quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

O GRITO DOS PACIENTES


O grito dos pacientes, por Antonio Quinto Neto, médico - Zero Hora 03/02/2011

O Estado, há alguns anos, ingressou num processo de declínio de leitos, embora ainda seja o que apresenta o maior índice no país: 2,8 leitos por mil habitantes (Ministério da Saúde preconiza 2,5 a 3 leitos por mil habitantes). Ocorre que a redução se deu de forma não seletiva, e levou leitos que faltariam para as situações de emergência. O impacto mais visível se produziu nas cidades com mais serviços de saúde ofertados ao SUS, em especial Porto Alegre.

O fenômeno da superlotação tem um ciclo natural conhecido. Primeiro aparece com picos no inverno; em seguida se torna regular durante esta estação. O passo seguinte é o surgimento no verão, que é o que está acontecendo no momento. A partir deste ponto, se estabelece um modo contínuo de crise de oferta da assistência em emergência.

O jornalista Paulo Sant’Ana, por diversas vezes, efetuou apelos candentes às autoridades públicas para que aumentassem os leitos hospitalares. Lembro-me que uma das explicações dadas à época foi de que a diminuição de leitos era um fenômeno mundial, devido à redução do tempo de permanência e a utilização de tecnologias mais sofisticadas aplicadas ambulatorialmente. Num primeiro momento, confesso que acreditei. Fui à literatura especializada e constatei que a superlotação é um fenômeno universal. Dá-se principalmente pela falta de leitos para internação. O articulista, que parecia um D. Quixote gritando e lutando com os moinhos para que fossem aumentados os leitos hospitalares em Porto Alegre, estava certo.

A superlotação em serviços de emergência é angustiante para médicos, enfermeiros e demais profissionais de saúde. Os profissionais se encontram sob forte pressão. Decisões extremas são particularmente cruéis, além do aumento de incidentes – erro de medicação, erro de diagnóstico, troca de exames, troca de paciente. O uso indiscriminado de antibióticos e a higiene deficiente de profissionais de saúde e de visitantes aumentam o risco de infecção hospitalar. Assim sendo, a degradação da funcionalidade do serviço e do desempenho dos profissionais é inexorável. Para os pacientes e familiares, o funcionamento crítico dos serviços de emergência é apavorante.

A redução de leitos, no caso brasileiro, diferentemente de outros países, ocorreu menos por motivação técnica e mais por razão econômica – reclamação generalizada dos prestadores de serviços associados ao SUS quanto aos baixos valores pagos pelo Ministério da Saúde.

A superlotação das emergências não se resolverá com uma pressão imediata junto aos hospitais para aumentarem leitos. Esta crise é grave. O Ministério da Saúde precisa manifestar-se urgentemente.

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