SUS está no chão, infelizmente. Na realidade, ninguém fala em SUS. O governo federal cita alguns programas – Mais Médicos, Mais Especialidades –, mas o SUS não veio ao debate nas duas últimas eleições presidenciais. As questões são: quem será atendido? Quem paga? Como vai ser? Com que qualidade? Esse debate, desde que o SUS foi aprovado na Constituição, jamais foi pautado.

CONTRAPONTO

FRANCISCO FERRER, PRESIDENTE DA FEDERAÇÃO DE SANTAS CASAS E HOSPITAIS FILANTRÓPICOS. Temos trabalhado, por meio da federação, com capacitação na área de gestão hospitalar. É raríssimo o hospital onde não se encontra um profissional graduado ou em caminhos de. Não concordo que exista problema de gestão à medida que, em uma relação extremamente deficitária, ninguém faz gestão. Ninguém faz gestão em uma relação de subfinanciamento.


SAÚDE TERMINAL. HOSPITAIS AGONIZAM


Hospitais que atendem pelo SUS agonizam no Estado Carlos Macedo/Agencia RBS
ZERO HORA 21 de junho de 2015 | N° 18201


MARCELO MONTEIRO E MAURÍCIO TONETTO
Colaborou Humberto Trezzi




DÍVIDAS COM FORNECEDORES, BANCOS E FUNCIONÁRIOS COM SALÁRIOS ATRASADOS superam R$ 1,2 bilhão. Ainda há cortes nos repasses de verbas estaduais e federais. A REALIDADE DA SAÚDE PÚBLICA NO ESTADO É TERMINAL. A curto e médio prazos, instituições filantrópicas, que atendem a 75% do sistema SUS no RS, devem eliminar 4,6 milhões de procedimentos gratuitos à população

Os hospitais gaúchos que dependem de recursos oficiais para sobreviver estão agonizando. A crise nas instituições que atendem pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Estado é como uma doença terminal. Entubadas na UTI, muitas respiram por aparelhos, à espera de uma cura que parece cada vez mais distante.

Presentes em 197 dos 497 municípios gaúchos, os 245 hospitais filantrópicos enfrentam dificuldades sem precedentes. Com dívida total superior a R$ 1,2 bilhão relativa a bancos, fornecedores, tributos, salários e encargos trabalhistas, as instituições estão, uma a uma, tendo de readequar o atendimento a novos padrões orçamentários, em razão da queda dos repasses governamentais.

A partir de agora, a cada renovação de contrato com o SUS, a tendência é de redução no volume de atendimentos pactuado com o Ministério da Saúde. No curto e médio prazos, a consequência será a perda de 4,6 milhões de procedimentos anuais, incluindo internações (46,7 mil), exames (2,8 milhões) e procedimentos ambulatoriais (1,8 milhão). No longo prazo, há o risco de que muitas instituições fechem as portas.

– A agudização do quadro se deu quando este governo (Sartori) cortou o cofinanciamento e disse que nada deve. Aquilo que usávamos para pagar despesas correntes voltou a faltar – diz o presidente da Federação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos, Francisco Ferrer.

O dirigente refere-se à suspensão do repasse anual de R$ 300 milhões (R$ 25 milhões mensais) para santas casas e hospitais filantrópicos, anunciado pelo governo em janeiro e confirmado na última quarta-feira pelo secretário adjunto da Saúde, Francisco Paz. Além dos valores referentes a 2015, o Estado ainda deve às instituições R$ 132,6 milhões – que correspondem a outubro e novembro de 2014. Para completar, os recursos hoje já insuficientes tendem a ficar ainda mais escassos, com a decisão da União de reduzir o orçamento de 2015 do Ministério da Saúde em R$ 11,77 bilhões.

A crise nos hospitais não é de hoje. Segundo administradores hospitalares e gestores públicos ouvidos por ZH, a criação do SUS, em 1988, determinando a universalização do atendimento sem ampliar proporcionalmente a estrutura de saúde foi o primeiro de uma série de equívocos cometidos ao longo dos anos, uma ferida ainda aberta, que causa a hemorragia de recursos. E, pior do que isso, a precarização dos serviços. A lista de causas para a crise ainda inclui a defasagem na tabela de serviços do SUS, falhas na organização do sistema e a indisponibilidade de médicos em algumas áreas.

No país, os 1.753 hospitais filantrópicos respondem por 54% dos atendimentos via SUS. No Estado, as 245 instituições do gênero atendem a 75% dos pacientes do sistema, o que torna a dependência de recursos oficiais ainda mais dramática.

– O SUS, do ponto de vista teórico, é maravilhoso, mas, na prática, se consubstanciou uma dificuldade tremenda na operacionalização – avalia Ferrer.

CORTES NO ATENDIMENTO APÓS SILÊNCIO OFICIAL

Os efeitos da crise espalham-se em metástases Estado afora. Em abril, os hospitais deram ao Piratini prazo de 30 dias para repassar recursos, sob pena de redução de 15% a 20% nos atendimentos eletivos (quando não há urgência ou emergência). Diante do silencio oficial, a ameaça foi colocada em prática.

Em Ijuí, o Hospital de Caridade, referência em serviços de alta complexidade para cem cidades, demitiu 10% do seu quadro de 120 funcionários e encerra, nos próximos dias, um novo contrato com o SUS. Em julho, o percentual de 80% de atendimentos gerais pelo sistema cairá para 70% devido à falta de verba do Estado, à defasagem da tabela do SUS e ao não pagamento por serviços prestados em 2014 – cerca de R$ 9 milhões. Com a diminuição da equipe, a estrutura não terá condições de receber a demanda de hoje do SUS para a região – cerca de 35 mil procedimentos mensais.

– Não vemos luz no fim do túnel. Não temos a solução interna. Dependemos da sensibilidade dos governos. Imagina um colapso? Não podemos esperar isso acontecer – alerta João Leone diretor-executivo do hospital.

SEM DINHEIRO, SEM SAÚDE


Em Sobradinho, no Vale do Rio Pardo, em vez de pacientes, enfermeiros e médicos, o que se vê em uma das alas do Hospital Sebastiany são quartos vazios e colchões espalhados pelo corredor. A instituição fechou 30 leitos do SUS por sete dias – de 13 a 19 de junho. Na última sexta, o Estado fez um apelo prometendo novas negociações sobre os pedidos do hospital, que sofre com a falta de repasses. Os últimos dois anos foram de contenção de gastos e mais de 20 demissões – quatro somente neste mês. Cansado de esperar pela correção da tabela do SUS, o gerente do hospital, Júnior Ycastro, estuda uma fusão com uma instituição filantrópica da cidade vizinha de Segredo.

– Estamos buscando recursos só para manter a estrutura, e isso é frustrante. Se eu pensar a médio e longo prazos, talvez nem tenhamos hospital aqui – lamenta o gerente do Sebastiany.

A falta de instituições, de leitos e atendimento hoje já faz uma multidão sair de sua cidade todo mês em busca de tratamento com especialista.

A cada 30 dias, 192 mil pacientes – equivalente a uma cidade como Passo Fundo – transitam atrás de atendimento de média e alta complexidade em outros municípios. A conclusão, que consta em levantamento da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), é que um dos principais problemas do atual sistema de saúde pública do é a má distribuição dos recursos e das estruturas de atendimento.

No último dia 8, no lançamento do edital de licitação para a construção de 1.052 leitos na Região Metropolitana, o secretário estadual de Saúde, João Gabbardo, anunciou a intenção de expandir e qualificar os leitos, de forma racional, regionalizando o atendimento de média e alta complexidades, o que, segundo ele, garantiria melhores resultados aos pacientes que buscam a rede pública:

– Sem a descentralização, vamos afogar cada vez mais os grandes centros – afirmou.

Conforme pesquisa da Famurs, que compilou dados fornecidos de 133 prefeituras, Porto Alegre é a cidade que mais recebe pacientes: em média, 53 mil por mês. Outros municípios, juntos, recebem mensalmente mais de 139 mil pessoas. A principal razão para o deslocamento é a dificuldade de acesso a consultas, exames e cirurgias de alta e média complexidade, problema enfrentado por 98,5% das cidades – as maiores deficiências estão nas áreas de traumatologia, urologia, oftalmologia, cardiologia, ortopedia e neurologia.

Por isso, o presidente da Famurs, Seger Menegaz, considera correta a ideia de descentralização proposta pelo governo:

– O sistema de regulação do Estado precisa ser reavaliado. Temos de identificar bem isso para saber onde investir, em vez de ficarmos transportando toda essa gente. Temos de investir em hospitais microrregionais de determinadas especialidades.

Em todo o Estado, a estimativa é de que, juntos, os 497 municípios contabilizem cerca de 250 mil exames, consultas e cirurgias reprimidos ou não realizados por falta de recursos e estrutura.











sábado, 13 de junho de 2015

PACIENTES, CURAI-VOS



ZERO HORA 13 de junho de 2015 | N° 18192


ABIGAIL ZUGER, THE NEW YORK TIMES

TRATAMENTO DIGITAL. Propostas controvertidas de um médico americano para a medicina do futuro

Eric Topol é cardiologista do Instituto de Ciência Translacional Scripps em La Jolla, na Califórnia, nos Estados Unidos, e também é editor-chefe do site Medscape (medscape.com). Com o cargo de “professor de medicina inovadora”, ele prega o fim da medicina conforme a conhecemos e o surgimento de um tratamento rigoroso, digitalizado, preciso e economicamente viável.

Em seus dois livros – The Creative Destruction of Medicine (A Destruição Criativa da Medicina, em tradução livre) e The Patient Will See You Now (O Paciente Irá Recebê-lo) –, ele descreve os avanços da medicina na última década e todas as ferramentas desse novo mundo, como a análise do genoma, sensores de smartphone e bancos de dados gigantes.

A principal tese de Topol é a de que os velhos tempos do “quem manda é o médico” ficaram no passado. Os doutores não terão mais o controle dos dados, nem dos tratamentos ou dos lucros. Em vez disso, a humanidade finalmente terá acesso a tratamentos verdadeiramente democráticos.


- Não haverá mais a necessidade de consultas ofensivas e difíceis. Smartphones com os aplicativos e aparelhos certos substituirão com tranquilidade a análise, a explicação e a transmissão de todos os dados fisiológicos para os médicos, geralmente sem a necessidade da presença física do paciente.

- Não haverá mais hospitais. Topol prevê que o quarto de hospital do futuro será o quarto de casa, preparado para a ocasião com todos os sensores portáteis necessários e serviços dignos do hospital. Os pacientes receberão seus dados nos seus próprios aparelhos, sob o próprio controle.

- O “achismo” não será mais um problema na hora de escolher os remédios. Os padrões genéticos irão facilmente distinguir as pessoas que se beneficiam ou não de um medicamento. A seleção das drogas se tornará segura o bastante para que, sob determinadas circunstâncias, a automedicação seja possível.

- Os diagnósticos médicos serão simplificados: os médicos não terão mais dificuldades de esclarecer doenças e sintomas com inúmeros exames. Em vez disso, páginas da internet repletas de sequências de genes em todas as formas de cálculos de risco biológico e comportamental serão capazes de fornecer um diagnóstico instantâneo. O paciente poderá muito bem ser o responsável pelo diagnóstico e, então, apresentá-lo ao médico, já que todas as informações estarão gratuitamente disponíveis.

Isso tudo é possível?

Existe a possibilidade de que alguma dessas previsões venham a se concretizar. Mas é preciso pensar em certas questões.

Há o problema da privacidade. Os dados médicos não estarão mais seguros. Os dados do genoma são especialmente sensíveis, mas não existe ainda um consenso em relação a como protegê-los. À medida que as discussões prosseguem, ninguém parece disposto a armazenar seu genoma na nuvem, nem permitir que sensores eletrônicos entrem em sua corrente sanguínea nos próximos anos.

Além disso, há o argumento de que o tratamento médico consiste em muito mais do que a gestão de dados, ou mesmo das doenças. Um mundo inteiro de cuidado, aconselhamento, conversas e toque contraria a ideia do paciente como uma planilha na tela do computador.

Existe ainda a questão filosófica em torno do que todos os pacientes realmente querem para serem seus próprios médicos. Certamente, pessoas que se envolvem em seus próprios tratamentos se saem muito melhor que os distantes. Mas até que ponto as pessoas devem se envolver? Quando o envolvimento se torna um pesar? Existem muitas coisas melhores para se fazer do que ver o estado dos nossos órgãos. Às vezes, faz sentido deixar que outras pessoas façam isso por você.

terça-feira, 9 de junho de 2015

SANTAS CASAS ESTÃO SE ESFORÇANDO PARA NÃO FECHAR AS PORTAS

NOTÍCIAS UOL 09/06/201506h00
 


Edson Rogatti Especial para o UOL



Quanto vale a saúde? Para responder essa questão, é preciso abrir as contas do governo e ver o que há disponível no orçamento. A importância do setor, no entanto, não se reflete no montante destinado a atender suas necessidades. Enquanto os hospitais trabalham para se manter em funcionamento, a população sofre com o descaso dos governantes.

Nos Estados, os gestores estão fazendo cortes de até 30% na contratação de serviços de saúde, prejudicando os atendimentos, manutenção e gestão dos hospitais que atendem o SUS (Sistema Único de Saúde). E, mesmo com a declaração do ministro de que os cortes no orçamento federal não afetariam as Santas Casas e outras áreas, é sabido que os recursos não serão suficientes para encerrar o ano.

Além disso, o governo federal atrasou os repasses dos pagamentos da MAC (Média e Alta Complexidade), o que causou um efeito cascata nas contas de Estados e municípios, que também estão atrasando os pagamentos aos hospitais.

No Rio Grande do Sul, por exemplo, o atual governo ainda não conseguiu acertar o débito deixado pelo governo anterior, pagando apenas 45% da MAC no último mês, o que gerou manifestações e uma paralisação dos serviços prestados ao SUS por 90% das Santas Casas e hospitais sem fins lucrativos do Estado.

Some-se a isso a falta de reajustes nos modelos de pagamento, quer sejam pela tabela SUS, quer seja na contratualização. O número já é conhecido: para cada R$ 100 gastos pelo hospital, na média nacional, o SUS paga apenas R$ 65. Essa defasagem é uma das principais causas para a dívida global de aproximadamente R$ 17 bilhões, acumulada por Santas Casas e hospitais sem fins lucrativos que atendem o SUS. Esse montante refere-se a bancos, fornecedores e dívidas tributárias.

Já na contratualização, os hospitais não têm segurança da continuidade dos contratos e não há a previsão legal de uma cláusula que garanta a regularidade dos pagamentos devidos e reajuste anual, como já é exigido, inclusive, nos contratos entre planos de saúde e prestadores de serviço.

Até 2005, inexistia contrato ou convênio formal assinado entre os gestores e prestadores de serviços ao SUS. Para estimular a formalização jurídica da contratação de serviços entre os hospitais e gestores, o Ministério da Saúde criou o IAC (Incentivo à Contratuaização), que deveria incrementar, de forma gradativa, os repasses aos hospitais contratualizados.

Contudo, nem todos conseguiram se contratualizar e receber 100% do incentivo antes que o governo, com o orçamento exaurido, mudasse sua política e frustrasse as expectativas dos prestadores de serviço. Há que se destacar, ainda, que muitos gestores têm retido os repasses desse incentivo sob as mais variadas alegações, aplicando um "calote" nos prestadores de serviços já debilitados financeiramente.

População penalizada

De tudo já se tentou: linha de crédito via BNDES, mas os juros cobrados não facilitaram a vida dos hospitais; Prosus, um programa de fortalecimento das entidades privadas filantrópicas e das entidades sem fins lucrativos que atuam na área de saúde, refinanciando os débitos, mas o prazo para adesão foi muito curto e a burocracia muito grande para ser atendida a tempo. Nenhumas dessas soluções paliativas, incluindo os incentivos dados pelo Ministério da Saúde, puderam resolver o problema definitivamente.

Chegamos a um ponto onde não apenas os hospitais são impactados com a falta de custeio e incentivo financeiro. A população também está sendo penalizada. O Setor Filantrópico de Saúde responde por cerca de 51% das internações realizadas pelo SUS, 60% dos tratamentos de câncer e transplantes, além de serem a única unidade de saúde na maioria dos municípios com menos de 30 mil habitantes. E, mesmo com essa crise, ainda é um dos poucos serviços de saúde cujos postos de trabalho foram mantidos, assegurando o emprego de milhares de profissionais.

Mas, sem o repasse necessário, Santas Casas e hospitais sem fins lucrativos já estão operando acima de sua capacidade e, ao contrário do que se pode pensar, não estão atendendo mais por falta de condições estruturais. Todos os dias novos leitos são fechados por falta de recurso, deixando de atender a sociedade. Muitas estão se esforçando para não fechar as portas, porque têm uma missão histórica a cumprir: atender os mais necessitados. Mas, sem a atenção dos governantes, a assistência torna-se um fardo.

Por esse motivo, a CMB (Confederação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos), em parceria com suas federações estaduais e com os 50 maiores hospitais filantrópicos do país, lançou o Movimento Nacional das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos no SUS, tendo como base a campanha "Acesso à Saúde - Meu Direito é um Dever do Governo".

A iniciativa pretende esclarecer à sociedade sobre a situação de subfinanciamento do SUS e suas consequências à população, prestadores de serviços e profissionais. A ideia é expor a realidades da assistência desenvolvida em todas as regiões do país, incluindo o iminente colapso dos hospitais beneficentes e os graves efeitos aos SUS.

O objetivo é conscientizar e mobilizar a sociedade e, se possível, os governos e gestores, para garantir que medidas urgentes sejam tomadas em prol da saúde. Antes que não haja mais remédio.

sexta-feira, 5 de junho de 2015

A SAÍDA PELA EDUCAÇÃO



ZERO HORA 05 de junho de 2015 | N° 18184


EDITORIAIS




Com cerca de 6 milhões de inscritos, encerram-se hoje as inscrições para o Enem 2015, que abre aos estudantes brasileiros as portas da educação superior em mais de uma centena de instituições públicas, além de facilitar o acesso a programas como o Universidade para Todos (Prouni), o Ciências sem Fronteiras e o ingresso em vagas gratuitas de cursos técnicos oferecidos pelo Sistema de Seleção Unificada da Educação Profissional e Tecnológica (Sisutec). Maiores de 18 anos podem ainda obter a certificação do Ensino Médio por meio do Enem. Trata-se, portanto, de um dos maiores exames de avaliação do mundo, com perspectivas democráticas de acesso à educação superior para milhões de jovens que até há pouco tempo não tinham a mínima possibilidade de prosseguir nos estudos.

No momento em que o país atravessa mais uma crise econômica, com aumento crescente do desemprego, a qualificação pela educação é uma saída possível, que precisa ser bem administrada pelo poder público e bem aproveitada pelos candidatos. Em manifestação nesta semana durante debate na sede da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em Paris, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, reiterou que, em pleno ajuste fiscal, o governo federal continua determinado a garantir educação de qualidade. E reconheceu que as vinculações constitucionais contribuíram para preservar repasses.

Ainda assim, até mesmo alguns dos atrativos do Enem, como os programas aos quais facilita acesso, foram atingidos. Dificuldades econômicas momentâneas não podem prejudicar a busca por educação de qualidade, num processo em que sistemas de avaliação como o Enem são fundamentais.

quarta-feira, 3 de junho de 2015

A VIDA DO BRASILEIRO EM NÚMEROS



ZERO HORA 03 de junho de 2015 | N° 18182


SAÚDE - DO CINTO DE SEGURANÇA AO MASCOTE



MENOS VISITAS AO DENTISTA do que deveria, mais cachorros do que crianças e mais mulheres do que homens indo ao médico. Pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística aponta dados sobre diversos fatores que influenciam a saúdeO Brasil é o país que mais tem dentistas no mundo – são 260 mil –, mas 55,6% dos brasileiros não frequentam o consultório de um profissional anualmente – a recomendação é que as visitam sejam semestrais. O uso de escova de dente, pasta e fio dental também deixa a desejar: apenas 53% da população utiliza os todos os três artigos de higiene.

Os dados são da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013, divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O estudo analisou fatores que podem influenciar a saúde dos brasileiros – desde o uso do cinto de segurança até o convívio com animais de estimação.

Segundo o IBGE, 89,1% dos brasileiros escovam os dentes ao menos duas vezes ao dia, com percentuais maiores entre mulheres (91,5%), brancos (90,3%), formados no nível superior (97,7%) e na faixa etária de 18 a 29 anos (94,9%). Além disso, mais da metade dos brasileiros não troca as escovas de dente com menos de três meses de uso.

A PNS revelou ainda que, entre as pessoas com 18 anos ou mais, 11% perderam todos os dentes. Entre os brasileiros que estão acima dos 60 anos, o índice é de 41,5%. Ainda assim, a maior parte considera a saúde bucal ótima ou muito boa (67,4%). Os percentuais são maiores nas regiões Sudeste e Sul, com 72,2%, e cai para 58,8% no Nordeste.

Os números não têm comparação, uma vez que se trata da primeira edição da PNS. A pesquisa baseia-se em questionários aplicados em 6.069 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e em 49.130 domicílios de todas as unidades da federação. As informações servem para a formulação de políticas públicas de promoção, vigilância e atenção à saúde do Sistema Único de Saúde.

Veja, ao lado, outros dados sobre a saúde dos brasileiros apontados pelo IBGE.





Resfriado que derruba


O mal-estar provocado por gripes e resfriados é o principal motivo alegado pelos brasileiros para se ausentar do trabalho ou nos estudos - 17,8%

O segundo são as dores nas costas, problemas no pescoço ou na nuca, apontados por 10,5% da população.

Em terceiro lugar estão as dores nos braços ou nas mãos, artrites, reumatismos e a Lesão por Esforço Repetitivo (LER), com 5,5% das respostas.

Empatadas, também em terceiro lugar, estão as lesões provocadas por acidentes ou por agressões ou violência de qualquer gênero, com o mesmo percentual.




Cuidado feminino


As mulheres brasileiras vão mais ao médico do que os homens. Segundo o IBGE, 71,2% dos entrevistados haviam se consultado pelo menos uma vez nos 12 meses anteriores à entrevista.

Entre as mulheres, o índice foi de 78%, contra 63,9% dos homens.

Elas também são mais aplicadas nos cuidados com os dentes: 47,3% das brasileiras disseram terem ido ao dentista uma vez nos 12 meses anteriores, ante 41,3% dos homens. A diferença também aparece na higiene bucal diária: 91,5% do público feminino pesquisado respondeu que escova os dentes duas vezes ao dia, ao passo que a taxa foi de 86,5% no masculino.
















Disparidade em acesso aos planos de saúde



Os brasileiros que declararam possuir planos de saúde correspondiam a 27,9% da população em 2013. Ainda que quase um terço da população tenha acesso ao serviço, pago principalmente pelos empregadores, há uma grande disparidade entre as grandes regiões do país. Embora uma parcela considerável da população disponha de plano, a maior parte dos brasileiros procura postos de saúde para um primeiro atendimento médico. De acordo com o IBGE, 47,9% buscam unidades básicas de saúde. Clínicas particulares são a opção da segunda maior parcela, de 20,6% da população.








Mais cães do que crianças


A população de cachorros em domicílios brasileiros supera em mais de duas vezes a de gatos. No Brasil, há hoje 52,2 milhões de cães e 22,1 milhões de gatos criados em casa.

O país tem mais cachorros do que crianças, já que, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), também de 2013, o Brasil tem 44,9 milhões de crianças de um a 14 anos. Os cães estão presentes em 28,9 milhões de residências, o que, em termos percentuais, equivale a 44,3% dos domicílios do país – e muitos brasileiros criam mais de um animal. A presença de cachorros é mais frequente em residências rurais (65%). Nos lares em área urbana, o percentual cai para 41%.



Sem cinto de segurança

Mais de 20% dos brasileiros afirmaram não usar cinto de segurança quando sentam no banco da frente de carros, vans ou táxis. Segundo a PNS, 79,4% da população sempre usa o equipamento no banco da frente.

A região brasileira em que há mais registro do uso do cinto de segurança no banco da frente é a Sudeste, com 86,5%, seguida pela Região Sul (86,2%). No Nordeste, o índice cai para 66%. Se no banco da frente o cinto não é usado por um em cada cinco brasileiros, no banco de trás, 50,2% afirma deixar de lado o equipamento.




sexta-feira, 29 de maio de 2015

PACIENTES MORREM À ESPERA DE VAGAS EM UTI PELO BRASIL

G1 BOM DIA BRASIL, Edição do dia 29/05/2015


Pacientes de urgência morrem à espera de vagas em UTI pelo Brasil. Bom Dia Brasil mostra drama de quem precisa de internação em Unidades de Terapia Intensiva, mas não consegue leito nem recorrendo à Justiça.




Pacientes de urgência sofrem com a falta de vagas de UTI pelo Brasil. Em alguns lugares, não adianta nem recorrer à Justiça.

Em Campo Grande, mesmo com determinação judicial, teve gente que morreu à espera de um leito. Os pacientes não podem ficar no pronto socorro por mais de 24 horas, por conta de uma decisão da Justiça. Mas a Secretaria Municipal de Saúde diz que não encontra vaga nos hospitais para todo mundo. Três pessoas morreram à espera de vagas em UTI, uma delas tinha uma liminar da Justiça.


Nas Unidades de Pronto Atendimento, tem gente sendo atendida até no chão. Também faltam respiradores. Os enfermeiros precisam se revezar no trabalho manual para manter vivos os pacientes mais graves. O governo prometeu abrir 20 novas vagas de UTI nos próximos dias, mas o déficit é de 180.

Em Goiás, só este mês, cinco pessoas morreram à espera de vagas em UTI. O Ministério Público recomendou que o estado abra mais leitos e que crie as salas de estabilização, para que o paciente fique até conseguir uma vaga de UTI. Os pacientes em estado grave têm ficado até 10 dias à espera de um leito. Duas crianças e três idosos morreram este mês na capital. As famílias estão procurando até a polícia para registrar boletim de ocorrência. A Secretaria de Saúde de Goiânia diz que está sobrecarregada pela falta de leitos de UTI no interior. Mas o estado diz que esse número é suficiente e abriu uma auditoria para avaliar o uso dessas vagas. Enquanto isso, o problema continua.

No Ceará, a Justiça obrigou o governo a abrir novos leitos. Um juiz federal determinou que os governos federal, do Ceará e as prefeituras de Fortaleza e Caucaia – na Região Metropolitana – implantem, pelo menos, 35 leitos de UTI, por ano, nos próximos quatro anos.

Quem vai fiscalizar é a Defensoria Pública da União, que entrou com a ação, depois de receber denúncias sobre pacientes que não conseguiram a internação mesmo com encaminhamento de urgência. Segundo a Defensoria, há um déficit no estado de 150 leitos de UTI. A Secretaria de Saúde de Fortaleza informou que ainda não foi comunicada oficialmente da decisão. E a Secretaria de Saúde do estado informou que vai implantar, até o fim do ano, 90 leitos de UTI.




Alexandre Garcia: 'Brasil não está em guerra, a não ser consigo mesmo'. Comentarista avalia drama dos brasileiros que dependem da saúde pública. Se precisar, pode não ter – e morrer com uma liminar na mão', dispara.






Imagina ter que recorrer à Justiça para que o Estado cumpra o que é dever constitucional dele, e é um direito também constitucional dos cidadãos, mas nem assim o serviço de saúde é prestado.



Imagine um país em guerra, com dificuldades de administrar a saúde pública. Só que o Brasil não está em guerra, a não ser consigo mesmo, como se vê o que acontece com a saúde pública, assim como a educação pública e a segurança pública.

Pessoas morrendo em filas, pacientes sendo atendidos no chão, como em um front de batalha ou em uma grande catástrofe. E não é de agora; vem piorando há muito tempo sem que os governantes consigam corrigir a incapacidade de atender a todos que precisam.

E os que mais sofrem são os que já tiveram dificuldades a vida toda, os que não têm como serem levados aos melhores hospitais, os que não podem pagar plano de saúde.

E se alguém pensa que não pode ficar pior, é bom lembrar do corte recém-anunciado de R$ 11,8 bilhões no orçamento federal da saúde. O marketing do Mais Médicos tampouco gerou efeitos que se notem, a não ser nas contas de Cuba.

É sempre necessária a medicina preventiva, sim. Mas a escola é a parte da saúde que precisa ensinar higiene e alimentação saudável. Porque se precisar de serviço público de saúde, pode não ter – e morrer com uma liminar na mão.

terça-feira, 26 de maio de 2015

A SAÚDE NEGLIGENCIADA

 

ZERO HORA 26 de maio de 2015 | N° 18174


EDITORIAL




Por mais que representantes das três instâncias da federação se esforcem em encontrar explicações, são inconcebíveis as desculpas para o fato de um elevado número de Unidades de Pronto Atendimento terem se transformado em verdadeiros elefantes brancos. Em todo o Estado, nada menos de 16 UPAs se encontram prontas, mas fechadas. Outras 15, atualmente em obras, correm o risco de seguir pelo mesmo caminho, por falta de acerto financeiro entre União, Estado e municípios. Enquanto isso, milhares de pacientes ficam sem atendimento em seus municípios, contribuindo para superlotar ainda mais as emergências de hospitais das cidades de maior porte.

Integrantes do Sistema Único de Saúde (SUS), as UPAs têm como objetivo fazer a intermediação entre as Unidades Básicas de Saúde e os hospitais, tentando aliviar um quadro de sofrimento permanente para quem precisa de auxílio médico. Por isso, ainda que a escassez de verbas oficiais seja uma realidade, não dá para entender como políticos eleitos como gestores públicos não conseguem cumprir sua parte numa área da qual depende em muito a qualidade de vida dos cidadãos. A sociedade gaúcha tem o direito de saber quem não está cumprindo a sua parte nesse caso e o que pode ser feito. Líderes políticos do Estado, particularmente os ligados aos municípios prejudicados, precisam reagir contra essa situação inaceitável, buscando providências imediatas para acabar com o impasse.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

UPA, RETRATO DO DESPERDÍCIO


ZERO HORA 25/05/2015 - 04h34min


Retratos do desperdício. UPAs fechadas no Estado poderiam atender 121,5 mil pacientes ao mês. Divergência com a União deixa fora de operação unidades prontas em 16 municípios do Estado e gera incerteza sobre o futuro de outras 15 em obras


Por: Marcelo Monteiro




Em Santa Cruz do Sul, inaguração não ocorreu por fala de garantia da verba para manuteção Foto: Fernando gomes / Agencia RBS


Impasse financeiro entre União, Estado e municípios atrasa o andamento de um projeto que poderia amenizar a carência de atendimento na saúde pública no Rio Grande do Sul. Em razão do imbróglio, 16 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), prontas para receber entre 150 e 450 pacientes ao dia, seguem fechadas.

Juntas, as estruturas têm capacidade de atender a 4.050 pessoas diariamente — em um mês, poderiam prestar serviços a 121,5 mil pacientes. A divergência também torna incerta a inauguração de outras 15 UPAs em obras, criando perspectiva de que, em pouco tempo, serão 31 unidades paradas — total de 229,5 mil atendimentos não realizados a cada mês.


As unidades ficam abertas 24 horas por dia, sete dias por semana, e podem solucionar parte das emergências que chegam à rede pública de saúde. A qualidade da parte operacional não se questiona. O problema está na gestão financeira. Municípios reclamam o não cumprimento, por parte da União, da portaria que criou as UPAs com financiamento compartilhado — 50% de verba federal, 25% estadual e 25% municipal, e gestão a cargo das prefeituras. Conforme a Federação das Associações de Municípios do RS (Famurs), o Ministério da Saúde tem repassado valores entre 20% e 30% do custo de operação, e as prefeituras têm de pagar a diferença.

Exemplo: para UPAs porte 1, União e Estado repassam média mensal de R$ 100 mil cada. O problema, diz a Famurs, é que os custos reais superam os valores estimados pelo governo, chegando a R$ 450 mil por mês. Resultado: o município acaba tendo de arcar com os R$ 250 mil que faltam — 55,5%, em vez dos 25% previstos.


A situação tem emperrado o programa. Em Alegrete, por exemplo, a prefeitura já avisou que terá dificuldades em manter a UPA, inaugurada em 29 de dezembro. Em Campo Bom, ao analisar os custos que recairiam sobre o município, o prefeito Faisal Karam desistiu da construção da unidade. Em alguns casos, o atraso da inauguração se deve à espera pela compra dos equipamentos, cuja verba já foi garantida por União e Estado. Mas os prefeitos não garantem que, depois de receber o material, irão abrir as UPAs devido à incerteza sobre poder bancar os custos.


Ministério rejeita alternativas

Das 58 unidades previstas para o Estado, 13 estão em operação, uma delas em Porto Alegre. Outras 15 estão em construção, enquanto 14 — quatro na Capital — encontram-se na fase de projeto. Das 16 UPAs prontas e fora de operação, apenas uma, a de Bento Gonçalves, tem previsão de abertura: até 15 de junho. Ainda assim, contrariando a norma de servir à população das respectivas microrregiões.

— Começará atendendo a população de Bento. Mas, naturalmente, seremos sensíveis a situações de urgência — afirma o coordenador médico da Secretaria Municipal de Saúde, Marco Antonio Hebert.

Segundo o presidente da Famurs e prefeito de Tapejara, Seger Menegaz, entre prefeitos de cidades com UPA pronta, em obra ou prevista, reina o pessimismo:

— Quem tem projeto não quer construir. Quem está com obra não quer finalizar. Quem concluiu não quer inaugurar. E quem inaugurou corre o risco de ter de fechar.

No último dia 14, prefeitos e parlamentares do RS participaram de audiência com o ministro da Saúde, Arthur Chioro, em Brasília. A comitiva propôs ao ministério que autorizasse redução do horário de atendimento das unidades ou que doasse as estruturas físicas para os municípios utilizarem de acordo com as próprias necessidades. As duas propostas foram rejeitadas.

Em nota, o ministério afirma que "não há previsão para revisão imediata" dos valores repassados pela União e ressalta que serão aplicados R$ 7,4 milhões (R$ 4 milhões federais e R$ 3,4 milhões do Estado) para compra de equipamentos em nove UPAs no RS.

A Secretaria Estadual de Saúde não menciona possibilidade de aumento de repasses e também demonstra-se contrária às propostas de mudança na operação da UPAs.



Parceria privada equacionou gestão

Em Venâncio Aires, Maria Helena comemora rapidez no atendimento (Foto: Fernando Gomes)

Com sintomas de desidratação, a dona de casa Maria Helena de Oliveira, 59 anos, procurou a UPA de Venâncio Aires, no Vale do Rio Pardo, na manhã da quarta-feira passada. Mesmo não sendo caso de urgência ou emergência, em menos de 15 minutos ela já estava sob os cuidados da equipe médica:

— Depois que colocaram isto aqui (UPA), a gente nunca fica esperando muito tempo. No plantão do hospital, a gente vinha cedo e ficava até o meio-dia.

A construção do prédio, com 1,2 mil metros quadrados, custou mais de R$ 1,6 milhão. Inaugurada em junho de 2014, a UPA de Venâncio Aires tem capacidade de realizar até 150 atendimentos diários. Com 74 funcionários e 24 médicos, recebe cerca de 130 pacientes por dia — em média, 80% são adultos, e 20% crianças.

Com um custeio mensal de R$ 430 mil, a unidade recebe R$ 170 mil (39,6%) do Ministério da Saúde e R$ 135 mil (31,4%) do governo do Estado. Assim, a prefeitura arca com R$ 125 mil mensais (29%), valor um pouco maior do que o previsto na portaria que deu origem às UPAs.

Segundo o prefeito Airton Artus, a entrega da gestão da unidade ao Hospital São Sebastião Mártir otimizou o uso das duas estruturas físicas, eliminando custos adicionais como alguns exames solicitados pelos médicos da UPA e realizados pela instituição.

— Para injetar recursos na saúde, todo sacrifício de controlar os gastos em outras áreas é válido — garante o prefeito.

A agricultora Mariza Wazlawovsky, 41 anos, também está satisfeita com o atendimento recebido na UPA. Antes de levar à unidade, na quarta-feira, a pequena Kauani, três anos, com 39 graus de febre, a trabalhadora rural já havia ido ao local, com o marido.

— A gente espera menos aqui. O atendimento é rápido e muito bom — elogia.

Unidades prontas não têm perspectiva

Com chaves na mão, secretário Hermany diz não ter como abrir UPA de Santa Cruz do Sul (Foto: Fernando Gomes)

Pouco mais de 30 quilômetros separam a UPA de Venâncio Aires, exemplo bem-sucedido de implantação do modelo, da unidade de Santa Cruz do Sul. Com prédio pronto desde agosto de 2014, a prefeitura aguarda recursos para comprar equipamentos.

Segundo o secretário municipal de Saúde, Henrique Hermany, a União já acenou com repasse dos cerca de R$ 700 mil que faltam para deixar a estrutura apta a receber pacientes. O que preocupa, porém, são os custos operacionais, que incluem contratação de médicos, enfermeiros e funcionários, em montante estimado entre R$ 500 mil a R$ 600 mil mensais.

Segundo Hermany, com repasses de R$ 135 mil do Estado e R$ 170 mil da União, restaria ao município saldo de pelo menos R$ 200 mil a ser pago mensalmente. Com isso, não há, ao menos nas condições atuais, a perspectiva de abertura da UPA.

— Como o município vai ser irresponsável de abrir uma coisa que não terá como manter? — questiona Hermany.

Posição semelhante tem o prefeito de Santo Ângelo, Valdir Andres, que deixou a presidência da Famurs no ano passado. A UPA do município, na região das Missões, chegou a ser inaugurada em dezembro de 2012, mas, por problemas na construção, teve de passar por reforma, concluída em agosto de 2014. Por falta de recursos, a estrutura segue fechada.

— Para abrir, precisamos de R$ 500 mil por mês. Santo Ângelo não tem nem metade disso — explica o chefe do Executivo.

— O governo acena com uma balinha, adoça a boca do prefeito, depois larga o neném para ele e diz: "Toma que o filho é teu". Quem criou esse programa foi alguém de Brasília, que não conhece a situação dos municípios — completa Andres.

Em Caxias do Sul, na Serra, após garantir junto à União recursos que faltavam para compra de equipamentos, a prefeitura buscará o aumento dos repasses de custeio, o que, segundo a secretária de Saúde, Dilma Tessari, só será tratado depois que o prédio estiver apto a receber pacientes:

— Teremos de fazer outro pleito, em outro momento. Temos de dar um passo de cada vez.