quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

QUATRO ANOS A ESPERA DE CONSULTA

ZERO HORA 23 de janeiro de 2014 | N° 17682

HUMBERTO TREZZI

LENTIDÃO NO SUS

Professora da Capital é surpreendida por correspondência informando o agendamento com um ortopedista, solicitado em 2010



Professora de piano e acordeão, Ione Gutierrez, 70 anos, não conseguia atendimento médico e recorreu até a sessões espíritas para aliviar uma dor na coluna. Foi surpreendida, na semana passada, por uma carta na caixa postal. Um documento da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Porto Alegre a avisava para comparecer às 15h de 20 de janeiro no Hospital Independência. Indignada, Ione não foi e postou no Facebook o motivo de sua ira: solicitara a consulta em 8 de fevereiro de 2010.

– Graças a Deus, estou bem. Seria de chorar se não estivesse. Se fosse questão de vida ou morte, eu teria morrido – desabafa.

Moradora da Vila Floresta, zona norte da Capital, Ione sofre de dores crônicas na coluna, possivelmente derivadas da atividade musical (inclinada sobre o teclado ou com a “cordeona” pendurada a tiracolo). Chegou a fazer cirurgia de hérnia de disco, há duas décadas, mas o problema continuou. Em uma das crises, compareceu ao posto de saúde do Grupo Hospitalar Conceição (GHC) na Rua Conselheiro D’Avila, perto de casa. Foi atendida pela médica da família Miriam Trahtman, que lhe recomendou consultar um especialista.

Ao receber a correspondência da prefeitura, quase caiu para trás. Fotografou a autorização de 2014, juntou a cópia do encaminhamento feito pela médica em 2010 e publicou os dois documentos na rede social.

– Agora confirmei que muitos no Brasil recebem confirmação de consulta após morrerem – constata.

Ione só não reclama em voz mais alta porque as dores não têm aparecido. Graças a uma cirurgia espiritual, acredita ela, adepta dessa crença.

A SMS informa que o pedido para consulta ortopédica feito pela professora deu entrada no sistema informatizado Aghos apenas em 16 de junho de 2012 e reconhece que há congestionamento na espera por essa especialidade. Antes dessa data, não há registro do pedido da paciente.

Já o GHC admite que o pedido de Ione foi feito em 2010 e ressalta que isso foi antes da existência do sistema informatizado. O que funcionava era a discagem telefônica incessante.

– Os funcionários do posto tentaram, durante semanas, marcar a consulta na Central de Consultas administrada pela prefeitura, mas não conseguiram. Acreditamos que, por excesso de demanda, não se conseguia contato – diz o assessor de comunicação social do GHC, Alexandre Costa.

Por falta de atendimento ao telefone ou de médico, Ione esperou quatro anos e desistiu daquele que, ironiza, “é tido como o melhor sistema de saúde do mundo”. Avisou, no posto, que dispensaria a consulta agendada e cogita, agora, pagar para um médico particular se as dores voltarem.

– Isso nem tem explicação. É brincadeira de mau gosto que fazem com a gente – afirma Ione.




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