quinta-feira, 22 de março de 2012

DESINFORMAÇÃO EM SAÚDE MENTAL

EUGÊNIO HORACIO GREVET, PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DE PSIQUIATRIA DO RIO GRANDE DO SUL - ZERO HORA 20/03/2012

Em artigo publicado nesta seção, no dia 17 de março, intitulado “Nas mãos dos psiquiatras”, percebe-se que a forma como o tema da psiquiatria foi abordado pode gerar confusão e desinformação. A primeira confusão diz respeito às diferenças existentes entre psiquiatria e saúde mental. A psiquiatria é uma especialidade da medicina que diagnostica e trata os transtornos mentais com recursos validados cientificamente num modelo denominado biopsicossocial: medicações, psicoterapias e abordagens familiares e sociais. Já a saúde mental é o campo multidisciplinar no qual os profissionais com diversas formações técnicas trabalham com pessoas ou grupos que possuem problemas emocionais nos seus mais diferentes graus e apresentações. A frase atribuída a Franco Basaglia, “a psiquiatria é muito importante para ficar nas mãos só dos psiquiatras”, contém essa confusão. A simples mudança da palavra “psiquiatria” pela expressão “saúde mental” tornaria a frase mais pertinente e esclarecedora. Nenhum psiquiatra que conhece as fronteiras da profissão teria a ousadia de dizer que a saúde mental brasileira é uma exclusividade da psiquiatria. Porém, da mesma maneira que fazia Basaglia nos anos 1970, politicamente, tenta-se encontrar um “bode expiatório” para explicar a desassistência da saúde mental no Brasil: a psiquiatria e os psiquiatras.

A segunda confusão é quando há uma tentativa de demonizar as medicações utilizadas no tratamento dos transtornos mentais. É importante esclarecer que um dos grandes responsáveis pela possibilidade da desinstitucionalização dos doentes mentais graves foram justamente o desenvolvimento e o uso de medicações psiquiátricas. Estas permitiram que pacientes graves melhorassem de maneira significativa o seu quadro clínico, mantendo-os estabilizados por longos períodos de tempo e, assim, tornou-se possível novamente o convívio familiar e social. Ainda é oportuno mencionar que o uso de psicofármacos em crianças e adolescentes com patologias tais como esquizofrenia, autismo, transtorno bipolar, depressão, déficit de atenção, entre outras, mudou radicalmente o prognóstico clínico e social, pois permitiu que muitas famílias pudessem conviver de forma mais saudável com seus filhos e esperar um futuro melhor para essas crianças e adolescentes, quando tratadas de forma adequada.

A terceira confusão, talvez a mais grave, diz respeito à comparação da internação involuntária com má prática médica. A internação involuntária é uma modalidade de hospitalização psiquiátrica utilizada quando pacientes com riscos, para ele ou terceiros, recusam-se a receber auxílio médico. O exemplo citado pelo autor do texto, de uma família que convence um psiquiatra a internar desnecessariamente um paciente, não é devido a uma questão técnica da necessidade ou não de hospitalização psiquiátrica. É um problema em relação ao qual a família e o profissional agem de maneira inescrupulosa e, nesse caso, podem ser denunciados ao Ministério Público ou ao Cremers. Em minha opinião, esclarecidas essas confusões, ninguém de bom senso proporia retirar essa especialidade médica das mãos dos médicos psiquiatras.

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