quarta-feira, 7 de agosto de 2013

MENOS MÉDICOS



ZERO HORA 07 de agosto de 2013 | N° 17515

LETÍCIA DUARTE

Só 3,5% das vagas são preenchidas. Dos 1.323 profissionais buscados no Rio Grande do Sul, programa do governo federal conseguiu até agora só 47 candidatos


Se a primeira fase do programa Mais Médicos decepcionou ao indicar que só 10% das cidades gaúchas inscritas seriam contempladas, os resultados divulgados ontem aumentaram a frustração: só 6% delas tiveram a confirmação de que receberão profissionais. Dos 107 médicos selecionados para 35 cidades gaúchas, 47 homologaram a inscrição, reduzindo o número de beneficiadas para 22. Das 1.323 vagas abertas no Rio Grande do Sul, só 3,5% estão preenchidas até o momento.

Para tentar reverter a baixa adesão no país, com apenas 938 médicos para uma demanda de 15.460 profissionais, o Ministério da Saúde anunciou novos adiamentos no prazo de homologação e a abertura de novas rodadas de inscrição, que incluirão a possibilidade de estrangeiros preencherem vagas. Ainda assim, tudo indica que será um desafio atingir a meta. Dos 3.511 municípios inscritos no programa, 2.028 não foram escolhidos por médico algum. Deles, 782 estão no grupo de 1.557 cidades consideradas prioritárias pelo governo.

A desistência no meio do caminho de 56% dos médicos selecionados no Estado frustrou a expectativa criada em municípios como Pirapó, na fronteira com a Argentina. O anúncio de que uma médica chegaria para reforçar o quadro era a esperança de melhorar o atendimento aos 2,7 mil moradores, feito por um médico que se divide entre Pirapó e São Borja.

– Nossa realidade é de 30 quilômetros de estrada de chão e mais 30 quilômetros de estrada esburacada para chegar ao hospital, em São Luiz Gonzaga. Disseram que a médica assumiria em setembro, mas ela não validou a inscrição – lamentou o secretário da Saúde, Zilmar Simon do Canto.

Fabiane Budel, 32 anos, preferiu continuar em Santa Maria.

– Escolhi Pirapó for falta de opção, porque ao preencher a ficha não abriram os municípios que eu queria. Tentei trocar, mas não consegui – justificou a clínica geral.

Motivos semelhantes fizeram o médico Lucas Sidnei Rusczyk desistir de assumir o posto em Porto Vera Cruz:

– Queria trabalhar em Campina das Missões, onde moro, mas não abriu inscrição para cá, então desisti. O programa não compensa porque não se tem nenhum seguro trabalhista, nem 13º, nem férias, e é um benefício temporário, só por três anos.

Torcendo para que algum médico ainda queira ir para Porto Vera Cruz, a secretária da Saúde, Gláucia Milani Carmona, resumiu seu sentimento:

– Que venham os estrangeiros.

Até o final da tarde de ontem, a secretária de saúde de Tiradentes do Sul, Leila Cristina Pilger Hermes, ainda hesitava diante da informação de que receberia um médico:

– Estou surpresa, nem acreditava que pudesse acontecer tão rápido. Fomos o município sortudo, ainda mais porque uma de nossas médicas é gestante e precisou se afastar. O médico vai chegar em uma hora maravilhosa.


Prefeitos apontam fraude

Presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), José Fortunati, de Porto Alegre, reagiu com veemência ao tomar conhecimento dos resultados do programa. Apontando “clara atitude corporativista da classe médica”, classificou como “fraude” o fato de que um número considerável de inscrições foi preenchido incorretamente.

Segundo o Ministério da Saúde, dos 18.450 profissionais que fizeram a pré-inscrição no programa, 8.307 apresentaram números inválidos de registros em conselhos regionais.

– Não podemos aceitar o fato de que mais de 14 mil pessoas fraudaram as inscrições para o programa. Isso deve ser denunciado com muito vigor. Houve um boicote claro e, em nome da FNP, quero declarar que houve fraude das entidades médicas – afirmou Fortunati.

Classificando as declarações como um “destempero verbal que não é adequado ao posto”, o presidente do Sindicato Médico do RS, Paulo de Argollo Mendes, disse que “a classe médica não se rebaixaria a respondê-lo nos mesmos termos”.

– O programa foi um fracasso, mas não uma surpresa. Acredito que outros vão desistir quando se confrontarem com as condições de trabalho. Esse programa não dá direito trabalhista, nem os direitos que uma empregada doméstica teria ao assinar um contrato de trabalho. A única certeza é de que daqui a três anos tu vais estar desempregado, com uma mão na frente e outra atrás – criticou.

Diante da dificuldade de preencher as vagas do Sistema Único de Saúde, o governo federal quer permitir que médicos das Forças Armadas também possam atuar na rede pública. O assunto foi discutido ontem pela presidente Dilma Rousseff com senadores líderes da base aliada.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Apesar das críticas de fraude do representante dos prefeitos e da denúncia do representante da classe médica de que houve entraves em algumas solicitações, prejudicando o ingresso de mais médicos, o fato é que não há médicos suficientes com vontade de prestar serviços em locais distantes dos grandes centros. Tudo isto vem ao encontro da vontade estatal de trazer médicos do exterior, justamente pela falta de médicos no Brasil.

Apesar de ser leigo na área, eu comungo com a ideia de criarem Corpos de Saúde Público Federal e Estadual, com quadros de médicos, enfermeiros e assistentes da saúde, determinando vagas para todos os municípios do Brasil, funcionando num sistema de saúde integrado, ágil e comprometido na prevenção, no tratamento e na cura das doenças, em apoio à saúde municipal e sob suporte de um conjunto de hospitais públicos conveniados capacitados, mobilizados, equipados e com amplos espaços para o pronto-atendimento de assistência, urgência e emergência hospitalares.

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