domingo, 7 de agosto de 2011

A SUPERAÇÃO DO SUS


ANTONIO QUINTO NETO MÉDICO, ZERO HORA 06/08/2011

É difícil compor um retrato fidedigno da assistência à saúde no Estado, seja pela imprecisão dos dados, seja pelas variadas opiniões. As ideias são muito divergentes e com isso a saúde avança pouco. Num momento se ouve que faltam leitos, e noutro que existem leitos; que o problema é de gestão, enquanto há quem assegure que os hospitais são bem geridos; uns dizem que há médicos em excesso, outros afirmam que faltam médicos. Além disso, são fato as filas madrugadoras, o paradoxo da ociosidade na utilização de instalações e equipamentos existentes, associado à ocorrência de hospitais públicos que destinam parte de sua capacidade operacional para beneficiários de planos de saúde e particulares (com o propósito de equilibrar as contas), o que afronta a dificuldade de acesso dos pacientes aos cuidados de saúde.

Os gestores públicos relutam em aceitar que o sistema de saúde é a soma do setor privado com o setor público, e que um pode ajudar o outro, como já acontece em alguns locais. Precisam adotar uma visão globalizante do sistema de saúde, e isto criará inúmeras oportunidades para assegurar a todos os cuidados de saúde exigidos.

Em defesa da universalidade e integralidade, o SUS se tornou a antítese. Por exemplo, estabeleceu-se a crença do modelo de saúde piramidal, ou seja, aquele em que os serviços se organizam por níveis de complexidade: assistência básica, assistência de média complexidade e assistência de alta complexidade. Assim, as unidades básicas acolheriam os usuários e os enviariam, caso necessário, para os outros dois níveis, ocorrendo o retorno na mesma sequência. Ora, essa hierarquização não se baseia prioritariamente nas necessidades dos usuários dependentes do SUS, mas na densidade tecnológica dos prestadores de serviços de saúde. Na prática, coexistem várias portas de entrada, sendo a mais importante delas os serviços de urgência e emergência. Daí a conhecida superlotação nestes pontos de cuidado. As pessoas, de acordo com suas necessidades e prioridades, acessam os serviços de saúde por onde é possível e mais fácil, e não da forma como os gestores pensam ou imaginam que seria a forma mais eficiente e eficaz. A barbaridade está em que a população que só tem o SUS se sente mal assistida e abandonada. A excessiva demora no atendimento é um resultado dramático que comove e desperta indignação.

É preciso coragem e lucidez para repensar alguns princípios que orientam o SUS, por mais que pareçam justos e adequados, por mais que seja difícil rever certos pressupostos que, de tanto se repetir, passaram a ser considerados como verdadeiros e suficientes para garantir os cuidados de saúde para todos. Algo precisa ser feito urgentemente na gestão dos serviços de saúde, mas tudo cruza pelo financiamento.

Nenhum comentário:

Postar um comentário