quinta-feira, 8 de setembro de 2011

A INDIFERENÇA COMO POLÍTICA

LUCIO BARCELOS, MÉDICO SANITARISTA - ZERO HORA 098/09/2011

Antes de tratar do assunto que pretendo apresentar neste espaço – como vivem e sobrevivem os moradores do Hospital Psiquiátrico São Pedro –, creio ser indispensável fazer um breve comentário sobre as características atuais do sistema público de saúde remanescente. Grifo o “remanescente” porque, mantido o ritmo atual do processo de privatização, em poucos anos a parcela pública no sistema não passará de um traço. Com o agravante de que será, como já é, um traço caracterizado pela pobreza crônica e, aparentemente, incurável, produzida pelo descaso permanente e escandaloso dos governantes. O resultado, como todos sabemos, é um sistema que vive no limite da insolvência, para atender cidadãos vistos pelos governantes como de segunda ou terceira classe.

Voltando ao cerne da questão: como vivem e sobrevivem os invisíveis pacientes do São Pedro. Os moradores do São Pedro são idosos, em sua maioria não têm mais referência familiar, são pobres, muitos apresentam deficiências físicas e muitos são deficientes mentais, antes de pacientes psiquiátricos. Quem sabe de sua existência? Quem se importa com eles?

Nos últimos cem dias, passei pela experiência de ser diretor-geral daquele hospital. Não foi, digamos assim, uma experiência bem-sucedida. E isso se deu não porque a solução dos problemas do hospital seja de altos custo e complexidade, exigindo grandes tecnologias ou vultosos investimentos. Ao contrário, são problemas comezinhos, banais. São paredes úmidas e rachadas; vidros quebrados; janelas que não se fecham; fios elétricos que não comportam a instalação de condicionadores de ar; além de prédios envelhecidos e deteriorados, com escadas nas quais os pacientes, entre idosos e deficientes, caem e se ferem.

Acrescente-se a essa situação um quadro de funcionários insuficiente, envelhecido e, por excesso de carga de trabalho, adoecido. Tanto que permitiu o surgimento de um fato inusitado: a existência, desde 2009, de prestadores privados de serviço, dentro do hospital, remunerados com os benefícios que os pacientes recebem por meio da Lei Orgânica da Assistência Social (Loas). E, para completar, a direção central da Secretaria da Saúde joga estruturas administrativas para dentro da área física do hospital, com o intuito de beneficiá-las com uma gratificação de 45% (por lei devida somente a quem trata de pacientes), ocupando instalações reformadas, usurpando-as dos pacientes.

Afinal, quanto custa resolver esse problema? Custa módicos e ridículos R$ 254 mil. Uma migalha. Quanto custa contratar 240 ou 250 funcionários? Outra migalha, se compararmos com os R$ 10 bilhões que em 2010 foi o montante de desoneração, via incentivo fiscal, que o Estado deixou de recolher de impostos potenciais. Ou seja, iniciativa e vontade política são suficientes para solucionar os problemas desse hospital.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Considero a saúde como questão de ordem pública, especialmente sabendo da sua importância para tratar das dependências de drogas e os desvios e transtornos mentais, pois ambos podem levar uma pessoa ao crime. Enquanto o Estado não der valor também à saúde e seus agentes, o Brasil não sairá do caos imposto pela violência e pela criminalidade. Por este motivo, tem o meu apoio esta desabafo oportuno do Dr. Barcelos.

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