segunda-feira, 6 de agosto de 2012

BRASIL CAMPEÃO MUNDIAL EM GRIPE "A"


ZERO HORA 06 de agosto de 2012 | N° 17153

GRIPE A PELO MUNDO. Brasil está entre os campeões de mortes


MARCELO GONZATTO

Com 257 mortes provocadas pela gripe A até a semana passada, concentradas especialmente na Região Sul do país, o Brasil contabiliza uma das mais altas taxas de mortalidade do mundo neste ano em razão do H1N1

Dados preliminares indicam que o Brasil é um dos principais focos da gripe A no mundo hoje.

As 257 mortes registradas até a semana passada colocam o país entre as regiões mais afetadas no planeta pelo vírus Influenza A (H1N1) – em um patamar semelhante ao verificado no México durante o último inverno no Hemisfério Norte e superior ao registrado atualmente em nações muito mais populosas como a Índia.

Os três Estados do Sul concentram a maior parte dos óbitos provocados pela agressividade do vírus, com pelo menos 157 vítimas no Rio Grande do Sul, no Paraná e em Santa Catarina. Esse número poderá aumentar hoje, quando o Estado deve divulgar um novo boletim sobre o avanço da doença. Somente o sul do Brasil, onde vivem 27 milhões de pessoas, supera o número de mortes registradas até a última semana de julho na Índia. Lá, onde vivem 1,2 bilhão de habitantes, foram verificados 122 mortos (veja mapa).

Não há como estabelecer um ranking preciso do impacto do H1N1 no mundo, porque as notificações demoram para chegar à Organização Mundial da Saúde (OMS), os dados dos países do Hemisfério Sul são menos completos do que os do Hemisfério Norte, onde o inverno já acabou, e os padrões de vigilância epidemiológica variam bastante. Porém, as informações disponíveis fazem com que a infectologista Nancy Bellei, professora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e uma das principais especialistas em Influenza do país, sustente que o Brasil tem uma das piores situações conhecidas em relação ao H1N1 este ano.

– Os dados demoram muito para chegar aos órgãos internacionais, mas a situação mais complicada que vemos hoje é no Brasil, sobretudo no Sul. É importante lembrar que, em 2009, o Paraná já havia registrado a mais alta taxa de mortalidade do H1N1 no mundo. Claro que o clima interfere, mas isso tem de ser melhor estudado porque outros países frios não enfrentam o mesmo cenário – afirma a especialista.

Uma das razões para o Brasil padecer com a gripe A é que outras regiões do Hemisfério Sul, como Argentina, Chile, Austrália ou Nova Zelândia, estão apresentando circulação predominante de outros tipos de vírus Influenza, como o B ou o H3N2. O problema, segundo o epidemiologista gaúcho Jair Ferreira, é que o H1N1 tende a provocar mais danos em suas vítimas.

– Além de a população ser mais suscetível pelo fato de ser um vírus novo, ele também dá mostras de ser mais virulento do que outros tipos de Influenza – avalia o especialista.

Também pela avaliação de especialistas, a falta de uma política de prevenção específica para o sul do Brasil e deficiências no atendimento primário como a demora para a aplicação do antiviral Tamiflu (veja quadro) ajudam a explicar por que o país apresenta uma escalada de mortes superior a outras regiões do globo. Os demais países, como Estados Unidos, Canadá, europeus ou vizinhos como Argentina e Chile utilizam estratégias semelhantes às do Brasil – vacinação de grupos de risco e tratamento com antiviral.

Reforço na educação

Porém, Conforme Nancy, a preocupação em tomar a vacina de forma gratuita ou no setor privado é maior nesses outros países, e a cultura de atendimento está mais adiantada no tratamento precoce com o antiviral. O infectologista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Rodrigo Angerami concorda com essa avaliação:

– Acredito que reforçar as medidas educativas, não apenas junto à população, mas em relação aos profissionais da saúde quanto à importância de recomendar a vacinação anual, e incorporar o uso precoce de antiviral quando houver indicação são imprescindíveis.


ENTREVISTA. “A melhor estratégia é vacinação abrangente”. Craig Pringle, especialista em vírus


Moderador da área de virologia do Programa para Monitoramento de Doenças Emergentes (ProMED-mail) da Sociedade Internacional para Doenças Infecciosas, o especialista britânico Craig Pringle ajuda a manter a comunidade médica internacional atualizada sobre o comportamento de males como a gripe A. Em entrevista concedida por e-mail a Zero Hora, ele avalia a situação do vírus Influenza no Brasil e no mundo e as melhores estratégias para combatê-lo:

Zero Hora – O Brasil já registrou mais de 250 mortes pelo vírus H1N1. Há algum outro país que esteja apresentando situação semelhante para esse tipo de Influenza?

Craig Pringle – Não sei dizer se as mortes por A (H1N1) no Brasil são em maior número do que em qualquer outro lugar, seja em comparação com a epidemia passada no Hemisfério Norte ou com a epidemia atual no Hemisfério Sul. O número de vítimas é muito afetado pelo nível de vacinação da população, e pela recepção da vacina por diferentes grupos etários. Não conheço nenhuma evidência que indique uma mudança significativa na virulência do A (H1N1).

ZH – Que razões poderiam explicar o fato de o Brasil apresentar circulação significativa do H1N1, enquanto outros tipos de vírus predominam em países próximos como Argentina ou Chile?

Pringle – É difícil explicar por que o Brasil é afetado pelo A (H1N1), enquanto, na outra extremidade do continente, o Chile é afetado pelo A (H3N2). De qualquer maneira, evidências indicam que a atual estirpe do H3N2 parece ser menos suscetível à atual vacina do que o A (H1N1). Então, em populações menos vacinadas, o vírus predominante poderia ser o A (H1N1), enquanto em populações bastante cobertas pela vacina, o A (H3N2) poderia ser o vírus predominante provocando doença.

ZH – Quais as estratégias mais eficientes utilizadas em outros países para combater a gripe A?

Pringle – A melhor estratégia para se proteger do Influenza, independentemente do tipo antigênico (variação do vírus), é vacinação abrangente de todos os grupos de idade, não somente os jovens e os idosos. Mas isso tem sido difícil de alcançar na maioria dos países.

ZH – O Brasil vacinou grupos de risco e oferece o antiviral Tamiflu para casos com suspeita de infecção – embora em muitos casos isso não ocorra nas primeiras 48 horas. Isso é adequado para combater surtos?

Pringle – Pessoalmente, eu penso que remédios antineuramidase (como o Tamiflu), embora úteis no tratamento, não têm qualquer papel para prevenir a disseminação de infecções.



Nenhum comentário:

Postar um comentário