quinta-feira, 28 de julho de 2011

ROTINA DE DESRESPEITO

PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA - 28/07/2011


A série de reportagens que a RBS TV vem exibindo nos últimos dias sobre o caos no sistema público de saúde é revoltante pelo caráter de repetição. Tem-se a impressão de estar assistindo à reprise de reportagens dos últimos anos. São histórias de vítimas do descaso, da burocracia ou da negligência. Vidas que se perdem por falta de tratamento adequado, quadros que se agravam enquanto o atendimento não chega, esperanças que se esvaem à medida que o tempo passa.

Na reportagem de ontem foram mostrados dois casos exemplares: o do casal de Porto Xavier que perdeu o filho recém-nascido porque não havia ambulância para levá-lo a um hospital com os equipamentos adequados quando começou a apresentar problemas respiratórios. Por serem pobres, os pais tiveram de esperar por uma ambulância que só chegou quando o bebê já estava morto.

O outro caso relatado é o de um adolescente de Palmares do Sul que teve câncer no rim, fez tratamento, está aparentemente curado, mas sofre com dores nos joelhos e não consegue atendimento para saber a origem do problema. Convive com o temor de que o câncer tenha voltado. Cada dia de espera é um dia perdido para o início do tratamento, seja qual for o problema.

Têm sido comuns os casos de pacientes obrigados a viajar centenas de quilômetros em busca de vagas em UTIs, leitos em hospitais, cirurgias e tratamentos especializados. Cada um com sua história, compõem um quadro que só poderia se modificar com a ampliação dos investimentos, mas para isso não há dinheiro.

Ontem mesmo, na votação das contas de 2010 da ex-governadora Yeda Crusius, o Tribunal de Contas apontou que, em um ano, deixaram de ser aplicados R$ 700 milhões na saúde, porque o Estado simplesmente não destina os 12% da receita líquida previstos na Constituição. Como disse o procurador Geraldo da Camino, do Ministério Público de Contas, os governos sacrificam a geração atual, não investindo o que deveriam em saúde, e a futura, não aplicando o percentual previsto para a educação.

AVAL DA CORTE. TCE aprova contas de Yeda e faz alerta a Tarso. Relatório apontou gastos excessivos em publicidade de estatais em 2010

Por unanimidade, os conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE) aprovaram ontem as contas da ex-governadora Yeda Crusius relativas a 2010, último ano do mandato. A Corte, porém, destacou excessos nas despesas de estatais com publicidade: esse gasto superou em 43% a previsão orçamentária.

Além disso, os recursos extras foram liberados sem o aval da Assembleia. Apenas na CEEE, as despesas com publicidade ultrapassaram 300% do valor orçado. Os apontamentos fazem parte do relatório elaborado pelo conselheiro Marco Peixoto. Como deputado do PP, ele foi aliado de Yeda até trocar a Assembleia pelo TCE em dezembro de 2009. No relatório, ele fez 14 recomendações ao governador Tarso Genro.

Outro ponto destacado pelo TCE é a falta de estrutura da Contadoria e Auditoria-Geral do Estado (Cage), principal órgão de controle interno da administração direta e indireta, que tem a missão de identificar irregularidades.

O Ministério Público de Contas, por sua vez, defendeu a desaprovação das contas de Yeda em razão do descumprimento das previsões legais para gastos em educação e saúde. Nas duas áreas, o Estado deixou de aplicar R$ 2,1 bilhões (R$ 1,4 bilhão em educação e R$ 700 milhões em saúde) em 2010.

Ex-governadora comemorou aprovação pelo Twitter

No ano passado, ao relatar as contas de Yeda de 2009, o conselheiro Cezar Miola orientou o Estado a cumprir a regra referente à saúde. O Piratini deveria apresentar um plano para atingir a meta gradativamente. Hoje, o governo só alcança o índice porque inclui gastos com saneamento.

– No mínimo, os governantes têm de demonstrar que pretendem atender esse objetivo – disse o procurador-geral do MP de Contas, Geraldo da Camino.

O relatório de Peixoto – que também destaca o crescimento da receita, o aumento de investimentos e a correção de falhas apontadas em anos anteriores – agora segue para a Assembleia. Yeda comemorou a aprovação no Twitter: “Compartilho e agradeço todos os que me ajudaram a tratar o dinheiro público com transparência, modelarmente”, escreveu ela. E acrescentou: “Mostrarei principais pontos da auditoria e do parecer, neste que é um mundo fechado das aprovações, para equilibrar com o big brother acusatório. Viva!”

Na sessão de ontem, os conselheiros determinaram ainda multas de R$ 1,5 mil a cinco ex-gestores da Corsan (Vitor Fernando Bertini, José Luiz Costa Melo, Telmo Kirst, Jorge Luis Accorsi e Mário Rache Freitas) por violação às normas de administração financeira e orçamentária.

As recomendações - Veja alguns dos 14 alertas que o TCE fez ao governador Tarso

- Aplicar valores que a Constituição assegura para educação e saúde, desconsiderando, nesta última, gastos com saneamento.
- Promover investimentos no sistema prisional, criando novas vagas e reduzindo a superlotação.
- Exercer controle sobre os gastos com publicidade de estatais.
- Direcionar os recursos do Fundeb exclusivamente para os fins a que se destinam.
- Implementar ações que fortaleçam a Cage.
- Adequação da carteira de contratos e obrigações do Daer aos recursos orçamentários disponíveis.
- Adotar plano de reposição dos valores sacados do caixa único, cujo passivo chega a R$ 4,6 bilhões.
- Adequação do quadro de pessoal efetivo do IPE.
- Adotar um rígido acompanhamento do montante de precatórios.
- Fim dos obstáculos ao controle externo.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Não é a toa que os governantes continuam desrespeitando a lei e descumprindo obrigações referentes aos percentuais que deveriam ser investidos na saúde. Apesar do Ministério Público de Contas defender "a desaprovação das contas de Yeda em razão do descumprimento das previsões legais para gastos em educação e saúde", tendo em vista que o "Estado deixou de aplicar R$ 2,1 bilhões (R$ 1,4 bilhão em educação e R$ 700 milhões em saúde) em 2010", os conselheiros do TCE desconsideraram os fatos mostrados mostrados pelo MPC e as consequências nefastas, e até mortais, para a população, produto do puco investimento na saúde e na educação. Que sustentação legal fizerem os conselheiros do TCE, mesmo reconhecendo as ilicitudes e o abusivo gasto em publicidade, aprovarem as contas da governadora de forma unânime? Que instrumento fiscal é este aceita, tolera e estimula o desrespeito e a impunidade contra a vida humana e o futuro dos jovens? É um achaque ao povo gaúcho, à moralidade e à ilegalidade. E esta postura fiscal não é de agora a favor do governo anterior, mas se trata de uma rotina de benevolência corporativa no julgamento dos atos e contas em todos os governos. ATÉ QUANDO?

A SOLUÇÃO PODE ESTAR NESTA NOTÍCIA ABAIXO. DEPENDE DAS MOBILIZAÇÃO DA SOCIEDADE EM APOIO À AÇÃO AJUIZADA PELOS AUDITORES E SERVIDORES DO TCE.

Servidores querem barrar políticos - ZERO HORA 28/07/2011

Em campanha contra as indicações políticas ao TCE, entidades representativas de servidores da Corte defendem o ajuizamento de ação civil pública para tentar barrar uma nova articulação de deputados.

Tramita na Assembleia um projeto que determina um rodízio entre as quatro maiores bancadas da Casa na hora de escolher futuros conselheiros do TCE. O projeto é assinado por parlamentares de PT, PMDB, PDT e PP.

Em visita ao Ministério Público Estadual ontem, representantes do Centro dos Auditores Públicos Externos e da Associação dos Servidores do TCE pediram que seja ajuizada uma ação contra a iniciativa.

– Desta forma, será possível garantir a presença dos cidadãos para disputar a vaga que se abrirá com a aposentadoria do conselheiro Victor Faccioni – afirmou a presidente da associação, Ligia Zamin.

Das setes vagas do TCE, três são escolhidas pelo governador, que, para duas delas, tem de escolher entre membros da classe dos auditores substitutos e do Ministério Público de Contas. As outras quatro são de responsabilidade do Legislativo.

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