quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

QUEREMOS TRANSPLANTAR MAIS!

MAURÍCIO GUIDI SAUERESSIG, PROFESSOR ADJUNTO DE CIRURGIA TORÁCICA (UFRGS) – GRUPO DE TRANSPLANTE PULMONAR (HCPA)- ZERO HORA 06/12/2011

Os avanços na técnica e na imunossupressão possibilitaram que o transplante de pulmão se firmasse como uma opção de tratamento para doenças pulmonares terminais; porém, menos de 20% dos pulmões doados são aproveitáveis, e sua oferta é menor que a demanda. Estas limitações ganham maior relevância em países com acesso insuficiente aos serviços de saúde e com baixíssima taxa de doação.

O número desses procedimentos e a infraestrutura para realizá-los no Brasil estão muito aquém de países de Primeiro Mundo: em 2010, segundo a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), procedeu-se 0,3 implante de pulmão/milhão de habitantes, muito abaixo dos 5/milhão de habitantes da Espanha. Contribui para o desempenho espanhol, que é referência mundial, os seus sete centros hospitalares que oferecem esse tratamento, ou seja, um para cada 6,7 milhões de habitantes. Enquanto no Brasil existe um centro para cada 32 milhões de habitantes, isto é, somente seis hospitais capacitados, sendo que dois deles estão no Rio Grande do Sul. Todavia, esse privilégio gaúcho desmorona-se frente à persistente falta de doadores.

Faz tempo que nosso Estado deixou de ser exemplo nacional em doação. Conforme dados de 2011 (ABTO), Santa Catarina e São Paulo destacam-se, respectivamente, com 25,4 e 19,3 doadores efetivos/milhão de habitantes; contudo, nosso Estado apresenta apenas 15,1 doadores/milhão de habitantes/ano, inferior a outras regiões com menor histórico em transplantes, como Ceará e Rio Grande do Norte. Colabora para esse resultado ínfimo a alta taxa de negativa familiar, que atingiu 26,9% no Rio Grande do Sul em 2010 (ABTO); muito acima dos 17,6% de Minas Gerais.

No sentido de reverter esta realidade, é fundamental que as campanhas educativas sejam permanentes, ao contrário de seu predominante caráter esporádico. A partir do esclarecimento da população, deve-se derrubar os mitos sobre o processo de doação de órgãos, como, por exemplo, a segurança atual do diagnóstico da morte encefálica (pré-requisito para a doação) e suas diferenças da morte cardiopulmonar. Ao mesmo tempo, o poder público precisa definitivamente consolidar o transplante como um dos indicadores de qualidade do Sistema Único de Saúde, mas para esse avanço é imprescindível uma mudança de postura que passaria necessariamente pela ampliação do suporte logístico, político e financeiro dos hospitais, das equipes médicas e da Central de Transplantes do Estado, os quais se dedicam de maneira incansável a identificar, cuidar e captar doadores de órgãos. Se pudermos dessa forma devolver a “cultura da doação” ao povo gaúcho e sensibilizar nossos políticos, voltaremos a transplantar mais.

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