sábado, 20 de agosto de 2011

DESCASO - HOSPITAL PSIQUIÁTRICO EM CRISE

CRISE NA SAÚDE. Hospital São Pedro sob polêmica. Críticas de ex-diretor da instituição psiquiátrica são rebatidas por secretário - MARCELO GONZATTO, ZERO HORA 20/08/2011

O pedido de demissão do ex-diretor do Hospital Psiquiátrico São Pedro, Lucio Barcelos, colocou em suspeita as condições de atendimento na instituição e gerou uma crise na área da saúde. Como justificativa para a saída, formalizada ontem, foram apontados problemas como falta de funcionários e de verbas, más condições de infraestrutura da instituição e problemas administrativos sem perspectiva de solução.

As declarações do ex-diretor revoltaram o secretário estadual da Saúde, Ciro Simoni (PDT), que havia escolhido Barcelos na sua cota pessoal de nomeações para a pasta, mesmo ele tendo concorrido a vereador pelo PSol, partido que não faz parte da base do governo.

Para justificar o abandono do cargo assumido em 10 de maio, Barcelos incluiu em uma carta endereçada ao secretário da saúde a falta de respostas para deficiências como infiltrações nas paredes, umidade, falta de servidores e inconformidades administrativas, como a instalação de setores sem relação direta com saúde mental na área.

Um exemplo da situação seria o Departamento de Coordenação dos Hospitais Estaduais (DCHE) – cujos funcionários receberiam 45% a mais por “risco de vida” por trabalharem junto à instituição.

Para o antecessor de Barcelos, o psiquiatra Luiz Carlos Illafont Coronel, as críticas do médico sanitarista, que já foi secretário da Saúde da Capital, causaram surpresa.

– Em quatro anos, reformamos a área clínica, reequipamos com leitos, cobertas, instrumental. Evidente que é um hospital centenário que apenas iniciou um processo de recuperação – declarou.

Uma servidora ligada à administração, que pediu para não ser identificada, afirma que o quadro de pessoal é afetado por aposentadorias e licenças de saúde.

– As licenças ocorrem pelas condições inadequadas – diz a funcionária.


“O hospital precisa de gente”. Lucio Barcelos, ex-diretor-geral do Hospital São Pedro

Ex-secretário da Saúde da Capital, consultor do Ministério da Saúde e médico sanitarista, Lucio Barcelos estremeceu a secretaria estadual ao deixar o cargo em meio a uma saraivada de críticas à política destinada ao principal hospital psiquiátrico do Estado. Poucas horas depois de se despedir dos funcionários, no começo da tarde de ontem, Barcelos concedeu uma entrevista a ZH. Leia a seguir os principais trechos.

Zero Hora – O São Pedro tem apenas dificuldade para obter recursos ou há outros problemas?

Lucio Barcelos – Todos querem ir para dentro do hospital porque ele paga 45% de adicional no salário, por risco de vida. Nos três meses em que estive lá, o que recebi de telefonema de gente pedindo para entrar... A Coordenação dos Hospitais do Estado (DCHE) foi para lá. Eram três ou quatro pessoas no Centro Administrativo, e passou a ser órgão executivo com mais de 20 pessoas no São Pedro. A divisão de transporte está sediada lá.

ZH – E recebem 45% a mais apenas por estarem na área do São Pedro?

Barcelos – Deveria ser para quem tem trabalho específico na área de saúde mental, mas todos recebem por estarem na área do São Pedro. É até perigoso ter uma divisão de transporte lá, com veículos passando entre pacientes que caminham pela área do hospital. Também falta pessoal.

ZH – Profissionais privados recebem dos pacientes?

Barcelos – Há alguns anos, alguém teve a brilhante ideia de convidar pessoas para trabalhar lá dentro, uns 10 cuidadores, psicólogo, fisioterapeuta, manicure, podólogo, dois musicólogos. Um dia, vi eles tocando música. Achei que era de graça, depois descobri que cobram parte do benefício que todo paciente tem, de um salário mínimo mensal. Tem uma moça que faz terapia utilizando coelho, calopsita, papagaio e cachorro que ganha uns R$ 6 mil, R$ 7 mil por mês. O trabalho é ótimo, mas tinha de ser feito por funcionário público.

ZH – Por que o senhor não tomou uma providência?

Barcelos – Não tirei ninguém porque iria desassistir os pacientes. Pedi ao secretário que encaminhasse à Assembleia um pedido de contratações emergenciais, para que pudesse tirar essas pessoas. O hospital precisa de gente. À noite, costuma ficar apenas uma pessoa cuidando de cada unidade, geralmente uma mulher. Se alguém surtar, como faz? Além disso, a direção do hospital não tem autonomia financeira. Tudo depende da coordenação dos hospitais instalada lá. A administração perdeu força. Não compactuo com isso.

ZH – O que o senhor vai fazer agora?

Barcelos – Talvez volte a prestar consultoria para o Ministério da Saúde e retome a clínica de acupuntura que mantinha.


“Ele não resolveu e saiu atirando” - Ciro Simoni, secretário estadual da Saúde

O secretário estadual da Saúde, Ciro Simoni, foi pego de surpresa pela saída rumorosa do ex-diretor-geral do Hospital Psiquiátrico São Pedro, Lucio Barcelos. Como o antigo colaborador foi nomeado por decisão pessoal de Simoni, o secretário se revoltou com as declarações públicas de Barcelos. Confira, abaixo, um trecho da entrevista concedida ontem à tarde, por telefone.

Zero Hora – O que o senhor tem a dizer sobre os relatos de más condições no Hospital São Pedro?

Ciro Simoni – Tem uma questão interna, aí. Eu convidei esse senhor, foi um convite pessoal, e ele pouco contribuiu no processo. Acho que ele tem um projeto político pela frente e terminou fazendo as coisas por projeção pessoal, política. Os problemas do São Pedro, eu botei ele lá para resolver. Aqui, trabalhamos em conjunto. Não tem outra secretaria dentro da secretaria. Os problemas são existentes há muito tempo. Coisas crônicas. Botei o Lucio para resolver, mas ele foi só para atrapalhar. Está fazendo um belo de um barulho.

ZH – Mas a situação do São Pedro não é ruim?

Simoni – Mas há quanto tempo ele está atirado? O problema é que o Lucio não soube trabalhar em grupo, acho que ele queria ser secretário da saúde mas, infelizmente, o Tarso não o convidou. Ele me decepcionou. Eu disse a ele que recursos não iriam faltar. Tem motoristas lá na área do São Pedro desde o governo passado. Mas é que há muitas áreas vazias lá. O hospital já atendeu 5 mil pessoas, hoje atende 300.

ZH – Mas o departamento de administração dos hospitais foi deslocado para lá, com benefício de 45% a mais de salário para os servidores?

Simoni – Os que eu botei lá são cargos de confiança, com salários fixos. O chefe do departamento é funcionário do Estado. Não tem cabide de emprego lá. Todos do departamento são servidores de quadro. Estão fazendo tempestade em copo d’água por interesse político. Infelizmente, cometi o engano de colocar esse senhor nessa função, e agora temos mais uma crise.

Zero Hora – O que o senhor pretende fazer a partir de agora?

Simoni – Acho que merecemos um pouco de confiança nesse momento inicial. Há muitos problemas, há problemas de pessoal, no Sanatório Partenon também, deficiências de recursos humanos nas coordenadorias regionais, a secretaria fez poucos concursos em 20, 30 anos. Tem deficiências, estamos compondo um trabalho, mas não posso colocar mais gente de um dia para o outro. Isso tem de ser uma decisão de governo, precisa passar pela Assembleia. Não estou dizendo que não tem problema. Tem, mas ele não resolveu os problemas e saiu atirando para todo lado, com objetivos pessoais.




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