terça-feira, 16 de outubro de 2012

HOSPITAL EM ESTADO DE EMERGÊNCIA

 
ZERO HORA 16 de outubro de 2012 | N° 17224

SUPERLOTAÇÃO NO CLÍNICAS. Na ala para adultos, 160 pessoas estavam internadas no começo da noite de ontem em um espaço destinado para 49 leitos

LETÍCIA COSTA


O espaço entre as macas é mínimo, até mesmo inexistente. Essa situação se repetiu na volta do feriadão na emergência do Hospital de Cínicas em Porto Alegre (HCPA), onde o número de pacientes é superior ao triplo da capacidade de atendimento.

Oproblema não é novo, mas se agravou ontem durante todo dia. Sem nenhuma doença típica que tenha tomado conta dos gaúchos, a única explicação plausível para o médico Gerson Martins Pereira, que ontem trabalhava na unidade, é o costume das pessoas adiarem a busca por atendimento e por uma solução, acumulando enfermos em plena segunda-feira pós-feriado.

Ontem, aproximadamente às 19h, o caos estava por toda parte, desde a entrada no setor de emergência, onde os pacientes ficam em cadeiras, até a parte mais crítica, área em que está montada uma espécie de Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

Na ala adulta, 160 pessoas estavam internadas em um espaço destinado para 49 leitos. Na emergência pediátrica, os nove leitos eram ocupados por 13 crianças. Fora isso, havia cerca de 50 pessoas que ainda aguardavam atendimento médico.

– Os casos não graves chegam a esperar 12 horas, ou até mais. Todos pacientes são avaliados e atendidos conforme o risco, que é quantificado pela triagem. Por isso, alguns precisam esperar muito – explica Pereira.

Com oito médicos para atender todo esse contingente com as mais variadas doenças, acaba que os pacientes sofrem não só com a dor e a espera para o primeiro atendimento, mas também com a demora no tratamento. A supervisora de enfermagem do Hospital de Clínicas, Claudia Beatriz Nery, admite que muitas pessoas não recebem o conforto adequado em decorrência da superlotação.

A procura de quem vem de outros municípios

Moacir Diogo, 40 anos, é o reflexo da desordem causada pela grande quantidade de pessoas em busca de uma solução para o problema. Depois de ficar três dias internados em um hospital de Canoas, na Região Metropolitana, ele procurou o HCPA crente de que iria ter um atendimento melhor.

Aposentado aos 33 anos, Diogo acumula um histórico de cinco infartos e ontem tinha o diagnóstico de água no pulmão. Desde sábado em uma cadeira de rodas, ele teve o “conforto” retirado e foi colocado em uma cadeira de plástico, com um cobertor.

– Peguei minhas coisas e disse que queria ir embora, mas não me deixaram ir. Faço aniversário em 23 de dezembro, se sair daqui de dentro até lá estou feliz – diz.

A vinda de pacientes de municípios do Interior e da Região Metropolitana agrava a situação.

– A população chega aqui em um estágio de esgotamento, pois já foi em outros lugares e não conseguiu o atendimento – comenta o médico Gerson Martins Pereira.


Escassez de leitos agrava os problemas da unidade

Além do tradicional problema de que muitas pessoas que buscam as emergências não se encaixam em casos adequados de atendimento, há também a escassez de leitos para que os pacientes graves sejam transferidos das emergências.

– Todo hospital está lotado. Na medida em que liberam os leitos, as pessoas vão subindo para os quartos – afirma a supervisora de enfermagem.

As condições das emergências, normalmente superlotadas, estão em debate no Fórum Nacional de Urgência e Emergência, realizado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) este ano em Porto Alegre. Entre ontem e hoje, a sede do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers) é palco para discussões sobre a causa e a possível solução do problema.

Para o presidente do Cremers, Rogério Wolf de Aguiar, o sistema de saúde público encontra-se em estado crítico.

– O que aparece é a superlotação das emergências, mas elas são reflexo de um congestionamento de pacientes que não tiveram atendimento suficiente em pronto atendimentos e não conseguem sair porque faltam leitos de internação – avalia.

 Cartilha aos pacientes

O QUE A EMERGÊNCIA ATENDE - Dor no peito/infarto, derrame cerebral, dor abdominal com febre, hemorragia digestiva, falta de ar aguda, neoplasias (pacientes com câncer atendidos no HCPA que sofrem intercorrências), perda de consciência, alteração de sinais vitais (pressão excessivamente alta ou baixa, batimentos cardíacos alterados).

 O QUE A EMERGÊNCIA NÃO ATENDE

- Oftalmologia (problemas nos olhos), otorrinolaringologia (dor de ouvido, dor de garganta), psiquiatria (transtornos mentais, sofrimento psíquico, depressão, risco de suicídio, surtos), traumato-ortopedia (tiros e facadas, fraturas e entorses, acidentes de trânsito...), intoxicações (alcoolismo, drogadição, ingestão excessiva de medicamentos, consumo de produtos de limpeza), picadas de animais peçonhentos, acidentes em geral, constipação, dor de dente, dores musculares, dores crônicas (aquela que a pessoa tem há mais de seis meses), gripes e resfriados sem complicações.

 - Na Emergência também não são aplicadas vacinas, não são fornecidos atestados ou receitas, não são marcadas consultas com especialistas a partir de encaminhamentos de postos de saúde, não é atendido o paciente que faltou a uma consulta no ambulatório do HCPA e quer suprir esta falta.







2 comentários:

  1. Comentário de Wilson Pardi Junior 17 de Outubro de 2012 04:17 via face:

    Fui testemunha ocular da superlotação do Hospital de Clínicas!

    Estive em Porto Alegre há quatro meses atrás e a minha irmã quase faleceu devido a uma combinação perigosa de altas taxas de colesterol E diabetes!

    Como ela é enfermeira e estava a trabalho quando sentiu-se extremamente mal, foi internada às pressas no setor de UTI do Hospital de Clínicas onde ficou lá por uma semana aproximadamente.

    Passei quase uma tarde lá com ela e lembro-me bem que comentei com o(a)s médico(a)s que eu me sentia como se estivesse participando da gravção de um episódio da série de TV americana E.R. ("Emergency Room" - Sala de Emergência) tamanha era a densidade de pessoas internadas/metro quadrado!

    E realmente, todo(a)s os médico(a)s e enfermeiras com que eu pude conversar, disseram-me que, a grande causa da superlotação em hospitais de Porto Alegre é devido a falta de hospitais, médicos e/ou equipamentos hospitalares nas cidades do interior do estado.

    Aliás, não posso deixar de comentar aqui que o(a)s médico(a)s e enfermeiro(a)s que trabalham na UTI do Hospital de Clínicas de Porto Alegre são verdadeiros HERÓIS, pois apesar da falta de vários recursos e INÚMEROS problemas, SALVAM vidas de pessoas TODOS OS DIAS.

    ResponderExcluir
  2. Comentário de Alberto Afonso Landa Camargo 16 de Outubro de 2012 11:19 via face:

    Ao tempo em que lia esta postagem do Bengo, acabara de ler a postagem falando sobre a preocupação do MP e do judiciário com a lotação das cadeias, assim como as medidas do governo do Estado para intensificar transferências de presos com vistas a diminuir a lotação.
    Nenhuma medida, no entanto, quer do MP, quer do judiciário, quer do governo, para resolver a situação da lotação dos hospitais.

    Como se vê, MP, judiciário e governo mais preocupados com os presos do que com as pessoas de bem que morrem sem assistência nos corredores dos hospitais lotados.

    E as duas notícias publicadas no mesmo jornal, na mesma edição e no mesmo dia...

    ResponderExcluir