quinta-feira, 24 de novembro de 2011

PREVENIR NA SAÚDE EXIGE CIÊNCIA

César Augusto Ames, Médico de família e comunidade, auditor do SUS - ZERO HORA 24/11/2011

Prevenir é a ação de saúde que pretende evitar danos futuros com ações realizadas no presente. A atividade preventiva na área da saúde é muito diferente da atividade curativa. Quando um paciente busca a cura ou alívio de um sofrimento, se justificam muitas atividades, em que pese eventual efeito colateral. Para a prevenção, não deveria haver dúvida de que os benefícios superam em muito os prejuízos. Muitas vezes, se oferece a prevenção como uma aura salvadora para a população e para o paciente e muitos profissionais somente veem vantagens, sem considerar os inconvenientes.

Esta visão exagerada e quase cega sobre os benefícios da prevenção é enganosa e nem sempre inocente. Em geral, carecemos de informação científica suficiente para oferecer prevenção da maneira como se oferece atualmente. Convivemos com interesses na área da indústria farmacêutica (vacinas, por exemplo), indústria tecnológica (venda de equipamentos médicos), indústria da gestão em saúde (captação de pessoas saudáveis para as seguradoras). Também há interesses profissionais variados quando se obtém prestígio ao oferecer atividades preventivas. Há interesses políticos quando a prevenção é utilizada como promessa de resolução de problemas na área da saúde (oferecer mamografias para mulheres jovens).

A sociedade está deslumbrada com os avanços científicos e técnicos da medicina, de forma que as crenças milenares de uma juventude eterna pareçam ser possíveis, ao alcance da mão, basta adotar certas medidas preventivas e determinadas condutas sancionadas como saudáveis e ideais, passíveis de imposição frente ao bem comum: a ditadura da saúde obrigatória. Isto pode gerar uma sociedade que encontra na prevenção uma justificativa científica para estabelecer normas e pautas morais de conduta, desde alimentares até sexuais. Quando os danos se ignoram e a prevenção se expande sem limites, deve-se, no mínimo, duvidar de que os prejuízos compensam os benefícios. Sempre é bom lembrar que os recursos são finitos, podendo a prevenção sem resultado efetivo transferir recursos das atividades curativas e das próprias atividades preventivas com benefícios cientificamente demonstrados.

Recentemente, uma autoridade brasileira que fazia regularmente seu check-up, com a devida e ampla divulgação através dos meios de comunicação, teve um diagnóstico de câncer feito após uma manifestação clínica (alteração da voz) e não através dos inúmeros exames realizados “preventivamente”. Aliás, o conceito de check-up, que surgiu na década de 20, está há muito tempo aprimorado, para não dizer superado. Convém, pois, ter precaução com a prevenção.

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